sábado, 16 de maio de 2015

cr^nica da semana - bigode de noivo

Bigode de noivo de quadrilha
Mês de maio é mês que me pego a bestar. Foi-não-foi me surpreendo olhando pro nada só imaginando...
Quando cheguei em Rondônia, para o meu primeiro emprego, reparei que todos os meus companheiros de ofício tinham barba. Perecia a marca registrada dos geólogos, técnicos de mineração, engenheiros de mina. A ostentação de pelo na cara era quase parte do uniforme, era quase uma regulamentação do CREA, quase uma qualidade curricular.
Todos daquele grupo tinham barba. Menos eu.
Isso me fazia pensar sobre esta distância que nos separava. Busquei justificativas. Julguei ser a nossa origem, a causa deste meu caráter imberbe. Meus colegas eram de outras regiões, a maioria do sul. Tinham outros costumes, outro ritmo de vida; suprimento de proteínas, glicídios e lipídios, obviamente, diferente do meu. Preocupações distintas. Podia ser também o calibre deles que era de través o meu. Especulava e me sentia um peixe fora d’água, com aquela cara lisa entre os brutos da floresta.
Aí, teve, teve... O tempo foi passando e eu enfurnado naquela mata, fui ficando mais taludinho. Tive acesso a uma dieta mais aquela de sustância e essência (cevada, muita cevada na parada), diversifiquei meus comeres e beberes e acabei me sentindo homenzinho com o aparecimento de um discreto bigode (parece que o raquitismo era mesmo a causa da minha lerdeza capilar). Um risco, um traçado tímido debaixo do nariz que já me valia. Já me avalizava entre os barbudos. Mas não estava com essa bola toda. Tão apagada era minha penugem e tão empolgado eu estava que os amigos, ao perceberem minha gabolice, logo me desencantaram, taxando meus pelinhos de ‘bigode de noivo de quadrilha’, comparando meu glorioso buço a reprodução que a gente faz no rosto da garotada nas festas de São João, de suíça, bigode, barbicha, tudo desenhado com um cotoquinho de carvão. Eu nem ligava pras pilhérias, tava era feliz com meu bigodinho franzino.
Anos depois, como sindicalista, já exibia um conjunto barba-bigode mais apurado. Encorpado, diria. Não tão denso, e também, nem tão espaçado. Estava ali, no meio termo com um clarinho infértil no ladinho do queixo. Não ficava devendo nada ao estereótipo meio Nandertal que marcou uma geração de dirigentes sindicais.
Muito pela preguiça de estar me giletando todo dia e também por ainda guardar aquela sensação de ser homenzinho de vera, no meio das feras, até hoje mantenho a barba, mesmo que o termo e a conjuntura digam não.
Foi-não-foi, em maio,  me surpreendo olhando pro nada só imaginando... E agora, depois de não sei quantos anos contados do meu primeiro emprego em Rondônia e de minhas inocentes inquietações, me pego reconhecendo minha barba branca, toda branca, grisalha, algodoada, nevada, alvinha, cinzinha clarinha, cor de leite, cor de nuvem longe, cor de todas as cores, fios grises, descoloridos, brancos...
E me dei conta que minha barba branca me alerta para as resoluções irrevogáveis (e irrecusáveis) do tempo.


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