sábado, 8 de dezembro de 2012

crônica da semana- suécia


A Suécia bacana

Tem aquele samba, né, que fala que lá na Suécia é tudo muito honestinho, as pessoas são muito retas, muito certinhas, a ponto de, mesmo sem qualquer atendimento ou espreita, ‘levar o bagulho e deixar a grana’. 
Ouvi mesmo por pessoa da minha mais profunda confiança, e que parou por aquelas paragens nórdicas, que na Noruega, o cidadão se autopatrulha. Soube do exemplo do metrô. Lá, o sujeito compra o direito de fazer as viagens, mas não tem bilhete, catraca, nem nada. O embarque é na base da chancela moral. O que me chegou é que se o camarada está quites, ele usa do serviço normalmente, mas se não está, ele mesmo se barra. Vai a pé ou de outro transporte qualquer. Não pagou, não anda de metrô. Cuida para não se permitir uma subversão deste porte. Que coisa, né. Dizque até que existem uns engraçadinhos que tentam engabelar o sistema, mas o que se passa com eles, se os descobrem, não vale a incorreção. São submetidos a inúmeras vexações, bicotes sociais, horríveis sacrifícios... Por lá, o cidadão se apruma no rumo, para não passar por poucas e boas. Me contaram. 
E eu acredito que em algum lugar frio do mundo, as coisas se passem desse jeito. Porque aqui mesmo, nos trópicos, já vi, ou melhor, já vivi a cordialidade e a precisão ética dos aloirados do norte. Foi numa época em que a mamãe inventou de ter uma quitanda. 
Coisas de mamãe, que sempre foi dada aos negócios da venda. 
Depois de uma experiência positiva numa esquina da Marquês de Herval, mamãe apostou nas frutas e verduras. Só que o ponto, embora privilegiado, era caro e só garantia um lucrinho apertado assim, assim quase nada. Foi aí que ela decidiu usar o espaço bem em frente à nossa casa, na Vila Mauriti. Ali estaria isenta de aluguel e dos extras de água e luz. Pai d’égua! Contou também com a otimização dos tempos da galera lá de casa que se revezava tomando conta da quitanda. Como nossa vendinha era uma extensão da casa em que morávamos, botávamos fé nos vizinhos da vila ou num e noutro circunstante lá do asfalto que se abalava pra comprar uma couve, uma banana, a batata, o tomate, um isso de alho, um aquilo de pimentinha de cheiro, uma banda de ‘jurumum’. 
E essa aproximação, essa relação clean, conivente, solidária (coisa de vila, quem morou em vila sabe como é que é) deu uma turbinada nos nossos tempos tão concorridos. Em casa, todo mundo fazia alguma coisa. Todo mundo estudava, a mamãe tinha outras vendas, eu fazia as cobranças, minhas irmãs ganhavam uma graninha aqui outra ali cuidando do filho dos outros. O resultado de afazeres vários era que em alguma parte do dia, não ficava ninguém tomando conta da quitanda. Nessa hora, o caráter escandinavo dos habitantes da Mauriti se revelava. Quando dava de alguém se abalar pra tomar a frente da baiúca, uma penca de banana já havia sido levada; uma réstia de cebola, subtraída da parede; um lote de sortido pra peixe fazia falta no balcão... Mas o dinheiro estava na caixa, certinho com as vacâncias e haveres. Os vizinhos chegavam, batiam palmas, chamavam à porta, e se ninguém aparecia, faziam suas escolhas, quitavam o débito, transacionavam trocos contornando o balcão dando na caixa de papelão que guardava o numerário e saiam felizes e satisfeitos com aquele arremedo setentista do que mais tarde conheceríamos como self service (injustiça hoje a as instituições comerciais não reconhecerem a mamãe como umas das criadoras desta modalidade de atendimento no Brasil). 
Ainda não visitei os países nórdicos, mas posso assegurar que o alpendre da minha casa já foi um dia, um pedaço da Suécia bacana. 

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