Mãos dadas
Bem que tentamos. Fizemos a combina. Um domingo na praça juntos. Almoço ali por perto. Encontro com os amigos. Fotos in family para o ‘feice’. Uma pizza gigante não estava descartada. Atrativos. Tentações. Mas quite! Os meninos nem thum pra gente. Declinaram do convite. O pequeno valorizou um almoço previamente agendado. A menina ia acordar tarde e tinha umas coisinhas inadiáveis para resolver (não sei exatamente o que). Programações acertadas, pendências urgentes, Filminhos imperdíveis na TV e até trabalhinhos de escola (ora, veja). Os filhos lançam mão de um arsenal de justificativas para não sair mais com a gente (e mais tarde, numa conversa com meu compadre Quelemém, confidenciei a ele a minha inquietação com o desdém dos pequenos. Meu compadre me acalmou. Fez-me lembrar que quando da idade deles, também não gostávamos mais de sair com nossos pais. É a fase. Das descobertas. Das experimentações. Da ratificação do espírito responsável. Dos exercícios de livre arbítrio. Estão na era de escolhas das -melhores- amizades. Mergulham em outros interesses. Em prazeres diversos. Impulsos adolescentes, coisas e loisas de quem está com os hormônios por acolá. Acontece com meu compadre igualzinho. Que nem que nem). 
Tenho que reconhecer isso. É o fenômeno da desatracação. Estamos nos desatarraxando. Meu compadre Quelemém, há muito tempo, rotulou este estado de coisas de “uma distância perto”. Os meninos saem debaixo das asas, mas deixam o cheiro, o dengo, o chamego, no ninho.
Se por um lado a debandada dos nossos bebês nos deixou um isso de vazio. Por outro, nos vimos a sós. De uma forma sutil, a folga nos colocou como há muito não. Objetivamente, nos posicionou desimpedidos para o domingão. Oba! Sem encheção de saco de menino. Sem ‘pai, quero isso’; ‘mãe, quero aquilo’ e principalmente, apartados daquela cantilena cáustica ‘borimbora pra casa’.
Alforriados por esta lei do ventre livre às avessas, eu e minha Edninha aproveitamos. Nos aprumamos e nos divertimos a valer, guiados por um roteiro que dominamos (passeio de mãos dadas, roda de viola, fugidas inesperadas para ir bem ali, olhares cúmplices, beijos públicos, carícias clandestinas, carinhos permitidos, charminhos e declarações, prazer no encontro, encanto no tato, afagos febris, juras e confissões). E o que mais pudemos recuperar de alguns anos submetidos a ausências (amizades partilhadas, copo de cerveja partilhado, cachorro-quente na esquina, ursinho de pelúcia com gravatinha de presente na feirinha de artesanato, um poema ao vento, anel de noivado de tucum, bar do parque, chuva fina).
Cantarolamos juntos, uma canção para ensejar essa nossa nova fase de namorados: “Você é tudo e muito mais/o que sou capaz/é muito pouco eu sei/você faz tudo muito bem...Então faça de mim o seu bem-me-quer”. Versos simples que são o jeito, a tez, o tom e o modo da minha pequena, desde antes.
O dia colaborou. Teve jazz na praça com as feras de Belém e nobilíssimas participações internacionais. Nublou mas não choveu e quando o sol deu uma saidinha mais poderosa, a mangueira amiga amainou o calor.
De tardezinha, descemos para apreciar o pôr do sol. Escolhemos uma mesa escondida, mas os passarinhos nos descobriram à beira da baía do Guajará (olhares cúmplices...). Tomamos sorvete de bacuri.
A noite foi chegando, os meninos, enjoados do dia free, começaram a ligar Reclamaram presença. Pediram que levássemos alguma coisa gostosa pra comer. Anunciou-se o cheiro das crias. A lua crescente no céu. Tornamos ao lar. Cerimoniosos. De mãos dadas.