Esses franceses...
“Estamos
no ano 50 antes de Cristo. Toda a Gália foi ocupada pelos romanos...Toda? Não!
Uma aldeia povoada por irredutíveis gauleses ainda resiste ao invasor...”.
Assim,
com esta explicação, começam as aventuras de Asterix, o gaulês. O herói, criado
há 50 anos pelo roteirista René Goscinny e pelo desenhista Albert Urdezo, vive
numa pequena aldeia à beira- mar, encurralada pelas guarnições do exército
romano. Ajudado por companheiros pra lá de especiais e por uma poção mágica que
lhes garante um poder sobrenatural, Asterix e seus camaradas não se rendem e
aprontam poucas e boas aos legionários de César.
(Meu
primeiro contato com as revistas do Asterix foi em Rondônia. À época, a
publicação contava com 27 edições. Todo mês eu pegava uma graninha e comprava
um exemplar. Quando vim de férias para Belém, cheguei todo metidão, com minha
coleção completinha: dias antes havia conseguido na Livraria da Rose, em Porto
Velho, o mais recente lançamento, “O Filho de Asterix”.
Hoje em
dia, conhecemos as aventuras de Asterix por causa de algumas estrelas como o
ator Gérard Depardieu, que vive o intrépido Obelix nas versões para o cinema, e
também por algumas produções em desenho animado. Mas o bom mesmo, para mim, são
as edições impressas. Há uma certa magia na criação. O traço desenvolto de
Urdezo e o texto bem-humorado de Goscinny são impecáveis, fascinantes. Há
também, o fato de as edições serem únicas, especiais e historicamente bem
argumentadas. Estes pormenores nas publicações se refletem, é claro,
diretamente no preço. Um exemplar composto de aproximadamente 50 páginas, hoje,
é bem carinho para os padrões de consumo de um operário que vara os dias e as
noites pensando num jeito de trocar a geladeira que já está naquela fase de ter
a porta amparada por um eficaz e multiético tijolinho.
Mas,
naquele distante ano de 1984, eu desembarcava em Belém, de férias com a bagagem
cheia de Asterix. Vinte e sete exemplares reluzentes, sem vincos. Só que não
falei nada daqueles pormenores pra mamãe. Arrumei as revistas em uma caixa
junto com alguns jornais e fui matar a saudade da minha Belém querida.
E eis
que numa dessas minhas escapadas, passou lá por casa, um comprador de jornal
velho. Daqueles que antigamente iam de casa em casa comprando papel. O golpe
foi fatal. Mamãe pegou minha caixa e despachou a minha coleçãozinha de
Asterix’zinho por uma merreca. Hoje seria coisa de um Real o quilo. Dá pra
imaginar, né...Se existiu um zinho completamente desnorteado por aqueles dias,
este um fui eu).
A Gália
era uma região que hoje, corresponde à boa parte da França. Asterix, de certa
forma, representa a natureza heróica do povo francês. O guerreiro resgata a
altivez do líder Vercingentorix, cujo ato de depor as armas diante de César,
mais o engrandeceu do que o deprimiu.
A
teimosia de Asterix reverbera entre os franceses. Ecoa pelos escaninhos de
Nanterre, lembrando maio de 68 e as palavras de ordem de Dany le rouge.
Exibe-se nos lábios revoltosos de Brigitte Bardot e de Isabelle Adjani; no
olhar arrebatador de Alain Delon e no sorriso indecifrável de Juliette Binoche.
Traduz-se numa França cheia de inquietações e se reproduz em Zidanes argelinos.
Subversão
que se desenha nos modelos de Chanel e Yves Saint Laurent. Desvela-se em Piaf,
em Carla Bruni. Impõe-se na defesa intransigente da língua mater de Jeanne
d'Arc. E que se denuncia ante a genial sonoridade de Ravel.
Asterix
é um pouco da Revolucionária vontade (irrigada pela fluente coragem de Danton)
que resistiu por entre os escondidos de Paris e que destronou os invasores
nazistas.
Como
diria o Obelix: “Esses franceses são...demais!”.
(Vou
conseguir um dinheirinho e na Feira do Livro deste ano, vou começar outra
coleção dos adoráveis gauleses).
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