quarta-feira, 6 de julho de 2011

Impressionante


Tantos anos, convites e nada de calhar d’eu ir passar uns dias em Algodoal.
Este ano, desamarrei o quebranto. Venci a idéia pré-concebida (e falsa) de que era um lugar longe; rolei por cima da preguicinha que me leva somente até ali no Caripi (e muito de repentemente); desfiz o pavor que reinava dentro de mim só de pensar na travessia; juntei a família e aprumei no rumo de Maiandeua.
Algodoal é, incontestavelmente, o que dizem. Tudo o que eu ouvira falar sobre a ilha é verdade.
Logo na primeira investida pelas areias da praia da Princesa decidi delegar todos e quaisquer prazeres mais custosos para os meninos. Não por nada, mas a lógica me impunha a consciência de que, assim, aproveitariam do caráter lúdico da aventura, e com o vigor da adolescência, seria muito mais fácil para eles, escalar o sotavento das dunas ou atravessar a ponta da praia por sobre as pedras ou mesmo explorar o caminho que leva ao lago de água doce. Eu me conformaria em tirar as fotos e ficar de molho (depois da hercúlea missão de cruzar o percurso de areia fofa) nas águas achocolatadas do lago da Princesa. Sem nenhum ressentimento ou frustração. Os filhos não são um pedaço da gente? Pois é, se eles estão felizes, estou também. Se exultaram com tantas emoções na caminhada até o lago da Princesa, também transbordei de alegria (com a vantagem de não ter sofrido um piripaque ou ter chegado na baba, soltando os bofes, um risco admissível, se eu me entusiasmasse e me abalasse às extravagâncias sob aquele impiedoso sol do meio-dia. Eu, heim, a aventura para mim é vigiada de perto pela prudência, por isso, claro, peguei um atalho e enquanto os meninos fururucavam subindo e descendo as dunas, eu, ó, só na manha: cheguei inteiraço).
Algodoal não se eleva somente pelas belezas naturais. A riqueza de seu povo é também de inestimável valor.
(Não conhecia o Chico Braga. Mas os mitos não se subjugam, não se dobram às formalidades. São, simplesmente. E foi assim que reconheci naquele homem sentado na calçada de um bar, improvisando refrões, a magia de Chico Braga. Uma pessoa especial. Fiquei um tempo a observá-lo. Encantado... Me senti tão pequeno, naquela hora...).
Na véspera de vir embora, a noite nos brindou com um feixe de meteoros cruzando o céu, a lua crescente prateou o horizonte e uma voz ao longe aninhou-se confortavelmente aos acordes de Wish You Were Here. Na praia, cada um curtindo o seu barato.
Algodoal é palco de grandes inspiraçãos, insights, explorações nas profundezas do ser. No caminho para o lago, paramos para apreciar uma espécie de celebração. Algumas pessoas já se juntavam em torno de um rapaz.
- sabe o que mais me impressiona aqui em Algodoal? – dizia ele com olhar contemplativo. Uma ansiedade tomou conta da gente. Um belo poema deveria brotar daquele êxtase. Uma canção. Uma profecia... Ele abraçava-se aos pés de ajiru, rolava a barlavento, nas dunas, erguia os braços, messiânico, para o infinito. O rosto concentrado, uma fervorosa fé abrigada naquele semblante.
- sabe o que mais me impressiona aqui em Algodoal? É que aqui, é tudo muito...muito... – As pessoas entreolhavam-se ansiosas. Poderia ser ele um biólogo? Será que um daqueles arbustos que margeiam o caminho do lago não tem o princípio ativo para a cura do câncer? Esperanças revelavam-se nos olhares...
- É que aqui é tudo muito, muito, muito... Impressionante – Pronunciou “impressionante” com tanta energia que perdigotos múltiplos saltaram dos seus lábios umedecidos. E nada mais foi dito. A seguir, verifiquei o rumo na bússola e segui meu caminho para o lago, só na manha.

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