quarta-feira, 27 de junho de 2012

crônica remix- eu tô do lado da


Arthur Clarke visita o Tapanã ou Um tapinha não dói, ou ainda, Eu tô do lado é da Cicciolina
Ai, meu pai! Queria sentar aqui nesta quarta-feira e escrever uma crônica “alegre, falando palavras boas de falar: luz de vela... barco, terra, mar... sol, lua...mãe, irmã, mulher”. Preferiria prosear sobre beijo na boca, carinho, cuticuti, tecoteco, ticotico, nheconheco.
Fico só na vontade.
A nossa verve, o nosso instinto, o nosso calibre de mamífero, estes últimos dias, têm nos aprontado cada arrumação. E uma, maior que a outra, mais chocante, mais apavorante que a outra. Éraste! chega a gente amofina.
Que droga! agora, na largada do terceiro milênio, parece que estamos dando uma guinada no rumo da nossa pré-história de urros e grunhidos. Parece que estamos querendo voltar a ser rudes macaquinhos.
A primeira cena do filme “2001, Uma Odisséia no Espaço” nos mostra uma batalha entre os homens primitivos. Os gorilas se enfrentam ferozmente para garantir a posse de um pequeno lago. Nesta seqüência, o filme revela uma descoberta decisiva para a polarização do poder tribal. Um dos hominídeos percebe que pode manipular pedaços de ossos de grandes animais e utilizá-los como arma. E assim, com este argumento tecnológico, consegue subjugar o adversário. O desfecho da batalha se dá com o macaco golpeando o inimigo com o pedaço de osso, descontroladamente, desregradamente. O outro macaco já nem resiste mais. Já não dá mais sinal de vida, largado inerte, sobre o lajedo, mas o macaco vencedor continua triturando o adversário violentamente, raivosamente com aquele ossão.
Isso foi mais ou menos o que aconteceu dias atrás lá no Tapanã.
O que me assusta mais, o que me constrange e o que me abate é que cenas de violência urbana sejam tratadas como cults cinematográficos e dêem mais ibope do que a batalha inventada pelo Arthur Clarke.
Hoje em dia, o negócio é no bruto mesmo.
Tenho topado com gente do meu convívio, que tem gravado da internet, tem registrado no celular, as mais bizarras cenas de violência. Chegam ao cúmulo de fazer rodinha para exibir os últimos lances de barbárie.
A certeza é que a insensatez, a brutalidade, a insanidade, a degenerescência da natureza humana têm enorme repercussão no meio da nossa sociedade. Tratamos golpes certeiros, potentes, mutiladores, poderosos, como se fossem um tapinha. (um tapinha humilhante, que leva a morte). Um tapinha que, ah, não dói nadica na nossa consciência.
Alguém até puxou um assunto comigo, sobre a última. Uma que tá na internet. Uma em que um cidadão esmigalha outro sem maiores culpas. Eu dei para trás rapidamente. Deus me livre e guarde, cara! Me mostra aí, no teu celular, uma coisa qualquer sobre futebol. Até mesmo sobre o sofrimento do meu bicola. Ou não, manda aí, um vídeo saliente. Qualquer um...Aquele da Cicarelli (eu tô do lado é da Cicciolina), aquele da Cicareeeelli, cara! Mostra uma praia linda e um anoitecer estrelado. Mostra aí, no teu celular, cenas de amor. De diversão, de resistência e de revolução. Mostra aí, reuniõezinhas de família e um barco navegando ao longe pela baía do Guajará. Mostra daquele jeito que todo mundo grava mesmo: uma imagem indefinível, turva, escura, mas inócua. Uma imagem que não agride, que não maltrata senão pela falta de nitidez.
Mas de gente sendo vilipendiada, não. De gente sendo submetida, Por favor, não! Deixa pra lá, cara. Deixa que a arte previdente, reveladora, profética de Arthur Clarke cuida disso. Cuida da rispidez e da irracionalidade. Cuida, com tal zelo, como se fosse um aviso...Vindo do tempo dos macacos.

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