sexta-feira, 10 de junho de 2011

Crônica da semana

Amigo meu   
Minha mãe amanhecia e anoitecia o dia agradecendo a Deus por ele ter aparecido na minha vida. Não que eu fosse desguiado, largado à bandalha. Moleque péssimo, eu não era não, eu. Em 1979 eu já tinha 4 anos de carteira assinada. Era um pacato cidadãozinho cuja única piração era o jogo de bola todos os sábados defendendo o glorioso Internacional da Mauriti, pelos campos do Asas do Brasil e do Areal.
Mas ele deu, realmente, uma mexida na minha vida. Não se usava o estrangeirismo ‘apigrêide’, naquela época, mas foi por aí. Algumas fagulhas que chamuscavam dentro de mim, se acenderam, de vez, quando o conheci.
Saí ganhando. Afinal o cara é iluminado. Em todos os sentidos. É meu ídolo. Com exceção de umas travas reincidentes para continhas básicas de matemática, é minha referência para um tudo. Se me encalacro em algum conceito, alguma definição, bato um fio e logo ele me oferece uma saída elegante. Se perco o rumo de uma prosa, ele dissipa, com fluência, apreensões e refaz caminhos. Dirime inquietações. Tão altivo, quanto sereno. Tão extenso, quanto humilde. Exato e dócil, tem um conhecimento vastíssimo. Domina o hio e o chio dos questionamentos humanos (porque, quando adolescente, leu um feixe assim de livros do Herman Hesse e as imprescindíveis obras do Gibran, deduzo) e jamais escreveria três vezes a palavra ‘exceção’ até acertar, como fez este humilde usuário de umas das variantes da língua portuguesa, lá atrás (Porque lê, certifico).
Mas nem só do saber e da profusão intelectual vive o homem.
Tão desvelada declaração da minha mãe, não guardava muita coisa com a facilidade que meu amigo tinha para apreender a realidade. Advinha, mais precisamente, do fato de, pelas mãos dele, eu ter me tornado um membro das fileiras salesianas. Deus te livre e guarde. Para ela, era o Pai no céu e este pequeno na Terra. Tudo por causa da minha conversão. Foi o facilitador da minha Primeira Comunhão e Crisma. Somos irmãos em Cristo. Somos compadres de pia e amigos de coração e mente. Enveredamos por construir uma relação sagrada, compromissada na fé e na confiança. Edificamos ao longo desses anos, aquilo que se pode chamar de uma amizade inquebrantável. Do tipo: ‘a tudo, a ela (a nossa amizade) seremos atentos, antes’.
E aí, quando eu penso nos anos que temos nos completado, torno para as dificuldades que meu amigo tem com os minuendos e subtraendos. Se não angariamos, num longo período, grandes controvérsias ou graves desapontamentos, um resultado diverso para um ‘arme e efetue’ simples, tem nos abatido, tem abalado as nossas tão inabaláveis interações, nos últimos tempos. Discordamos sobre a longevidade de nossa amizade. Para mim, completaríamos 30 risonhas primaveras juntos, em 2009 ( tomo o primeiro semestre em que estudamos na Escola Técnica, como referência). Meu amigo, por sua vez, não abona essa fase. Situa este período como o de sondagem (a gente estava se conhecendo. Não era nada valendo ainda). E acha que começamos a nos dar, mesmo, a partir do maio de 1980, no movimento jovem salesiano e na política estudantil. Pronto. Barraco. Me arrumei todo para a nossa comemoração em 2009 e ele, ó, nem deu bola. E eu idem, em 2010. E por isso ficou.
Aqui reforço que operações matemáticas são convenções. A contagem de épocas e eras são abstrações íntimas do cocuruto. Representam a realidade. Mas não são a realidade. E hoje tenho a certeza de que amanheço e anoiteço os dias, agradecendo a Deus, como minha mãe fazia, por Ele ter colocado no meu caminho, um cara fantástico. Apesar das continhas inexatas, continuamos unidos feito unha e carne.

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