segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Morte em La Paz- cap II e III

Capítulo II

Quando iniciou o curso de Geologia, na USP, aos 17 anos, orgulhava-se. Dizia que o curso tinha a nobre missão de formar médicos. Médicos da Terra. Para ele, a Geologia era a medicina aplicada ao planeta. Depois de formado, iria curar as feridas da Terra. Enfrentaria as doenças abissais com vacinas tectônicas. Seria um especialista em sarar erupções ígneas violentas. Iria enlevar-se ao estancar hemorragias destruidoras de lavas incandescentes. Faria a fotografia geomorfológica da crosta mais agitada e a radiografia sísmica dos ermos. Salvaria os rios e igarapés das mortes por assoreamento e erosão das margens. Seria o cirurgião da mata ciliar.
Era um jovem estudante de Geologia, há alguns anos. Não sabia nada do fogo interior do planeta e nem da ambição dos homens.
Na USP, conheceu Elisângela. Pegavam o ônibus juntos. Moravam em bairros próximos. Ela fazia medicina. A médica das gentes. Ele, o médico da Terra. Ah, Elis, o seu grande amor. Inesquecível. O primeiro. A primeira. A primeira vez. No quarto dele, numa tarde escandalosamente paulistana. Garoa fina, lá fora. Sax de Scott Page na vitrola. Rumor cotidiano da casa. Louça batendo na cozinha, televisão na sala, em voz alta. Menino em desabalada pelo corredor, esbarrando na porta, mas não atrapalhando, não. Som do Pink Floyd. A primeira vez. O médico da Terra.
Elis, meu amor. Anda, anda! Calcinha apertada. Beijo apertado. Lábios tensos, pressionados, machucando. Mais, mais, vai! Elis, ah, Elis. Inesquecível. Beijo apressado. Mãos deslizando apressadas. Dentes atritando uns com os outros num tilintar abafado, entre lábios. A primeira vez. Hum...hum! Sangue dele, sangue dela. Hum...hum! Lágrimas de dor. Ah, o bom que dói. Gozo nas coxas. Beijo relaxado. O menino esbarrando na porta. A mãe, a casa. Ah, Elis. Inesquecível. O frio de La Paz. O tocador apaixonado das esquinas. Vem me buscar, Elis.

Capítulo III

Marta foi a primeira a chegar em Cumbica. Caberia a ela, uma cantora da noite, afinadíssima, com quem estava casado há dois anos, a dolorosa missão de receber o corpo, assinar toda aquela papelada, aqueles inquéritos, aqueles registros, aquelas declarações.
Elisângela chegou atrasada. O corpo já havia sido liberado para o enterro, quando ela chegou. Passou mal, no balcão do aeroporto e foi socorrida por amigos. Elis, a médica das gentes. Viúva, viúva. Sozinha de novo. Somente a lembrança do último encontro, antes da viagem dele para La Paz. A possibilidade cristalina de assumirem publicamente o amor que sentiam, toda a vida, um pelo outro. Viúva, Elisângela não foi ao cemitério. Desmaiou no aeroporto e foi socorrida por amigos.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

crônica da semana - Fatos e fotos

Fatos e fotos
Amanhã ocorrerá a Grande Coleta de Emaús. A campanha faz parte do calendário da cidade e consiste na arrecadação de objetos que não estejam sendo usados ou que possam ser reciclados. É uma ação social consistente que acontece desde 1972, sob a liderança do Padre Bruno Sechi. Começou na Escola Salesiana, na Sacramenta; teve a cimeira no Jurunas, e atualmente, mantém-se, no bairro do Benguí (é uma opinião: acho que na época do Jurunas, foi o momento de maior relevo da campanha. Foi um período pródigo em que a campanha atingia uma quantidade enorme de bairros, envolvia muita gente, recebia ajudas e patrocínios. Hoje,  o ‘Movimento de Emaús’ se realiza a partir de reformas estruturais, e a Grande Coleta se adaptou às atuais dificuldades operacionais e de execução. Este ano vai cobrir pouca coisa mais que 5 bairros).
É uma oportunidade de doação também para os voluntários que fazem a coleta. Participei de algumas. E, nem titubeio em dizer que foram momentos inquestionáveis de crescimento. Toda a atmosfera da campanha é muito edificante: a elaboração do tema, sempre ligado a uma causa social e montado sobre a problemática do menor (que é, por vocação, o eixo de atuação do Movimento); a disseminação do objetivo da campanha, expresso nas cartas distribuídas à comunidade, dias antes da coleta (e esta é uma prática interessante. O contato prévio com a população é uma ação de conscientização. Uma aproximação que permite mostrar que a campanha não se propõe apenas a receber objetos reaproveitáveis. Coisas. Bens materiais. Procura também formar opinião, criar liberdade e consciência crítica. Era uma pernada, entregando a carta, mas era extremamente saudável para o espírito. E sempre rolava um lanchinho, uma cadeira pra descansar, uma água...e a tão bem-vinda cumplicidade).
O sábado, véspera da campanha, era de congraçamento. Todos os voluntários eram mobilizados para uma celebração de paz e de entrega (e tem aquele, sabe, que não esqueço nunca. Foi no ano em que o Elói Borges, que hoje é dirigente do Sintepp, cantou a música “Minha História”, com aquela voz contundente, persuasiva, empolgante. Pô, depois de “esperando parada/pregada/na pedra do porto/com seu único/velho vestido/cada dia mais curto”, não teve unzinho assim que não derramou uma lágrima ali no ginásio do Sesc. Muito emocionante aquele dia. Todo mundo com a camisa da campanha. Todos muito jovens, cheios de sonhos, muito amigos, e com uma vontade danada de fazer um mundo melhor) [...silêncio...].
O fato é que amanhã os rapazes e moças que acreditam num mundo melhor estarão pelas ruas de Belém realizando mais uma Grande Coleta. Rogo que os recebam de coração aberto, com alguma doação na porta, um lanchinho, uma aguinha, um sorriso ou o que valha como cumplicidade. O domingo, por certo vai ser muito mais feliz pra todo mundo.
Agora a foto. Desde junho venho acompanhando o deslocamento do sol com fotos. E ontem ele ficou bem em cima da linha que divide o gramado do estádio ‘Zerão’ em Macapá (mas como é pertinho, né, considerei como se fosse aqui). Esta posição do sol marca o equinócio de Primavera. Proporciona os hemisférios sul e norte serem igualmente iluminados. Enseja o dia ter a mesma duração que a noite. Define a chegada da Primavera e certifica os pontos cardeais Leste (onde o sol nasce, pela minha foto, atrás do Cabana Clube) e Oeste (onde o sol se põe, por dedução, o quintal da artista plástica Cristina Tobias). Dos pontos fotografados ontem (o equinócio) daqui pra frente, o sol vai se afastar para o sul, até dezembro. E sabe o que isso quer dizer? Quer dizer que vamos ter muitos domingos felizes.

tuíti

Paulo Coelho refletindo sobre o fato
eita, que o mundo endoidou!
até este exato momento do dia 23 de setembro 137 acessos no blog http://raimundosodre.blogspot.com/
Record absoluto. Só pode ter sido o o 'tuiti' do Álvaro, geólogo bem relacionado, do mundo!
Tô me sentindo o próprio Paulo Coelho

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Morte em La Paz

  Capítulo I                                                                            

La Paz, esta época do ano, é uma cidade fantasma. O frio é intenso e esconde as pessoas. Confina o boliviano ao aconchego do lar aquecido. Os mais bem de vida se resolvem freqüentando restaurantes que oferecem ambientes com isolamento térmico e pubs especializados em bebidas quentes e caras.
Ele reza na cartilha do povo. Encerra-se em seu quarto solitário, confortável, no hotel Cuzco, ao largo da praça da Independência, donde divisa o magnífico monumento de mármore e cobre erguido em homenagem a Simon Bolivar. Toma chá olhando pela janela envidraçada e espera o tempo passar.
Sua missão ali está acabada. Reuniu-se com os geólogos da subsidiária boliviana e com empresários do Chile e Peru. Fechou contrato para uma gigantesca campanha de pesquisa geológica que vai encampar uma faixa colossal de terra, com os trabalhos se estendendo desde o norte do Chile até o extremo oriental do Peru, já na Amazônia peruana. O alvo é uma estrutura  geológica enriquecida de cobre, que ele, diligente, batizou de green belt of Simon, em homenagem ao libertador. 
Está pronto para voltar a São Paulo, depois de um mês de visitas às frentes pioneiras de pesquisas, caminhadas exploradoras à borda do altiplano e acompanhamento de lavras em minas de cobre da região.
Abre uma garrafa de uísque importado da distante Escócia. Prepara uma dose pacientemente. Com gelo. Uma, duas pedras. Tamborila os dedos mergulhados entre as pedras de gelo, acelerando o equilíbrio térmico. Brinda com o universo todo e entorna a dose de um único gole.
Ah, um otorrinolaringologista! Nariz arde, garganta arde. Respiração acelerada. Pouco ar. Uma, duas doses. O efeito de uma dose parece ser o efeito de toda a produção escocesa. Ar rarefeito. Altiplano. Como é que se vive num lugar deste, meu Deus?
Desvia o olhar para a mesinha junto à parede. O embornal de campo guarda displicente, nos bolsos externos, um papelote do alucinante pó e um saquinho da erva recheado de sementinhas, que ele ganhou dos nativos da encosta. Os índios recomendaram que se ele resolvesse realmente assumir a idéia de chegar a Guajará-Mirim, descendo os Andes, melhor era contar com esta ajudazinha.
Ele está decidido. Vai atravessar a portentosa cordilheira até a bacia do Prata. Dali, vai contornar a cabeceira do Guaporé, varar a floresta boliviana e alcançar Guajará-Mirim, do lado brasileiro, em no máximo, dez dias. Vai sacrificar preciosos dias de folga ao lado da mulher, em São Paulo, mas vai valer a pena. Paira sobre ele, o espírito aventureiro. É como se o obstinado personagem de García Márquez o abençoasse naquele objetivo. Queria viver, queria realizar o sonho indelével de José Arcádio Buendia e, descobrir o caminho que leva ao mar. Descobrir um sentido para a vida.
Vai rumo ao mar, ao rio-mar, pela ombreira da majestosa cadeia rochosa. Rumo ao mar externo. Não este mar doméstico que brota dos olhos apaixonados dos tocadores de charango, nas esquinas de La Paz. Não. 
Vai redimir a insepulta Macondo que fervilha inquietante, dentro dele. Vai à procura do perdão, da reconciliação com um amor antigo. Provar que ama. Quer renascer. Desenterrar-se de um mundo escuro de febres e pesadelos. Quer lançar-se à liberdade do mar. Precisa chegar ao horizonte infinito. Purificar-se nas águas do mar e navegar. Navegar.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Minha equipe querida

Rumo ao Gurupi, depois de uma rodada de chope de groselha. Válber no comando, Nathan contando os passos,  e eu ali, de mão pra trás...

sábado, 17 de setembro de 2011

crônica da semana- sonho meu

Mentirinha
Aqui, acolá, fico repetindo que não tenho ambição. É uma proposta antiga, assimilada na adolescência e difícil de desatarrachar da alma. Posso até datar o dia em que vislumbrei uma vida frugal. Foi após uma palestra que assisti do, agora padre salesiano, Chico sadek, em maio de 1980. Lembro como se fosse hoje. O título era “Ser pessoa”. O tema confrontava os valores pregados pela sociedade e tinha uma ilustração legal representando uma pessoa de cabeça pra baixo e outra, de cabeça pra cima. Uma simbolizando o ‘ter’ e outra, imprimindo o ‘ser’. Nos dizeres do Chico, aquela pessoa que estava de cabeça pra cima, era a pessoa que não tava nem aí pro ‘ter’, desdenhava dos apelos do mundo e preferia viver o universo feliz e solidário do ‘ser’. Peguei corda.
Os anos se passaram, a minha formação salesiana foi ganhando outras conformações (que penso eu, são mais coerentes com o meu status de pecador), mas continuei afinado com aquele credo de simplicidade (às vezes, segredo a vós, sustentado por desígnios outros que não os meus).
Coisa de dois ou três anos atrás, dei uma repaginada nos meus conceitos. Admiti que a prosa não pode ser assim, no torniquete, na míngua, tão radicalmente franciscana. Comecei a aceitar que uma ambiçãozinha nem faz tanto mal. É, aliás, necessária para compor melhor o espírito. Ajuda a romper alguns grilhões que ainda nos machucam os pulsos. Nas conversas com meus filhos até já me permito incentivá-los a cultivar, com prudência e zelo pela ética, um foco.
Assim, desconstruo meu próprio mito, para eles. Não fui esta santidade toda. Dei muita ratada e incontáveis vezes, me deixei encantar pelos apelos da vida mundana. Em mesa de bar, por exemplo, e em situaçõezinhas hedonistas outras que não posso falar, me aperreei bastante para garantir a sublimação.
Tive surtos de cobiça, também. Comichões. Vontades incontroláveis de ter coisas. Uma máquina de escrever, uma máquina fotográfica com fotômetro manual e um jogo de mágica. Exatamente nesta ordem. Que eu me lembre, estas foram as minhas principais demandas. Todas atendidas e com os testemunhos aqui em casa para comprovar. A máquina de datilografia, inclusive, tá com fita nova que alguém conseguiu pra mim, sei lá por onde.
(Ah, não tenho mais o jogo de mágica. Fiz questão de me desfazer dele, embora compusesse a fração mui querida do meu patrimônio. Fiz porque fiz para adquiri-lo. Foi um custo conquistá-lo. Havia sempre as prioridades. Entrava nas lojas de departamento, escolhia uma caixa robusta, com bastantes mágicas, colocava embaixo do braço e saía pelos corredores. Lá na frente encontrava Argelzinho, Amaranta Maria, cada um com um brinquedinho embaixo do braço. Não tinha vaga no orçamento para o meu joguinho. Voltava triste, parece menino besta e colocava a caixa na prateleira de volta. Até que os filhos cresceram, meu menino passou a fazer questão de ganhar sempre uma bola, em qualquer ocasião, ou seja, um presente barato. A menina se engraçou por pecinhas artesanais e sobrou uma graninha pra mim. Certo dia, enfim, comprei meu jogo de mágica.
Meu enorme entusiasmo se transformou, na mesma medida, em frustração, quando fui fazer minha apresentação pras crianças (era mais ou menos um sonho, sabe?). Inspirado no filme O Grande Truque, pus todo o meu talento em ação. A primeira a se desiludir foi a pequena Flaviana. “Tá ali, tio, a moeda, tá ali”. Me desmoralizou. Todos os outros segredos foram impiedosamente desmascarados pela garotada. E o meu joguinho sumiu, como por mágica, aqui de casa).
Aqui, acolá, fico repetindo que não tenho ambição. Mentirinha. Tenho sim.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Pávulo

Fã número 1
A pequena que dá trela para o que este humilde servo do reino do Xapuri escreve.
Ela tem o blog salvo no celular e lê os textos naquela letrinha miudinha. Compra o jornal aos sábados. Começou a ler minhas coisinhas pensando que eu era o Salomão Laredo. Depois que sacou o engano, continuou prestigiando. Fiquei emocionado. Alessandra, fã número 1, uma simpatia só. Ganha livro autografado e tudo.
 

sábado, 10 de setembro de 2011

Crônica da semana -cricri

Cri-cri da silva
Não é por nada, não. Não que eu seja um mala querendo resolver coisinhas insignificantes de uma cidade que sofre de males inomináveis. Um cri-cri pretensioso ou um descontente vouyeur ávido por brilhos e tezes acetinadas. Não me tenham como um chato.
Mas olha só: escrevi há uns dias sobre aquela escada que dá acesso a avenida Presidente Vargas. Disse, na ocasião, que o corrimão tá quebrado; que ela é uma construção secular refinada; que pauta algumas de minhas memórias e parari, parará.
Depois, dei uma ciscada neste mesmo tema, numa crônica que fiz sobre a Marcha das Vadias. Postei fotos nas redes sociais, no meu blog...E, que droga! Uma solução para aquela destruição, nem se ensaiou. Não houve um isso de atitude, um murmúrio de notícia sobre, uma menção ou um arremedo de remendo.
Volto ao assunto então. Pode me chamar de chato e coisa e loisa, mas, pô, aquilo é um símbolo do nosso sucesso, da nossa ascensão, dá uma turbinada em nossa auto-estima. É índice de orgulho e altivez. É um faz-de-conta ufanista, mas conta, ora bolas, nas nossas contas de cidadania. Se ela, a escada (construída com apuro e zelo, no início do século 20) tá desarrumada, imagina a nossa vidinha de belemense da Pedreira a quantas anda! Os atores citadinos não podem se submeter a submersão moral proporcionada pelo desleixo e pela sensaboria administrativa (mesmo porque já se batem com aspecto prático da ‘submersão’, aquele providenciado pela maré alta e pela chuva das três).
Temos que ser previdentes. Outubro tá chegando e aquele é um trecho melindroso da procissão do Círio de Nazaré. Todo mundo tem uma história pra contar sobre aquela ‘subida da Presidente Vargas’. Boa parte dos romeiros, pressionados pelo mar de gente, vai dar naquela quina. E eu já falei que, o que resta da balaustrada tá pra cair. Não vamos falicitar para que um acidente no dia maior da nossa fé aconteça,né? Alô, gente das altas, vamos agir.
E gentes das altas, não faltam. Aquela região está, graças ao bom pai, sendo revitalizada. O casario do Boulevard aos poucos vai ganhando cores e sabores. O Sesc restaurou e pôs em uso um flanco do casario. Na outra ponta, pras bandas do antigo e proibido Xendengo, o Arraial do Pavulagem e os sindicalistas do Fisco deram vida e sonoridade às antigas construções. Um restaurante famoso se faz anunciar naquela paragem. A Praça dos Estivadores, aos poucos se reacende para o mundo com a Zona Cultural. A galera da iniciativa privada tá fazendo o dever de casa. Mas cadê o poder público?
Ali naquele pedacinho de Paris, pelo menos três instituições financeiras públicas abrem o seu leque de poder e empáfia. O Banco Central, na beira da baía, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica logo ali no alto da ladeira. Não é possível que destes cofres afortunados não saiam uns trocados pra arrumar aquele entorno (incluindo aí a praça Waldemar Henrique, um dos lugares mais inóspitos da cidade). Olha, a Santa vai ralhar se vocês não fizerem nada! (E aqui vai um recorte especialmente dedicado à Caixa Econômica: a calçada que calça o rompante financeiro que administra o nosso FGTS, toda construída com pedras portuguesas está totalmente degradada. Buracos, pedras saltadas, piso desnivelado, plano aviltado, alma roubada. Nem acredito, que na ilharga daquele abandono funciona, insensível e fria, umas das maiores instituições financeiras do país. Aí a gente pensa: se chegar ao portão da Caixa é nos tropeções, que dirá conseguir um financiamento...).

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Ê carimbó!

"Ê, carimbó! Ê, carimbó...(A sereia surge radiante, do fundo das águas espelhadas...vestido branco... sorriso insinuante e provocador. É quase rio de água friinha: gostoso, acolhedor, mas profundo e perigoso. Um sorriso fácil e ao mesmo tempo ameaçador. Um sorriso de mãe d’água que domina. Que fascina. E faz rarear a razão... Os cabelos...são porções de floresta...Sobre os cabelos, uma flor vermelha... 'Sereia, sereia rainha. Ah, que moça bonita, ê!')"
 



terça-feira, 6 de setembro de 2011

Crônica remix - seda


Brasa pra minha sardinha
Na quarta-feira, dia 3 de outubro, lanço o meu conto “Morte em La Paz” na XI Feira Pan-Amazônica do livro.  A sessão de autógrafos será no Estande dos Escritores Paraenses às 19h.
Antes, na segunda, também às 19, farei, no estande da Fundação Tancredo Neves, o Recital de Poesias de par com a Engenheira Ambiental Paula Fernanda Viegas Pinheiro e com um dos mais pródigos compositores da música popular paraense (a bem da verdade, a presença do músico ainda não está confirmada, por isso fica em suspense o nome).
Pedi a opinião do poeta José Miguel Alves sobre o meu conto e reproduzo as impressões dele aqui na coluna. E não é porque o Miguel é meu amigo de muitos anos, não é porque ele é padrinho do meu filho Argel de Assis, não é porque temos uma parceria literária em “O Operário em Verso e Prosa”; não é por essas gritantes coincidências que ele vai rasgar seda para o conto, né? Não é por causa desses penduricalhos afetivos que o poeta vai puxar a brasa pra minha sardinha. Claro. Claro que não. Vamos ao texto:
“Afirmar que conhecemos alguém, geralmente é dar provas de que sabemos o seu lugar comum, o previsível. No caso do Sodré, com quem já convivo há mais de década e meia, talvez essa lógica se inverta, pois o conheço mais ainda por saber que sempre nos brindará com uma terna surpresa.
Assim é a escrita do meu compadre, com seus sobressaltos, que nos causam um positivo incômodo, inesperado e prazeroso.
Eu, já acostumado com a brejeirice de suas crônicas — muitas das quais conheci ainda na gestação — nas quais suas vivências afloram num propósito de cutucar a emoção do leitor; fui agraciado em ler “Morte em La Paz” no nascedouro e, pela proximidade com o autor, pude até sugerir, dar o meu “pitaco” em alguns trechos.
O texto, embora enfoque um personagem como integrante de uma nova geração, de jovens que não tinham a utopia de mudar politicamente o país e o mundo,      apresenta-o como um sonhador, um acadêmico idealista que se vê, sem se dar conta, envolto nos tentáculos do sistema.
Entre os devaneios sobre os Andes e diante da selva, o geólogo sem nome desvela sua penitência, busca a reconciliação consigo e com o mundo. Ao exorcizar seus fantasmas interiores e estabelecer um elo com deuses andinos imaginários, experimenta outras formas de desejo e se redime com o a terra e com seu grande amor.
Em saltos de narrativa, em que a linearidade, comum aos hábeis construtores da prosa, se impõe, percebe-se o cuidado com que Sodré busca envolver o leitor e prendê-lo até à última linha.
A vida dual do inominado personagem principal, simbolizada na apolínea médica Elisângela e na dionisíaca artista Marta, é uma outra janela que se abre, novamente, a nos tomar de assalto. A trajetória linear do jovem e aplicado estudante, indicaria um final ao lado de “Elis”. Contudo, ela é a “outra”, a amante, como contraponto ao casamento burguês e correto com a afinada cantora.
Embora a morte seja em La Paz, o que nos alerta Sodré é que pode ser a morte de uma geração. A geração que se enfurna no limbo acadêmico, imersa em seus projetos de pesquisa, a descobrir novas formas de render velhos lucros, de consumar novos pobres e cristalizar os velhos ricos.
Longe de ser apologético, que incita à alienação pelas drogas, é um primor da tessitura da prosa, somente experimentada pelos que inovam e surpreendem. É como um ilusionista da periferia, com um carcomido fraque e uma cartola, mas que assola com um truque inusitado e arranca suspiros ante os olhos atônitos da platéia incrédula.
Morte em La Paz estará em lançamento na próxima Feira Pan-Amazônica do Livro. Já reservei o meu exemplar.”

domingo, 4 de setembro de 2011

os olhos de chico

Quando, muito jovem, Chico Buarque construiu ricos versos terminados em palavras proparoxítonas, a crítica não entendeu, mas ficou maravilhada
Maduro, encaixou a inencaixável 'escafandristas' em "Futuros amantes" e ninguém falou nada
Já na melhor idade acudiu-se à uma rima corajosa para 'sacrifício' e a galera (no mau sentido) meteu o pau.
Como diria Rubem Braga: esse povo ou silencia ou tagarela demais   

 
 

coisas que a laila faz

" Bom dia! Um café da manhã muito especial contém: uma jarra de suco de harmonia e humildade, um bolo de paciência com cobertura de amor e sabedoria, uma torrada de paz com creme de saúde, uma xícara de café com muita alegria, muitos pães de felicidade e rosas perfumadas com gratidão para fazer seu dia melhor!"

sábado, 3 de setembro de 2011

crônica da semana - entre a escadinha e...


Entre a escadinha e a mangueira da praça
O domingo tece teias...
No domingo passado, ainda cedo, ali pelas 9 horas, a escadinha das Docas animou-se com a concentração da Marcha das Vadias. Atravessei a baía no primeiro barco para participar do evento. Foi bom estar no comecinho da mobilização porque pude mensurar a quantidade de energia empregada na realização da marcha e constatar, com um tanto de encanto, o nível de compromisso e apego das pessoas envolvidas numa causa melindrosa e, até certo ponto, estigmatizada. Chegar um pouquinho antes da hora me possibilitou também a assimilação, em princípio não muito fácil, do nome dado à caminhada: “Marcha das Vadias”. Não posso negar. Minha mãe, se viva fosse, jamais deixaria as minhas irmãs participarem de um ato com este nome. A tradução do real sentido daquele título, penso eu, foi o primeiro grande desafio do movimento. Mas por ali, ouvindo um discurso, uma entrevista, uma declaração. Em conversas com amigas que faziam parte da organização, fui tomando pé da história desta manifestação e dos objetivos da passeata aqui em Belém. Como se dizia antigamente: se inteirando das coisas, o coração se abre e a mente clareia (e, sabe, tenho certeza que mamãe, se viva fosse, mudaria de opinião sobre a participação das meninas, ante alguns sagrados e belos significados de ‘vadia’). E lá pelas dez da manhã quando o sol já fulgurava no céu, a dura realidade e a ‘luta das mulheres no mundo’ para combatê-la foram se desenhando à jusante da Presidente Vargas: Aquilo não era sobre sexo, era sobre violência, esclarecia o panfleto distribuído na marcha. Um grito. Um não. À violência moral, sexual, social. Um não. Aos patrulhamentos de condutas e hábitos, ao controle dos amores. Um não. Ao vilipêndio de nomes e à coisificação de corpos. Este foi o recado propagado pelas Vadias. E ali na concentração, me resignei e assumi a mais elementar das constatações. Nosostros, homens sem sentido, tino ou verve (e, ainda, uma boa parte da sociedade) sequer somos dignos de desatar os cordões semânticos das sandálias que calçam o termo ‘vadia’.
Fiquei por ali, acompanhei um pouquinho a caminhada e as palavras de ordem, excitei o meu eu-lírico feminino, me penitenciei de alguns pequenos pecados... mas tive que me aviar. Havia um convite do Sancari para vê-los tocar na Praça da República. E eu tinha que prestigiar. Afinal, o grupo é da Pedreira, o bairro do Samba, do amor e do Carimbó.
Quando cheguei na praça, a moçada do Sancari já estava arrebentando a boca do balão. Tudo convergia para o deleite e para o prazer, também. Aqueles elementos fundamentais para a preservação da espécie humana estavam presentes. O Lundu, o chão de terra para bater o pé, o ar da praça para propagar as palmas, o fulgor do sol das 11 horas, a aguinha a 1 Real (e a sombra da mangueira, não computada pelos gregos, mas fundamental para proteger dos raios uvê), sorrisos de conquista e ritmos de corpos demarcando território (porque o homem é o único animal que ri e a dança foi umas das primeiras formas eficientes de comunicação). O Sancari provou que o Carimbó não morreu. Tocaram com propriedade e zelo. E de tudo. Fizeram releituras, passearam pelo tradicional e pelo autoral. Espetacular a apresentação dos meus vizinhos pedreirenses.
O domingo tece teias...e entre o discurso de conscientização das Vadias no entorno das Docas e o frenesi do Carimbó embaixo da mangueira na praça, permanece a desolação das balaústras seculares destruídas, ali naquela escada que dá acesso à Presidente Vargas. Lamentável.