sexta-feira, 16 de novembro de 2012

crônica da semana- lecheva


Todo mundo odeia o Lecheva

Enganei vocês, rá rá rá. Não vou falar mal do Ricardo Mendes Nascimento, não, o cara que foi o nome do Paysandu nesta reta final de acesso à série B. Convenhamos que depois do caso passado, despois do arrefecimento natural de meio de semana, das altas temperaturas resultantes da subida do bicola para a Segundona, se eu pusesse um título rasgando seda pro Lecheva, poucos iam se interessar, afinal, a esta altura do campeonato, por certo, o treinador interino do Paysandu já foi paparicado que só, e eu, agora na batida da campa, sou apenas mais um a repetir-lhe a rotina do afago. 
Do que a gente se certifica, andando pela cidade, é que todo mundo ama o Lecheva, isso sim. Por alguns notórios motivos. 
Certa vez encontrei o ex-jogador num supermercado aqui na Pedreira. Já não figurava entre os bambambans da onzena bicolar, transitava em silêncio pelos bastidores, fazia compras suportado por uma rala fama herdada do título de ‘Campeão dos Campeões’, dissipada pelo vento, pelo tempo e pelos enfezos e emburros desta peleja na terceira divisão do Campeonato Brasileiro. 
Eis uma razão de amarmos o Lecheva. Ele é um cara humilde. Quase um deus grego, humanizado na fila do supermercado. Segurou uma pá de batatas quentes nesses seis anos com o time escapando sempre pela linha de fundo e se perdendo no desânimo, no desconsolo, sem estilo ou jeito. 
Engoliu um punhado de sapos afamados e aquinhoados, bancados pela boa fé dos torcedores e dirigentes. Técnicos metidões que aqui chegaram, nutriram-se de fartos Reais e largaram nosso barco à deriva. 
O último deles, com uma carência absurda de senso de humor, um técnico carrancudo, cria da seleção de 78, pupilo da batida dolorida dos militares; o último deles, nos deixou descrentes. O misantropo Givanildo se foi, deixando um presságio aterrorizante para nosso escrete. 
Foi embora e foi tarde. Se antes fosse, sofreríamos menos. Este um motivo muito justo para amarmos o Lecheva. Ele não nos chicoteou com derrotas inadmissíveis (daquelas com um gol do adversário nos últimos minutos silenciando a torcida). O gráfico do Lecheva nesta última fase do campeonato reflete uma melhora continuada. É um traçado bom de ver. 
Por último, vejo que esta marca, este baque de boleiro que o Lecheva carrega, canaliza a admiração dos jogadores e da torcida. Nessa hora, pesa a cancha, a experiência de quem viveu céus e infernos dentro de campo. 
O detalhe mais importante na conduta do Lecheva e que o enobrece, é a lealdade, e eu diria até, que ele demonstra um amor inconteste pelo Paysandu. Somente amando o clube de forma desmesurada é que alguém chega ao topo mesmo sob o estigma de eterno interino, mesmo no desconfortável status de substituto. 
Sobre o atual (e ratificado) treinador da Paysandu, recebi um texto sublime do Dr. Roger Normando que repasso aqui na coluna. Com a certeza de que toda a nação bicolor ama o Lecheva. 
“Na corte tinha um rei admirado por todos, pois albergava humildade em seus gestos/O que fizesse, todos os súditos repetiam./Achou de se deitar de cabeça para baixo no alpendre de seu quarto: todos viraram morcegos./Exercitou cuspir fogo: todos fumegavam como dragão./Passou três noites sem dormir: e todos viraram zumbis./Resolveu voar com as asas nos pés: todos viraram pé-de-anjo/Começou a andar com a cabeça guinada para o lado; todos repetiram o empeno/Até que veio a guerra e todos se viram de prontidão/O rei venceu a guerra graças aos seus súditos plantando bananeira, cuspindo fogo com pé-de-vento e o pescoço guinado para o lado do coração.” 

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