sexta-feira, 30 de junho de 2023

crônica da semana - clino

 Clinoreflexão

Não sei vocês, mas eu sou assim. Tô de boa assimilando o bem e o mal da vida, sem rir sem falar, com uma mão, com a outra, num serececê rotineiro, quando num trisca, encasqueto com coisa mínima, sem importância, mas pela potência que tem de me encasquetar os miolos, ganha relevo de montanha. Dou um passinho a frente, outro atrás, remancheio, decido. A seguir desisto de levar adiante minha encasquetação. Mais com pouco reanimo a intriga, revivo a questão. Faço medidas de interesse. O que meus leitores têm a ver com isso? Deixo estar e vou em frente entendendo que, ah, acontece sim, com mina de gente, do mesmo jeito.

Meu comichão por agora é pelo significado ou a interpretação do que é ‘inclinação’. Até arrumei um título todo estiloso que tem na composição o elemento ‘clino’, radical que vem do grego e que associado ao meu pensamento quase compulsivo, me faz traçar esta pergunta para vós. O que me dizem: um objeto que é muito inclinado. Está muito em pé ou está muito deitado? Dúvida... Dúvida, meu pai eterno, que tudo traça por linhas quaisquer, sejam elas retas, curvas, paralelas, infinitas, valei-me!

Pra não parecer que pirei das fuças, conto o porquê dessa apreensão. É que agora, sexagenário que sou, tô naquela fase da ranzinzagem. Tudo me toca, coisinha miúda me incomoda e logo vou atrás de argumentos para assegurar a minha paz. O destaque é para as viagens de ônibus com poltronas reclináveis. Tenho vivenciado situações em que, quando embarco, muitos lugares estão ocupados e até os assentos destinados às prioridades já encontraram jovens saudáveis e sonolentos para ocupá-los. O embaraço ainda é maior quando constato todos os encostos das cadeiras arriados, dificultando o acesso ao miraculoso lugar desocupado que encontro. Tenho para mim que a boa educação e o cuidado com o outro inspira baixar o encosto apenas quando não houver ninguém para embarcar e o ônibus já estivar de partida. Antes disso, é um sufoco para quem quer um lugarzinho e tem que se atar naquele apertado.

O que me deixou na cuíra é que todo mundo chama o ato de baixar o encosto, de inclinar. Há uma turma que é só ajeitar o corpo, que já inclina a poltrona. Olha, olha quem está de novo formando o verbo inclinar... o mesmo elemento grego ‘clino’.

Então se o mal educado deita a poltrona antes que o passageiro de trás ocupe o lugar, ele está baixando o encosto, aproximando o encosto da horizontal, como se arremedasse a cama da casa dele. O que nos faz imaginar que um objeto ou um plano muito inclinado tende mesmo à horizontal. Mas, pera...Tudo é a referência.

Dizque não sei do caso e do certo. Mas sei sim, dos conceitos. Consultando meus apontamentos, me parece claro que quando uma pessoa desce o encosto da cadeira ela está, não inclinando, mas ‘desinclinando’. Tenho como certo que inclinar é o contrário, é tender à vertical. Quanto mais em pé, mais inclinado.

Na Geometria, a inclinação é uma direção de um objeto no espaço. É a orientação que está entre a direção vertical e a horizontal. Trata-se de uma vastidão de posições. Mas isso não é o caso dos meus chiliquitos. O que me toma de ansiedade e curiosidade é o sentido da inclinação. O senso comum diz que inclinar é descer o encosto da poltrona pra baixo. Na regra, é subir o encosto pra cima.

Posto isso, da próxima, vou estabelecer o caos. Quando entrar no ônibus e topar com um jovem, em sono profundo (ou fingindo-se adormecido) com o encosto da cadeira todo deitado, estreitando as minhas possibilidades de acesso ao meu lugar, vou acordá-lo e pedir, educadamente, pelo conceito, para que ele incline a cadeira dele. Bora ver o bicho que vai dar.

Espero que esta reflexão torne meus dias mais inclinados. Meus atos e intenções rijos e de pé.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

crônica da semana - do menor para o maior II

 Do menor para o maior II

Eu sou do tempo que a gente cantava o hino, na entrada da escola. Um rito que, encenado dentro daquele contexto de regime militar, catava sinais de ordem e progresso. Mas quando! A fila era a prova de fogo da sisudez militar. E dava de dez na rigidez comportamental. Moleque virava, mexia, pintava os canecos, antes e até durante a execução do hino. Desde a avacalhação desmedida na hora de formar, quando nossa camisa ficava toda pensa de tantos puxões que recebia na rebeldia dos braços ao cobrir à frente, cobrir ao lado, descansar; até a saída de forma, era um terror variado. Destaque que, na vera e no dito da malinação, tinha uma turminha que ia além, se superava. Arrisco pensar hoje, que aqueles meninos péssimos expressavam uma personalidade afeita à arenga, ao exercício de alguma superioridade sobre o outro, pelo uso de força, da intimidação e da humilhação. Mesmo que o outro fosse da mais pura paz. Que relevasse, fizesse que não era com ele. Não tinha escapatória. Os atentados não davam sossego, e se aviavam nessa prática naquele ambiente, dizque, higienizado pela ilusão conservadora atada ao cerimonial do hino.

Tirando uma pela outra, eram atitudes impulsionadas por um ódio latente, um fogo atentatório, digo até, algo próximo ao sadismo, e ligadíssimo à beligerância bem pensada, do mesmo jeito que aconteceu no último final de semana em que o Brasil jogou na Espanha.

Na Europa, o clima arremedava acolhimento, penitência coletiva, negação providente do racismo. Da discriminação e do clima tenso. Na pauta uma forma articulada, de modos a envolver o maior número de pessoas dispostas a apoiar as lutas contra a intolerância e especialmente contra as agressões sofridas pelo jogador brasileiro Vinícius Júnior.

Aí volto à fila dos anos 70, para cantar o hino. Naquela atmosfera cívica, todo mundo concentrado na letra nada fácil do Joaquim Ozório, não é que tinha um moleque que saía lá de trás, do último lugar e ia até o primeiro da fila, bicudar a canela do coleguinha! Desafiava toda a organização, desmontava qualquer discurso ordeiro, desfazia a menção que fosse de respeito fraterno e empastelava o rito. Causava, criava um desconforto, era reorientado, pegava uma bronquinha e saía na boa. Para alguns, deixava aquela cena de ataque gratuito, como herói. Ganhava fama e adeptos como o destemido, aquele que desafiava a organização, impunha o seu poder e subjugava os mais discretos ou aqueles que representavam a minoria abandonada de voz e vez. Do alvo constavam os baixolinhas como eu, os negros, os de roupas remendadas, as meninas, os educados e isentos...

O clima na Europa era, podemos entender, de reparação, de uma acanhada reação ao preconceito. Dias antes Vini Júnior havia sido atacado com atos e palavras preconceituosas, em um jogo na Espanha. Logo em seguida em atuação pela seleção brasileira, a delegação brasileira exibiu sinais de resistência ao racismo, representados pela camisa preta, inédita, do uniforme, protestos no gramado e sensibilizações fora das quatro linhas.

Porém, não tem aquelas personalidades afeitas à arenga? Pois não foi que, em meio àquela cordialidade, às pregações de aceitação e tolerância realizadas no estádio, me sai um cidadão péssimo, integrante, inclusive, do grupo de trabalho que atuava no estádio e pratica os mesmos atos de racismo contra o assessor do Vinícius Júnior, com o requinte odioso, de abrigar uma banana no bolso do uniforme!

Tem gente, sofro ao admitir isso, que nasce para espalhar a cizânia, criar o terror, puxar a gola da nossa camisa da escola, sair de trás da fila e bicudar o outro lá na frente.

Ah, a fila naquele tempo era do menor para o maior. Adivinhem vós quem era o primeiro, o bicudado...

domingo, 18 de junho de 2023

crônica da semana- iniciais BP

 Iniciais BP

Naquela hora da foto, foi que dei que, com a novíssima integrante da nossa patota, a minha netinha, estávamos ali na foto, três gerações da família.

Soma-se aí uma pá de tempo brincando, acompanhando o cortejo do Arraial do Pavulagem e fazendo a história vibrar ao longo dos anos. E é por essas e outras que para nós, não é só um folguedo junino, numa manhã ensolarada de domingo. Como se diz à hora, tem é muito sentimento envolvido. Por isso, quando o Marcelo Fernandes pontuou o dedilhado efervescente introduzindo “Iniciais BP”, aquela que penso ser a música símbolo do Arraial, as lágrimas brotaram fartas dos olhos de cada um que formava o nosso grupinho. Todo mundo chorou. Menos a netinha que ainda não percebeu essa fronteira emotiva que nos rege e ficou na dela, curtindo o colorido dos chapéus riscando o azul do céu.

Disse semana passada que os festejos de junho são muito ligados à família, a lembranças boas. E com todos os detalhes, em especial, no Arrastão do Pavulagem. Este ano, logo que saiu o cortejo, me separei do meu grupo, fui ficando para trás. Queria ver os particulares daquela multidão. E que povaréu, heim! E passa gente, e passa gente e o cortejo não acaba. Eu, a bom catar aqui, ali, uma curiosidade, um conhecido lá no meião, um segmento temático... Até que rareou o povo. E começou a leva de ambulantes. No final do cortejo, uma ruma, mina de carrinhos, tabuleiros, geladeiras de isopor na cabeça, prancha de doces, salgados, bombons, chope de frutas naturais e artificiais. Produtos para todos os gostos e precisões. E aí me bateu na memória as nossas batalhas próprias, lutas de alguns anos atrás. Encontrei uma amiga da Universidade, com o filhinho. Duas gerações ali. Ela se aliou às minhas intempestivas reflexões vendo aquele rio de ambulantes passar. Tempos atrás estava ela ali também. Fez parte dos muitos grupos de universitários que juntavam um dinheirinho fazendo a venda no Arrastão. Confirmou que se houve festa de formatura, se participaram de congressos e viagens extras de campo, parte do recurso veio desses domingos do mês de junho. Tirando por esse lado, o dedilhado do Marcelo na guitarra, assina como litisconsorte, o diploma de muitos mestres e doutores por aí.

Emendei que nem tão depois, foi a vez do meu filho. Fez a graduação, o mestrado, se virando num troco bem vindo à época do Arraial. E me revelou, com aquela iniciativa, um pouco da herança empreendedora da avó Luzia. Mamãe, não dava ponto sem nó. Dava junho, ela desencadeava as estratégias para alcançar um numerário extra. Havia uma inevitável correlação, quando ia se aproximando o fim de semana e o menino se organizava na compra dos produtos, pacotes de água, refrigerante, gelo... Providenciava o isopor. Eu me adiantava e chegava à praça logo cedo. Pegava meu lugarzinho naquela sombra ao lado do anfiteatro, no mesmo cantinho que o meu tio Tadeu, que com modos e termos, apreciava o show de longe. Quando dava fé, lá varava meu menino carregando aquela caixa enorme. Se ajeitava por ali e esperava a boa venda. Vai para o doutorado com a mesma ajudazinha vinda do povo bom que acompanha o cortejo.

Cheguei na Waldemar. Ainda ajudei, meia viagem, a empurrar uma cargueira. A lida tem desafios! Minha amiga se despediu com o filhinho e procurou os seus. Juntei-me ao grupo e contei das minhas abelhudices acompanhando os vendedores lá no rabo do cortejo. Foi logo que resgatamos juntos outros momentos, pessoas que estiveram com a gente e não mais estão. Meu amigo Cláudio Cardoso, Tia Churuca, meu tio Tadeu... Aí a guitarra deu as iniciais, estrelas cintilantes desceram sobre nós, fitas coloridas riscaram o céu... As lágrimas vieram. A netinha, na dela, só fitando as fitas.

sábado, 10 de junho de 2023

crônica da semana - valeu a pena?

 Valeu a pena?

Se a alma não é pequena, sim.

O recado do poeta é um alento. Uma forra para as desditas do mundo. Vem a calhar. Serve como lenitivo para os tão comuns esquecimentos.

Aí me vem no cocuruto os entremeios de uma discussão sobre a meritocracia. É comum as pessoas creditarem um sucesso mais aquele, a ascensão em uma carreira promissora ou a inteligência raríssima aos seus potenciais intrínsecos ou a esforços estritamente pessoais. Olha que tenho topado com mina de gente ao derredor que jura de pé junto, afirma sem que lhe trema a cara, ter subido os degraus da vida por si. Sem a ajuda de ninguém. Em Barcarena, então, se fosse chover alheamento, seria uma chuva de dias a bom pingar sem trégua. Digo isso porque convivo com gente que se beneficiou das lutas populares, sindicais, de conquistas coletivas e hoje, ó, nem seu Souza pra história.

O mais comum dos meus desconfortos com o apagamento da memória se dá no campo da educação. À época da minha chegada em Barcarena, o município se ressentia da falta de cursos específicos no nível médio e muito, e bastante sentida, no nível superior. Para romper esta barreira, os moradores da cidade recorriam às ofertas de cursos em Belém. Uma decisão na vida que levava o orçamento familiar às alturas. O transporte era de toda sorte raro e caro. O trabalhador do pólo industrial e as famílias tradicionais ou recorriam a parentes e amigos para abrigarem os filhos na capital enquanto duravam os cursos ou, passavam um aperto daqueles para garantir o ir e vir diário, mais um bico de pão para o lanche. Esta condição, certamente, restringia a evolução dos estudantes e enterrava sonhos.

Um alento veio por uma articulação decisiva do, hoje vice-reitor da UFPA, professor Gilmar Pereira, criando a lei do passe escolar, que franqueava a passagem dos estudantes habilitados aos cursos em Belém. Um benefício que mudou a vida de muita gente e supriu a cidade de profissionais da terra, de realce e de importância fundamental para o desenvolvimento do município.

Eu fui beneficiado com o passe escolar, quando, já quarentão, passei em Geologia na Federal. Tudo bem, tudo bom, consegui fazer o primeiro semestre, me assombrei com Cálculo I, mas passei até bem. Cuidei e me adiantei no segundo, mas... sabe como é o pobre, né... No finzinho do semestre (que, coisa rara, caiu exato no fim do ano) o prefeito de Barcarena suspendeu o benefício. Aí foi um pega pra capar. Todo mundo na pira. Como íamos frequentar as aulas pagando aquele horror de passagem todo dia? Tentei argumentar com meus professores e dei com os burros n’água. O jeito foi declarar a guerra e reconquistar o passe. Nem vou entrar nos detalhes, porque a prosa é longa, mas para ilustrar, revelo que o reveion de 2005, eu passei, junto com uma pá de estudantes, acampado em frente à prefeitura; varamos o Dia de Reis em batalha renhida contra aquele ato que nos tirou, praticamente, o direito de estudar, e antes que meus professores me dessem a conta justa da reprovação por faltas, recuperamos o benefício e resgatamos para nunca mais perdê-la, a lei que mudou a vida de muita gente em Barcarena.

E eis que eu estava bem na curtição do show do Frejat, semana passada, o Rock rolando bacana, quando passou um rapaz por mim, me encarou, falou algo que malmente deu pra eu confirmar, sim, sou eu mesmo. E ele me deu um abraço tão apertado, tão carinhoso, muito do bem. Falou no meu ouvido que era muito agradecido por aquele dia, lá acampado na prefeitura, que ali, entendeu as razões da luta e que dali, tirou o futuro. E eu ansioso, cortei o pequeno: formaste, perguntei, formaste? Sim, ele respondeu. Formou em Engenharia. Devolvi o abraço e um sorriso emocionado ao Diego.

Valeu a pena!

sábado, 3 de junho de 2023

crônica da semana - mingau de milho com canela

 Mingau de milho matizado com canela

Já vi reações à quadra junina. Entretanto, pelo menos ao aluá, o desgostoso da vez quedou-se. Não encontrei jamais na vida alguém que relegasse ao desprezo, no pacote, todas as manifestações culturais das festas de São João. Semana passada, topei com este exemplar raro de crítico cultural. Eita. Me tremi dos pés à cabeça de indignação. Porque sou fã número 01 dos folguedos de junho.

A vida exige da gente tolerância, compreensão, prudência, uma elevação de alma na altura certa a nos dar conviver em sociedade. Mesmo que nos batendo diariamente com opiniões, convicções, posições políticas e ideológicas, gostos musicais, times de futebol diferentes, doce-amargos, cores preferidas. Ante tantos conflitos e desencontros, temos que respirar, engolir sapos, contar até 10 bilhões, e em nome da paz, relevar, fazer que não ouviu esta ou aquela afronta, isto ou aquilo de mentiras, e ainda tantos aquil’outros negacionistas e fatalistas. Agora, saber de uma pessoa, num tom até de indisfarçável soberba, que ela não gosta de nada da quadra junina: roupas, danças, músicas, encenações, bebidas, artes em miriti, as brincadeiras do pau de sebo e do quebra-pote no dia de São Pedro, no Mercado da Pedreira... do Pavulagem... estalinho, estrelinha... nada! Não dá não. Não tem espírito santo que ature o bruto molde, a tamanha rigidez na personalidade.

Além da alta sofisticação criativa, a atmosfera desta época refaz a história, reintegra nossas lembranças. A quadra se explica emocionalmente porque é festa muito ligada à família. Em mim, remonta há bons trinta, quarenta anos. Os eventos eram concentrados nos bairros e, mesmo, no leito das ruas. Vários terreiros eram formados, tudo acontecia na frente das nossas casas. O terreiro da Pedro Miranda era famoso. Descia da Lomas até a Itororó. Tinha alvará da prefeitura, a permissão da central de polícia, o consentimento dos moradores, e se dava tudo nos conformes. A comunidade se envolvia. Eu mesmo fui atrás de muita palha de açaí para fazer a decoração. Outros integravam-se à turma que cercava o estirão da rua. Havia os especialistas para contratar o melhor e mais barato sonoro. Quem quisesse colaborar, assumia uma venda certa de cartelas que davam direito à entrada na festa, à mesa para quatro, e por vezes, umas geladas e uma porção de comida típica da época.

Dançava-se muito, e muito bem nessas festas. Casais se contratavam para rabiscar o asfalto, só na caté, a noite toda. Uma outra parte que não tinha par fixo, se lançava aos encontros circunstantes, em solicitações educadas para a contradança, normalmente, feitas pelo cavalheiro. Aí, ia da dama, aceitar ou não aquele par. Entre uma e outra sequência de músicas dançantes que o rapaz do som selecionava com extremada sensibilidade, e antevisão de oportunidade para algum casal colar na festa, uma Quadrilha, um Pássaro, personagens folclóricos da época se apresentavam. Aqui, acolá, uma rodada de mingau de milho na cuia com uma poeirinha de canela pra matizar a gostosura.

Mamãe que não perdia uma chance de ganhar um numerário, também via grandes oportunidades nas festas de São João. Montava um terreiro todo ano na Vila Mauriti. Enfeitava de bandeirinhas, folhas de açaizeiro, jogava uma serragem nas pocinhas de lama e comandava a bilheteria e o bar. Não era uma rua, era uma vila muito apertadinha. É certo que tinha vizinho que não curtia aquela arrumação. Se recolhia em casa e ficava no escondidinho da noite. Mas não de forma ou jeito de desprezar todo o pacote de elementos culturais. Uma horinha abria a porta, chegava ao balcão da vendinha de mamãe e mergulhava numa bem medida  cuiada de mingau de milho, matizado prodigamente na canela.