sexta-feira, 2 de agosto de 2013

crônica da semana - com mais de mil

Com mais de mil

Coisas incríveis acontecem nas areias da Princesa. 
A vastidão de areinha branca se estende por quase 4 quilômetros, desde a duna mais saliente conhecida como ‘morro’, até o Furo Velho, na fronteira com Fortalezinha. No meio, o desvio para um caminho desafiador, assim de ajiru de um lado, d’outro e lá na frente, depois de um solzinho no cocuruto e uns reclamos de cansaço, escavado entre as dunas, o lago de água escura. 
O estirão de areia da Praia da Princesa em Algodoal se dispõe num pontal meio de través, descaindo um tantinho abaixo do alinhamento leste-oeste. Pois bem...Foi nessa direção, que desembestei. 
A primeira vez foi filezinho, uma corridinha sem custo. Vento brando arrastando um saco plástico. Uma pequena logo atrás se aperreando. Eu ia com minha turminha, para o lago. Vi aquela correria alvoroçada na minha direção, saquei aquele ‘pega-não-pega o saco plástico’ da menina e na horinha me impus a missão de ajudá-la. Dei uns passinhos pra direita, me adiantei num pique vigoroso pela areia e aparei o saco plástico na maior caté, com o pé. A moça que vinha atrás, na pisada que vinha, nem conseguiu frear e deu de encontra comigo. Meio desequilibrado, resgatei do chão o perseguido e o devolvi para a dona. Curioso, perguntei quanta grana tinha guardada ali, porque o interesse dela em apanhá-lo era grande, quase que alucinado. Para meu agrado, a pequena respondeu que não tinha nada dentro do saco, havia subtraído o conteúdo, umas bolachinhas doces, no caminho e na hora de guardar no bolsinho da mochila, o plástico lhe escapou da mão e voou pra longe com o vento. Saiu atrás só porque não queria deixar resíduo, não queria sujar a Praia da Princesa. Taí, gostei de ter participado de uma ação com objetivo tão puro e nobre. Saí meio que como um herói da parada. Todo posudo. Metidão. Me achando. Com status de sujeito indispensável na hercúlea tarefa de salvar do planeta. 
Já no adiantado da caminhada de volta, bem além do Bar da Pedra, eu que ia na frente com minha filha, fui novamente acionado, pelo resto da patota que vinha contando passo e apreciando a mini-tempestade que dispersava uma nuvem de areia fina  por toda extensão da praia. Os meninos deram o alarme e quando me virei, vi passar por mim uma banda de sandália sendo levada pelo vento. Não houve tempo pra avaliar a situação. Disse alguma coisa como “segura aqui” para minha menina e saí com mais de mil atrás. O único lampejo analítico que tive era que ali, eu estava tendo uma baixa no orçamento das férias: uma sandália de marca é uma boa grana. E como disse Argelzinho, meu filho, “corri como se não houvesse amanhã”. Fiquei na biqueira da marca do Usain Bolt. Quase alcanço a bichinha, mas não consegui. Depois de um tantão de metros percorridos, frustrado, voltei, na baba, aos meninos lamentando a perda. Qual não foi a minha surpresa quando me falaram que a sandália não era de ninguém do nosso grupo. “Como assim?”, perguntei inconformado. Eles me alertaram apenas pela curiosidade de uma sandália engatada numa linha de papagaio, ser arrastada pelo vento, nada mais. Segundo os meninos, corri de pateta que sou (ou porque peguei corda com o resgate do saco plástico, ocorrido no início da tarde, e estava curtindo meus momentos de herói). Dei um pique velocíssimo de grátis. Sem quê, nem pra quê, como se não houvesse amanhã. Mas havia. No dia seguinte, o meu joelho bichado inchou e me deixou de cama o resto das férias. Ah, a baixa no orçamento se confirmou, também. Quando me danei a correr, larguei a minha própria chinela lá atrás e não mais a encontrei.

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