sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

crônica da semana - Olê, olá

Olê, olá, Belém

Nesse finzinho de janeiro, mês que se comemora o aniversário de Belém, quero fazer uma homenagem a este pequeno que é incorrigível, destrambelhadamente apaixonado pela mangueirosa. A música dele, todo ano a gente canta: “Olê, olá, Belém/minha namorada que me trai também...nem bela e nem formosa/cabocla desajeitada e pequenina/simples como a beleza de uma rosa/mundana que não pertence a ninguém”. Um samba, uma confissão de amor que, tenho pra mim, figura entre as três declarações mais mimosas que a cidade já recebeu (as outras duas, entendo que estão contidas nos versos de “Flor do Grão Pará”, do Chico Sena e no poema inspiradíssimo de Adalcinda Camarão, “Bom dia, Belém”). 

Não somos íntimos. São contadas as vezes que nos topamos teti-a-teti. Uma vez na escada do prédio da Biologia, na UFPA, onde evidenciou-se a impressão de que nos conhecíamos de algum lugar, e nada mais que isso. Uma outra vez num happy hour com poesia, num dos pontos chiques da cidade. E ainda a última, no lançamento do livro do poeta Renato Gusmão. Poucas vezes. Mas plenas de agradáveis surpresas. Credito este vago de encontros aos caprichos do tempo e das oportunidades (porque escapamos de conviver mais intensamente naquela época em que ele, o compositor já consagrado, Alcyr Guimarães, lançou seu olhar dadivoso para o nosso ‘Grupo Musical Hera da Terra’. Foi um tempo bacana. Alcir participou de alguns shows, produziu, se interessou, aproximou-se da Déia Palheta, uma das nossas estrelas...fizeram trabalhos juntos. Mas olha só a arte do desencontro, eu fazia parte do grupo, só que nessa época, estava fora de Belém, na lida pelos ermos da floresta. Perdi). 

Sou fã. Do cantor, do compositor, do amante das artes. Do mestre. Mas sou fã, mesmo, do cara, do camarada, do amigo Alcyr. E muito pela surpresa dos raros encontros. 

Naquele happy hour, por exemplo, fiquei besta de ver como o Alcyr é franco no termo e no traço. Nunca tínhamos nos falado. Estávamos numa mesa com vários ilustrados (e eu era só um pão de sal em meio a tantos croissants), mas ele se ajeitou ali do meu lado, me deu ibope. Trançou conversas, contou ‘causos’. De prima me chamou pelo nome e sobrenome, fez-se presente numa folga tal que, se um desavisado abstraísse aquela cena, intuiria que nos conhecíamos desde a mais tenra infância. Agora ‘mire e veja’ a minha pavulagem. Passei dias com cara e jeito de metidão só porque tinha encarreirado uma prosa com o grande Alcyr Guimarães, pelas quebradas da Matinha. 
Ele é assim mesmo. Chama atenção pela humildade. No lançamento do livro do Renato, este detalhe no caráter do Alcyr aflorou novamente. O espaço estava lotado, cadeiras ocupadas. A gente vê, nessas horas, o frigir das vaidades. Eu, pra frente que sou, fui me enfiando, ganhando terreno, me aquietei num cantinho. Peguei meu autógrafo e fiquei por ali apreciando as atrações da noite. Quando olhei pra trás, encostado numa coluna, em pé, silencioso, discreto, quem me estava? O mestre. Só saiu de lá quando alguém demandou um violão e ele prontamente se ofereceu pra tocar. Retirou-se (desconfio que foi lá no Jurunas buscar a viola) e quando voltou, pôs-se à disposição para acompanhar os cantores e as cantoras que iriam dar as canjas da noite. Achei aquela sequência de discrições bem postadas e entregas desmedidas, uma revelação. Uma lição. 
Lamento não poder ter e haver com o Alcyr mais vezes. Sorver, mais frequentemente, um tiquinho do talento e da candura dele. Mas esta distância dócil e indolor, acaba nos unindo. Algo nos faz perto. Olê, olá, Alcyr, amamos Belém. 

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