sábado, 26 de janeiro de 2013

crônica da semana - gengibirra


A gengibirra no barracão
Não havia, ainda, durante as minhas andanças, quebrado a BR um tanto estirado de responsa no rumo da Belém-Brasília. Até que entramos, um trechinho, numa viagem de campo pela Universidade, mas foi só até a primeira ocorrência do Arenito Guamá, antes de São Miguel, bem ali, ó, um nadinha de estrada. Mas no último final de semana, conheci os encantos desta parte do Pará. Fui bater em Irituia.
A cidade fica a sudeste de Belém, e mescla sua influência entre o eixo desenvolvimentista da Belém-Brasília e o traçado cítrico do caminho que leva à nascente do rio Guamá, e, em tons singelos e alegres, se harmoniza em cenários cheios de surpresas.
(Não posso deixar de dizer que antes de chegar em Irituia a gente se depara com um rio Guamá totalmente diferente desse que a gente conhece. Àquela altura do seu curso o Guamá tem uma envergadura bem mais modesta e a cor da água está longe de ser aquela barrento-cremosa que a gente enxerga aqui na biqueira do Portal. Nem parece o mesmo. Detalhes, pródigas dessemelhanças que, daqui pra’li enriquecem a tez deste Pará).
Fui a Irituia para cumprir um rito cultural. Conheci almas e sentimentos, abstraí valores e intenções, refleti sobre a natureza criativa dos artistas populares, examinei com aguçada curiosidade a raiz provedora de ritmos e cores, voltei o olhar para o fulgor incessante que anima de calor e arte um povo decidido, lutador... E quando dei por mim, estava lá no barracão, envolvido pela grande roda do Carimbó e pelo sabor arrebatador da gengibirra.
É que semana passada ocorreu por lá, o Festival do Carimbó. Fui agraciado com um convite para acompanhar a festa e fiquei maravilhado com o que vi. Os irituienses afirmam que cortam e aram no Carimbó. Que o Carimbó de lá é o autêntico, o verdadeiro. Embora as opiniões divirjam há certezas por lá. E o fato deles encarreirarem três dias num grande folguedo, avaliza esta certeza. E olha, pela pegada do povo, não duvido não. A festividade é um momento de intenso envolvimento popular, de conivências comunitárias. Há um exercício de relações interessante, durante a festa, momento em que tradicionais e saudáveis costumes são reeditados com entusiasmo e reverência, como as cerimônias que envolvem a implantação e a derrubada do Mastro de São Benedito.
O início de janeiro é marcado por grandes e caras simbologias irituienses. Dentre elas, o mito gengibirra. Reivindica-se na cidade, a origem da bebida. Com referências, inclusive, para os remotos anos finais do século 19. Se a gengibirra surgiu naquelas paragens, uma pesquisa histórica apurada pode até confirmar, mas que eles têm uma intimidade com a fórmula mágica, ah, eles têm. Provei de tudo quanto foi gosto e jeito, com os mais variados arranjos, desde a minimalista com gengibre, cachaça e só, até uma combinação aprazível com o doce do mel. Provei com moderação, acreditem.
Muitas foram as surpresas agradáveis que encontrei neste passeio ao Leste paraense, mas sabe, tenho dentro de mim, no mais absoluto sentido figurado, 50% de um Geólogo, então, confesso que o objeto do meu mais desbragado fascínio foi mesmo a exposição de rochas esculpidas conhecida como “Vila Pedra”, no entorno da cidade. Uma ocorrência deslumbrante do Arenito Guamá numa zelosa exibição plástica às margens do rio Irituia. Um irrevogável patrimônio natural da cidade.
Trouxe de Irituia, boas lembranças nos versos de Mestre Minga “No mês de Janeiro, pra Irituia eu vou/pra festa de São Benedito...Lá tem a missa, a procissão...Tem gengibirra no barracão” e a belezura Paleozóica da Vila Pedra, acrescento. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário