Las niñas
Luzia
foi uma mulher maravilhosa. Lutadora. Saiu do Acre com quatro filhos agarrados
à barra da saia, desembarcou do Domingos Assmar, no porto de Belém com nenhuma
esperança. Mas não desanimou. Não se abateu. ‘Virou, mexeu, pintou os canecos’
e conseguiu criar todos os pequenos. Era professora formada, mas trabalhou um
tempo com carteira assinada (pouco tempo), como caixa, na antiga padaria
Aveirense que ficava de confronte ao Museu, depois ganhou a ruas de Belém, vendendo
de um tudo. Se batia, também, com uma barraquinha de confecções na feira da
Pedreira (em frente ao Bazar Brasil, como dizia a propaganda da rádio cipó).
Embora tenha encontrado tantas dificuldades pelo caminho, minha mãe cumpriu a
nobre missão de garantir a vida aos filhos. Agora em 2008, faz dez anos que
minha mãe nos deixou. Mas para mim, mamãe não morreu, não. Luzia vive, e muito
intensamente, no que sou. Está na minha batidinha diária, no meu entendimento
sobre a conquista de cada palmo de vida, está na resistência e na luta contra
as porqueiras e as tosses que tentam nos roubar o fôlego. Está na minha mania
de andar a pé pela cidade e dita, no meu cocuruto, muitos dos dizeres e
fraseados que uso nas minhas prosas aqui na coluna . Sinto minha mãe por perto
a me guiar e a me aliviar a alma. Por isso, como dizia a Luzia: “tanto faz José
como Cazuza, o que importa é que por onde se enxerga, sempre vou indo muito bem”.
Minha
mulher Edna tem a virtude de ser amiga, de ser fiel, de ser companheira. É uma
mulher inquieta. Não aceita o revés: vai à luta. Mas tem uma serenidade de dar
inveja. Tem a capacidade de contemporizar. Sempre que o aperreio se instala,
Edninha está ativa, presente, armada de sutileza e calma.
Conhece
todas as minhas fraquezas, sabe dos meus defeitos, reconhece as minhas poucas
virtudes e me é a companheira que me “suporta e chega a me amar”. Estamos
juntos há 19 anos dividindo momentos felizes, refletindo a qualidade do nosso
amor, revalidando os nossos compromissos.
Sabemos
do desafio de nos tolerarmos, mas somos românticos e quando o coração fraqueja,
quando a cabeça roda, quando o corpo cambaleia, busco na vitrola os argumentos
dos versos cantados pelo Chico Buarque, e faço deles a minha remissão e a minha
expressão de carinho: “Amo una mujer clara/ que a mim me ama/ sin pedir nada/ o
casi nada/ que no és lo mismo/ pero és igual...”
E
assim renovo a certeza de que “Soy feliz,/ soy un hombre feliz.” Amaranta Maria
chegou assim, trazendo o charme estilístico da aliteração no nome. Para mim foi
uma luz, uma prova da vida eterna, da reedição da esperança. A chegada de
Amaranta representou pra mim a confirmação da “ânsia da vida por si mesma”.
Minha filha nasceu com os olhos negros e graúdos dos Sodreres e herdou a boca
avermelhada e bem desenhada da avó Luzia. Veio ao mundo para prover a minha
alma de mais força feminina.
Ganhou
o nome das páginas do romance do Gabriel García Márquez “Cem Anos de Solidão”. E
é, verdadeiramente, uma menina ilustrada. Tem a elegância da fidalguia e o
destempero descortinado da plebe. A tez escandinava inspira certa distância,
mas ao mesmo tempo desperta encanto. Amaranta é amável, severa, sensível, implacável,
doce e amara... Maravilhosa e sabiamente paradoxal.
Quando
eu vi, na folhinha do ano, que meu dia aqui na coluna cairia exatamente no dia
em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, falei, legal! É a chance de
homenagear as mulheres da minha vida, atomizações luminosas de todas as
mulheres do mundo: minha mãe Luzia, minha mulher Edna e minha filha Amaranta
Maria.
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