sexta-feira, 5 de abril de 2013

crônica da semana -vovós


Vovós carabinas

Dez’orinhas da manhã saiu aquela vuca da Pirajá, pronta para um domingo de festa. Aniversário da tia. Uma reunião rápida, confere os meninos, os presentes... e é dada a largada. Tinham que pegar dois ônibus. Pedreira Lomas até um ponto da Almirante. Depois, um que entrasse no Tenoné. 
Ali da Pedreira, zarpava uma galera que entre crianças empoadas, mamães prestativas e agregados atentos, contava com umas 15 pessoas. Na liderança, as vovós. 
O bolo de gente chamava a atenção ali na esquina da Lomas. Lá vem ele. Ordem na subida. Inteiras, meias, faz as contas, acerta, paga. Todo mundo ajeitando um cantinho pra se sentar. As vovós não passaram na borboleta. Ficaram lá na frente nos lugares reservados. Pelo comum das manhãs de domingo, o ônibus estava vazio. Apenas algumas cadeiras ocupadas. Dois adolescentes enamorados, um casal com um bebê no colo, um vendedor de biscoitos ‘cocríssimos e levemente salgadinhos’. Um operário do cais de macacão laranja. Duas senhoras vestidas com roupas de estampas floradas bem no jeito da missa dominical. O resto era a galera da Pirajá. 
A viagem tava que era uma maravilha. Um ou outro passageiro que entrou no caminho, até estranhou a lotação atípica em pleno trajeto de retorno do centro, mas não que apoquentou. Arrumou-se no corredor e se deixou envolver pela algazarra sadia que se instalara no coletivo, aquelas coisas que rolam quando se junta o vulgo em folguedo. 
Todo mundo alegre e satisfeito, mas as vovós lá na frente, só na bicora do outro ônibus. E não é que ali pela Bandeira Branca um Tenoné emparelhou com o Lomas. Mais que depressa as vovós fizeram um diálogo na base da menção, com o motora do lado. Acertaram com gestos, o translado. Ele sinalizou que esperaria o povo se aviar. Tudo combinado, a vovó mais afoita virou-se abruptamente para o fundão e ordenou com voz límpida e severa : “Desce todo mundo”. Foi a conta. Desespero total. Um corre-corre, uma agoniação. Destrambelho generalizado. Todo mundo querendo descer do ônibus ao mesmo tempo. A notícia de assalto logo se espalhou entre os passageiros (e até entre os membros da família que, mesmo conhecendo estes ímpetos da vovó, inquietaram-se). Aquela ordem fora interpretada da maneira mais tresvariada possível, ora lá sabiam que ela estava articulando um transbordo para o outro ônibus! Aquele repente só poderia ser por causa de assalto, de incêndio, ou de um desalento outro comum ao transporte público mesmo. Das reações mais intempestivas, louve-se a das duas senhoras que vinham da missa, que ato contínuo, se deslocaram até às vovozinhas e, submissas, entregaram os pertences e ainda todo o acervo de Legionários que traziam lá da Igreja de Aparecida. Não tão inesperada foi a escalada do vendedor ambulante, que salteando cadeiras, pôs-se a pisotear aqueles que, não por vontades próprias, continuavam sentados. Pisando num, pisando noutro, o rapaz varou na calçada e sumiu ‘na tez esfumaçada da Almirante barroso’. Minha filha, Amaranta, foi uma das pri a abandonar o furdunço. Desgarrou-se da mãe e ganhou, em desabalada carreira, uma daquelas ruinhas de confronte ao Lauro Sodré. Até que se definissem eiras ou beiras, hios e chios, alhos, bugalhos, focinhos de porcos e tomadas, o caos imperou. 
O motorista do Lomas se desmanchando em risos, o do Tenoné, perplexo; os cocrísssimos levemente salgadinho abandonados pela calçada, minha filha desaparecida no rumo do Curió. No final, desvelado o mal entendido, reencontradas Amarantinha e a lucidez, a festa foi boa. E as vovozinhas, ah, as vovozinhas são de paz e se divertiram a valer. 

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