Exotérico
Olha
só quem eu me atrevi corrigir, dia desses, o Eric Hobsbawm. Metidão eu, né.
Ainda bem que logo fui obrigado a retroceder (como diriam os bons locutores
esportivos de dantes).
Eric
Hobsbawm é um dos maiores intelectuais do nosso tempo. Historiador, pensador. Nutria
uma curiosidade sobre o Jazz (e até uma intimidade: compus com o jornalista
Edir Gaya, a música “Pedreira ‘Jazz’ Pedra Noventa”). Daí, andei que só
prestação em fim de mês, por esta cidade; me bati pelas poucas livrarias de
Belém, atrás de um livro dele sobre o tema. Já estava desistindo, até que, pela
luz divina, achei.
A
linguagem do autor é aquela, entre o acadêmico e o informativo. Um traçado
natural para escritores do top dele. O Raimundinho aqui, é claro, ralou, leu
duas, três vezes, a mesma passagem para entender melhor. Desconfiou da tradução em encarreiramentos do
tipo "Observadores eruditos
ortodoxos muito esnobes", mas foi em frente, interessado que estava no som
que ascendeu do delta do Mississipi. Por acolá, a bronca: no trecho em que se
refere a “discos de nomes exotéricos”. Na hora liguei meu desconfiômetro.
Estranhei a forma de ‘exotérico’ com ‘xis’. Cavuquei o cocuruto e achei uma
música do Gilberto Gil com este título, mas não menos intrigante, na parte da
escrita. Tem um som de ‘zê’, na pronúncia. A primeira reação foi pesquisar a
letra da música (aí sim, armaria aquele fuá, aquela cena toda de correção e tal.
Tudo bem, levaria a conta para a tradução, mas o Eric Hobsbawm entraria,
na certa, como litisconsorte).
Comentei em casa. “Oh!”, nos horrorizamos
todos. Achamos a música do Gil que grafa bem grafadinho em um dos versos da
letra e no título, ‘esotérico’, desse jeitinho mesmo, com ‘ésse’. Taí, nem o
senso comum pautado na fonética, nem o intelectualismo do historiador. Reinou a
minha empáfia.
A
primeira impressão, a primeira informação, conclusões imediatas, presunções
ocasionais, um pouquinho de sadismo, bestice e pavulagem, essas coisas é que
acabam com a gente, destroem posturas. Percepções imponderáveis estimulam o
preconceito, regam a intolerância, modelam diferenças. Retrocedo e admito que a
humildade deve sempre estar em pauta. A racionalidade há de ser a regra.
Observar as versões, considerar as composições. Os lados vários de um tema ou
objeto. Estes são os comandos para barrar as injustiças, os ódios gratuitos, os
julgamentos vis. E também para dar conta das minhas besteiras e barrá-las a
tempo. É claro que um livro como “A História Social do Jazz”, produzido há mais
de trinta anos, com várias edições e em várias línguas, escrito por um pensador
brilhante não iria abrigar em tão elegante tessitura, erros primários. Desconfiômetro
de novo e, eis que me aprofundei na pesquisa.
No
dicionário, achei duas formas: “esotérico”, como na música do Gil, e
“exotérico”, como na escrita do historiador britânico. As duas, com
significados até opostos coincidem na dedução: quebrei a cara ao querer ser
metidão exatamente diante de palavras exóticas onde o ‘ésse’ e o ‘xis’ têm som
de ‘zê’. Ao cabo e ao fim, boiei de tudo, como uma pessoa melhor.
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