quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

crônica remix-bandeira


Tão Belém
Em novembro do ano passado, durante o Encontro Nacional de Cultura do Sesc, me dei com uma turminha bacana. Jovens artistas, produtores culturais, educadores, de fora do Estado, do interior. Todos muito gentis e agradáveis de estar. Num final de tarde, nos juntamos uns quantos e fomos para o Bar do Parque passear, espairecer um pouquinho. Alguns não conheciam nem a praça, nem o bar. Sabiam da fama do lugar, mas ainda não tinham experimentado um happy hour sob os auspícios daquele cantinho de Belém. Uns poucos, já eram vetera, como eu, de tantas e indomáveis ‘buxixeatas’, na batida da campa dos anos oitenta.
Subimos a avenida, os degraizinhos do bar e fomos nos ajeitando por entre as cadeiras e mesas de ferro até aquela última mesa que fica de quina com o calçadão da praça, ao pegado do ponto de táxi. Eu que não sou besta nem nada, guiei o pessoal pra’li. É o meu lugar preferido (houve uma época, quando eu trabalhava por aí pelo mundo que, quando chegava de férias, passava horas, levantando copo naquele lugarzinho, pegando respingo da chuva fina, contando as colunas neoclássicas do teatro da Paz, apreciando aquele vai-vem da esquina da Gama Abreu com a Presidente Vargas, dando um cigarrinho pra um, uma moedinha pra outro, dispensado aquel’outro mais insistente com um aceno decidido).
Mas, ô coisa pra dar certo: quando a gente tava ali, num aplicado simpósio, eis que me apareceu o Bandeira e choveu uma chuva fina, exatamente nesta ordem. E ninguém, ó, nem seu souza pra o chuvisco, nos confraternizamos alegremente com o novo integrante da nossa reuniãozinha.
Ao final dos abraços e apresentações, o Bandeira, contextualizando aquele momento, cunhou a frase decisiva para aquela tarde: “tão Belém, isso”.
Aquela frase ficou na minha cabeça. “Tão Belém”. Gente que se gosta, generosos sorrisos, esquina movimentada, teatro ao lado, risco iminente de manga desabando, garçom se fazendo de mouco, dialeto afrancesado-mas-como-já, céu plúmbeo. E a conversa rolou agradabilíssima sem dar a mínima para a máxima umidade relativa do ar.
Deu certo, também, porque o Bandeira é uma escola. Transita com muita desenvoltura por várias áreas do conhecimento. Da culinária, às artes plásticas; da Sociologia à simbologia pagã; da política à poética (sem confundir tais artes, diga-se). E é também uma parte viva, indiscutivelmente fértil da história recente de Belém. E aí uma conversa puxa outra. A gente enche o copo em mais uma rodada e espera pacientemente por outra cerveja.
E recebemos, encantados, recados preciosos dos dias belemenses, pelos causos que o Bandeira desandou a contar. Tudo vivido ali, nas imediações da Rua da Paz: A dita buxixeata, na campanha do Lula em 89; o movimento estudantil em favor da meia-passagem; A luta pelo porto de Carajás (que perdemos para o Maranhão); O Paranatinga Rui e o maestro Waldemar Henrique; A música e a poesia, nas intermináveis noites depois da Adega do Rei; o papo cabeça do explosivo teatro do Luiz Otávio Barata, depois do ensaio de ‘Genet - o palhaço de Deaus’; a Festa da Chiquita só com os “Borboletas do Mar”, com a Cristina Gazel, o Moura, minha namorada e mais uns poucos gatos pingados amparando os copos de cerveja em caixotes de madeira. O silêncio e a transladação passando
Testemunhos, confidências, descobertas e redescobertas. Surpresas. O Bandeira não é Geólogo, como eu ou uma pá de gente pensava. É Sociólogo. Revisões. Atenção da platéia. Gente de bem. Ligada à cultura. Refletindo. Ouvindo. Terapia de bar. Frustrações coletivas. Alívios. Corações mais leves. Mentes mais seguras. Sem culpas. Rio de Janeiro (Luiz bandeira é carioca). Manhã friinha. Cobertor. Amor. Proibido amor. Um poema. Fernando Pessoa. Cecília Meireles. Que seja eterno enquanto dure, Vinícius. Com tanta força, tanta expressão, sentimento. Chuvinha salgada. Sal e chuva. Lágrimas.

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