sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

crônica da semana- te sossega

Te sossega, pequeno, cria termo
Às vezes, a gente se vê em situações-limites em que uma decisão precisa ser tomada, um jeito nas coisas tem que ser dado, Uma definição para os haveres tem que vingar. Nessas horas bate o nervoso.
Cada um de nós tem seu calibre para esses momentos. Reações historicamente medidas. Mas na maioria das vezes, a nossa resposta foge à regra, não é previsível. Reagimos intuitivamente e quase às cegas da razão.
Dia desses, me vi, com dizia minha mãe, encalacrado. Pressão por todos os lados. Medo e solidão. Mas tinha que ser eu mesmo na parada. E me virei nos trinta. Virei, mexi, e ainda, segundo minha mãe Luzia, pintei os canecos. Fui varando, resistindo às intempéries. Embora eu tivesse que me aviar ligeiro, ainda deu pra me perceber, me observar. Atinar para a minha batida de nervosinho.
Descobri que, quando me ‘vejo no calor da luta’, eu me dano a comer. Quanto mais aperreio, mais fome. Uma fome sem sentido, às avessas e inexplicável. Nesta empreitada recente, para dirimir o sufoco, em poucas horas, enquanto maquinava soluções, acabei com o meu frugal jantar da semana (que se constituía em dois pães, meio pacote de bolacha, uma banana e uma banda de mamão). Andava um pouquinho, dava uma mastigada. Uma ligação, dúvidas incessantes, estresse e mais uma volta pela cozinha. Até um tabletinho de chocolate espanhol que havia ganhado da minha cunhada e que guardava como relíquia, foi no embalo.
Pra gente que está à deriva, é difícil criar termo. Não dá pra controlar o vento nem as ondas, e o usual é sucumbirmos aos tiques. É quase impossível para o ente, sossegar.
As manifestações são as mais diversas. Eu, meio que viro um avestruz e como de um tudo. Outras pessoas dispersam a tensão com expressões físicas ou emocionais.
Minha amiga de trabalho Paty, por exemplo, mexe o pezinho. Ela sobrepõe os pés de forma que o pé que fica embaixo toque sutilmente o chão com a ponta do sapato. Funciona como alavanca. Dali, vem a força para vibrar todo o conjunto de panturrilhas e calcanhares em movimentos verticais acelerados. Para cima e pra baixo. E sem que ela se dê conta da maratona. De cá do meu cantinho penso: “ihhh, tá pegando ali pra’quele lado”. Disparo uma água-com-açúcar verbal qualquer e atenuo o clima com uma pergunta apaziaguadora: “e este pezinho balangando aí?”. Um esforço, faço, para que tudo fique na mais perfeita calma. E para que minha companheira de trabalho se sossegue, crie termo e produza, mas produza na paz.
Mas a manifestação que mais me impressionou, dessas ‘sem’querências’ nervosas, foi a da minha amiga Indy, num seminário que fizemos lá no curso de Geologia.
Havíamos de dissertar sobre um livro clássico e na hora o professor sorteava qual o capítulo exploraríamos. Ou seja, tínhamos de dominar todos os capítulos. Quando chegou a hora dela, a Indy desabou. Foi impressionante. Postou-se a frente do quadro e não controlou as lágrimas. Chorou, falou palavras desconexas de escusas, de desculpas e ponderações. Tentava explicar aquela situação inexplicável. Mas aquela cena, aos poucos foi se transformando numa sinfonia ao contrário e demonstrando o quão maravilhosa é a nossa mente. De um alegro convulsivo, Indy migrou para um adágio adocicado. Sem que ninguém a interpelasse ou a amparasse, Indy parou de chorar, enxugou as lágrimas, abriu seu apontamento. Venceu o medo de falar em público, o tema complexo e deu um show. Nos brindou com  uma das mais competentes apresentações daquele dia. Superou-se, Indy. Aquietou-se, criou termo e ao final do seu trabalho, nos emocionou a todos.

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