terça-feira, 5 de março de 2013

Crônica remix - O bê de bule


O Bê de Bule

Às vezes eu fico olhando pros meus meninos. Assuntando, assuntando, vendo neles as mudanças do tempo, a virada de comportamento. Dia desses num almoço in family, ao som de uma guitarra, o meu filhinho, do lado de lá da mesa se balançou no ritmo. Eu daqui, também dei uma sacudidela ao som do Rock and Roll. E matutei em silêncio: é  isso mesmo, é isso mesmo, quem disse que há uns  tempos, menino podia se remexer na mesa em plena hora do almoço. Deus te livre e guarde, era cocorote na certa. E fui mais adiante nas minhas constatações: quem disse que antigamente, o próprio pai podia responder a qualquer música, que dirá um Rock, com um sacolejo na hora sagrada do meio-dia. Nunca que podia.
Mas hoje, pode tudo. Que não fira, que não machuque, que não humilhe ninguém. O pai deixa. Em tempos modernos, diante da crueza da vida, o pai permite um tudo, desde que venha regado de candura, da fina e terna névoa de doçura que existe num comovente trinado de guitarra.
Confesso que de outras coisas pretéritas, porém, o pai aqui sente falta. E olha que dá o maior qüiproquó doméstico estas minhas vontadezinhas antigas, em plena era da modernidade. Quer ver, um conjuntinho de cambraia de linho marronzinho, que-nem-que-nem, tanto para um quanto para outro com shortinho de bolso externo e camisa de gola, é o meu sonho para os meus meninos usarem numa tarde ensolarada de domingo ( irem à missa, ao parquinho ou à praça tomar um sorvete de groselha, ou mesmo só para se aprontarem e sentarem na porta para apreciar o movimento. Eu, para um este ou para aquele ou ainda aquel’outro, felicíssimo, me ponho à disposição de acompanhá-los). Alguns probleminhas para realizar o meu sonho. Minha mulher, é claro não topa. Diz que temos um menino e uma menina e essa história de conjuntinho, quando cabia, era para irmãos do mesmo sexo. Eu, de pronto pondero: “ Ah, mas fica uma gracinha, os dois irmãozinhos iguaizinhos, e ainda mais fashion com os bolsinhos tanto da camisa de gola quanto do shortinho,  sendo de cores contrastantes do marronzinho, tipo um quadriculado matizado básico”. Ela perde a esportiva e diz que tudo isso é, no mínimo ridículo. A resistência vem também dos pimpolhos. A menina, que não sei com quem aprende, mas é uma vaidade só, não vai encarar um conjuntinho démodé mesmo que seja pra fazer o gosto do pai, de jeito e qualidade e o menino, alheio aos reclamos do pai, no domingo, prefere se ligar nos jogos do brasileirão que a uma programação na batente da casa, olhando pro tempo, a pensar na morte da bezerra.
Ah, que pena! Antigamente era comum. A mãe comprava a fazenda de duas larguras, marrom, na Pony e, à luz da sala, tecia, na vigorosa Vigoreli os conjuntinhos  (e não tinha esse negócio de para menino ou para menina, não, o modelito era no qual pega, pra todo mundo, do menor ao maior). Depois, talhava os trianglinhos dos cortes matizados e engendrava um desenho fashion aos bolsos do  conjuntinho.  Era que era uma gracinha, os pequenos abrigando as mãozinhas elegantemente na cava dos bolsos quando posavam para um retrato, no Bosque, à sombra de uma frondosa samaúma ou passeando de mãos dadas a dois, a três, pelas avenidas pedreirenses de outrora, se lixando para a Gisele ou para a última da Cê e A.
E o bê de bule? Ah, o bule! O bule, como os conjuntinhos marronzinhos, não existe mais.

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