sábado, 27 de agosto de 2011

crônica da semana - amar e ...


Amar e outros medos (parte II)
Tenho medo que me pelo de cachorro. É psicológico. Problema do inconsciente. Não do meu. Do deles. Não podem me ver que querem tirar uma casquinha. E tanto faz os gitinhos ou os ‘rotvaileres’. Todos miram o meu calcanhar. Não tenho nada a ver com isso. Não tenho nada contra os cachorros, eles é que arengam comigo.
Há dias, porém, que a caravana passa, mas os cães não ladram. Domingo desses, houve d’eu tomar conta de uma cachorrinha. Nunca na história deste país isso havia acontecido. Minha amiga precisou entrar num supermercado e eu fiquei com a bichinha no colo. Não tive medo de uma mordida. Contrariando Newton, a reação seria infinitamente maior do que a ação porque a belezinha era deste tamaninho, coisa de palmo e meio! Tão pequenina que penso chamar aquele serzinho liliputeano de cachorra, seja até uma ofensa.
Para aquele mimo, mais caberia a designação de chaveirinho, brinde, suvenir, sei lá. Menos cachorra. Cachorrinha, cadelinha, mimi, bebê, tico-tico, cuticuticozinha-da-titia-e-de-todo-mundo-que-passa-e-fica-encantado, talvez. É de uma raça de cães considerada a de menor envergadura, pela federação Cinológica Internacional. O look dela inspira carinho e dengo. Sabe o Floquinho do Cebolinha? É bem parecida com ele. Não fossem os olhos pidões saltados, poderia muito bem ser confundida com um chumaço de algodão doce no meu colo. Daquela variação emplumada de Pincher, terna e graciosa, não há nem como ter medo.
Agora, tenho pavor daquele momento ali pelo final dos telejornais, quando um cantor é convidado para fechar a edição. Fico tenso. Me inquieto horrores com aquelas perguntas reincidentes e sem fim. E o pequeno lá, com o violão em riste pronto pra mandar o som. Quando enfim o cantor é acionado, ele também não ajuda. Faz é aumentar o temor. Desanda em malabarismos harmônicos e prolonga meu sofrimento. Outro dia, a coisa foi trágica (ou risível, sei lá). O pequeno debruçou-se sobre o violão e pôs-se a dedilhar. Dissonante pra cá, dissonante pra lá. Batidas alternadas, refinadas. Floreios e revolteios. Aí, quando fez menção pra cantar, pluft. Subiu o letreiro, cortaram o som e terminou o jornal. Pô, pirei com aquilo. Quase tive uma síncope.
Falando nisso, um medo que me perseguiu por esses dias foi o alheamento do meu violão. Entrava, saía de casa e o bichinho ali na parede com aquele ar imaculado, virginal.
Não sou bom tocador. Arranho uns quadrados e encarreiro uns nananãs porque não consigo decorar as letras das músicas. Mas meu violão é um companheiraço. Me avia em tudo em quanto. Na tristeza, na alegria, na pobreza (sempre pelo comum) e na riqueza (experiência ainda não vivida). Não tem nem por que ele ficar largado ali no canto da sala. Fiquei numa agonia. Numa apreensão. Num pé e noutro tentando entender aquele fastio. “Será que não vou mais dar trela pro meu violão, meu pai?” Me perguntava a cada trânsito indiferente e frígido pelo corredor.
Até q ue um dia, cheguei do trabalho e sem trocar a roupa, nem tomar banho, nem mesmo arrumar lugar para me ajeitar (sabe aquela situação de tesão incontrolável, tipo escada de prédio, elevador, pois é), resgatei da parede insensível, o meu companheiro. Fiz um Sol simplesinho e engatei em “Dodói” (que é uma música que dou maior ponto), do Juraíldes da Cruz. Toquei, toquei, toquei. De todo jeito e maneira. Depois sem patrulhamento ou pudor aceitei um link antigo do João Mineiro e Marciano: “é minha cara/mudei, minha cara/mas por dentro/ eu não mudo”. Fiquei um tempão ali com meu violão. E descobri que nosso amor ainda é tudo. Tudo.

3 comentários:

  1. Acordei cedo pra esperar o jornal.
    Hehehe. Vc toca e eu canto.. Nana neném..

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  2. amor verdadeiro é assim mesmo, a gente até pode deixar de canto um pouco, mas depois não resiste. não sabia desse seu medo de cachorro. eu tenho 6 gatos em casa e 4 deles estão precisando de um lar adotivo. eles não mordem!!!! quer um?!!!! rsss bjs e bom fim de semana.

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  3. Se fosses visitar a Karla, conhecerias que com o Pelé (seu cachorro meio vira-lata meio dobermann) e verias que com ele não há motivos para medo. Ele, ao contrário da maioria dos cães, recebe todo mundo com aquela alegria canina. Até eu com toda minha insensibilidade aos típicos animais domésticos gosto do Pelé.

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