De
cabeça pra baixo
Vocês não vão
acreditar. E se eu não tivesse visto com meus próprios olhos, também não
acreditaria. Mas eu vi. E estava deste tamanho!
Estava com uma
malária braba. Tratado no Aralém e na Primaquina. Fraquinho que só. Descorado
de dar dó. Internado em Porto Velho, após o arrefecimento das febres, já na
convalescência, me animava pela manhã e saía pelos coredores da clínica
procurando ganhar uma cor com os raios de sol das primeiras horas do dia. O
hospital era da própria empresa que eu trabalhava. Na época, como a malária era
tanta, um hospital para tratar a terçã era pauta de investimento imprescindível
a qualquer empreendimento da região que buscasse lograr algum êxito nos
negócios. Independer da letargia da saúde pública era essencial. A malária
dava, a empresa tratava, a gente retomava uns quilinhos e pronto estava pronto para
o trampo outra vez (ou para outra malária).
Estava na
segunda malária. Falciparum, a maldita. Mas me considerava experiente. Tinha
passado por uma mais branda anteriormente. Estava adestrado ao tratamento daí o
meu roteiro matinal nesta fase de recuperação, sem medos maiores de dar um
piti.
Acordava cedo,
tomava meu café de doente, um banhinho, pegava o pedestal do meu soro e saía ao
passeio. Dava um alô para o pessoal da administração, uma bitoca nas
enfermeiras, chamegava com a tia da limpeza, ia de quarto em quarto visitando
meus companheiros de trabalho. Numa dessas, dei com o Piripiri.
Era da minha
equipe. Trabalhava comigo na mina. Tinha chegado na noite anterior, por isso
não sabia nada do caso dele. Fiquei interessado porque ele estava muito
machucado. Todo mordido.
Ocorre que,
também na equipe tínhamos um índio Macuxi. Manuel Ambrósio Januário. Eu achava
estranho aquele nome sem sobrenome, mas isso é o que de menos estranho havia
nele. No acampamento ficava de olho. Tinha costumes. Repentes. Comia galinha
viva.
Pois é, na minha
convalescência da malária, houve uma briga no meu acampamento. Piripiri que era
ajudante de cozinha, se atracou com Januário que era bateador. Januário, índio
roraimense, que comia galinha viva, reinou comer também o piauiense. Mordeu o
pobre todinho. Uma dentada poderosíssima apartou o polegar de Piripiri. O
pedaço com a unha, o Macuxi cuspiu fora, no chão de terra.
O desafortunado
todo inflamado, dizia que mordida de gente é remosa que só ela. O dedo fora
recomposto, numa operação de recuperação, antes de um absurdo que da anatomia.
Me contou
Piripiri, que na hora da briga, quando o pessoal que atiçava a arenga viu um pedaço
de dedo rolando no chão, entrou em campo para o deixa-disso. Foi socorrido e
levados ao ambulatório ele e o naco apartado do polegar de terra. No
acampamento fizeram a sutura e o encaminharam à cidade.
Quando a equipe
de emergência do pronto socorro de Porto Velho foi tratar do dedo, verificou
que o dedo tinha sido colado ao contrário, lá na mina. Com a unha pra baixo.
Houve de apartar e colar novamente, dessa vez com a orientação certa. Piripiri
falou isso e abriu o curativo pra eu ver como estava o dedo dele. Eu vi.
Estava deste
tamanho!
Nenhum comentário:
Postar um comentário