sexta-feira, 17 de maio de 2013

Crônica da semana- balanço


Balanço

Desde que tempo, ando meio piradinho com esta história de completar 50 anos de idade. Tava meio grilado (grilado aliás é uma evidência linguística e comportamental do meu status etário, pois que é gíria distal. De um passado psicodélico). O certo é que andei meio inquieto esses dias: cobranças do que não fiz, medos de um futuro amadurecendo, reflexões sobre rotinas e obrigações abrigadas na rima dos ‘enta’. 
Confesso que balancei apavorado, ainda mais quando fiz uns ensaios nas contagens de tempo. Quando percebi que indo para a escala do século, 50 anos representam 10% de cinco séculos, pirei. Éraste! Cinquenta anos é bem pertinho de 500 anos. Se a gente considerar ainda que o Homem moderno (este, dotado de telencéfalo desenvolvido e polegar opositor) zanza pela Terra, há uns 100 séculos, meu Deus, sinto que sou muito íntimo dos primeiros sapiens e quase contemporâneo de Isaac Newton! A minha valência (não imediatamente, ressalto, houve de eu arbitrar ao espírito a decisão de sofrer ou não, e essa resposta me custou alguns indecisos e dramáticos instantes), foi atinar que estou a milhões de anos além do primitivismo das amebas. Foi aí que me aquietei. Deixei de lado os instintos animais que me assolam (as ações imediatas isentas de finalidades), apelei pra razão (admitindo um porvir de máximo respeito às ponderações cronológicas que a vida exige), tomei termo e recebi de bom grado, o meu meio século de existência (ou 10% de 5 séculos ou ainda 50 PPMs de  uma eternidade possível). Vou lutar pela vida, porque, pelo que torna e pelo que deixa, temos nos dado até bem... 
Eu já plantei uma árvore. (O ginásio da UFPA estava repleto de jovens estudantes. Não tão jovem, contando já com meus trinta anos, entrava pela primeira vez na Universidade. Era aquela reunião com os calouros de 1993. Doutor Camilo Viana, vice-reitor, na época organizou um novo jeito de receber os calouros. Comandou o trote ecológico. Houveram os pronunciamentos de praxe. A direção da instituição falou exaltando e projetando obras, tempos bons para a Federal. Falou também o Wanderley, representante dos estudantes, jogando um pouco de água fria no entusiasmo da galera, revelando o estado crônico de desleixo e abandono a que é relegada a educações neste nosso Brasil varonil. Na saída, cada um recebeu uma viçosa muda de árvores de espécies  nobres e arrumou um cantinho nos estirões pra plantar um futuro verde para a vida e para o mundo. Sempre que passo pelo lado da biblioteca, aquele que dá pro rio, fico olhando, na doce ilusão de reconhecer a arvorezinha que plantei há 20 anos ali). 
Já tive um filho. (O certo é que tive dois pequenos pra lá de maravilhosos. Nesta conta fui além do dito popular. E tão marcadamente que meus meninos revelam um pouco da realidade diversa que eu defendo e acredito. Duas crias. Um homem e uma mulher. Um neguinho e uma de tez escandinava. Um explicitamente doce e outra tímida e misteriosa. Um atleta viciado e rueiro, outra severa e meticulosamente caseira. Os dois agradavelmente ostentando personalidades independentes e sinceras. Objetiva e veementemente humanas. Com seus maus e bons intrínsecos, com valores em construção dinâmica, incessante. Duas das minhas mais brilhantes invenções de mim. Resultantes da “ânsia da vida por si mesma”). 
E já escrevi um livro. (Também aqui, o ditado popular me é menor. Já escrevi uns quantos. O mais recente, lancei agora na Feira do Livro). 
Então estou quite com o asseverado dito popular que diz que o homem tem que plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Me estou até bem com a vida. 

Um comentário:

  1. Égua da viagem o início da crônica! Ainda bem que ainda vou demorar uns bons 25 anos pra ter de fazer essa reflexão, porque se tivesse que fazer agora, ia pirar.

    Eu te conheço um pedacinhozinho desses teus cinquenta anos. Li aqui e já sabia (à exceção do detalhe da árvore) que, conforme o ditado popular, já havias cumprido tua missão nessa vida. Mas eu digo mesmo, sem medo de errar: já fizeste isso e muito mais. Já encheste o mundo de poesia (árvore, livros, Amaranta, Argel...). Tu estás no lucro, mas ainda pode fazer muito mais. E com corpinho de 45... Aproveita!

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