sábado, 27 de agosto de 2016

crônica - medalhas

Medalha de prata
Tenho um metro e cinquenta e um de altura (era isso, pelo menos, antes da discreta, mas já percebida perda de sais). Mas contabilizo sempre um metro e cinquenta, porque este um centímetro não me ajuda em nada quando tô no aparreiro do ônibus lotado; e alcançar aquela barra no teto que nos ajuda no equilíbrio, é um recorde olímpico para mim, inatingível, na hora daquela curva radical. Invariavelmente, rebolo pra cima do povo.
Sou baixolinha. O que, tirando o atropelo de ser passageiro em curvas fechadas, nos ônibus de Belém, nada mais de desconcerto me trouxe na vida. Ser pequenininho não me atrapalhou em nada. Muito pelo contrário, seguindo o critério de ‘do menor para o maior’, sempre me garanti como o primeiro da fila, na hora da merenda, lá nos idos do primário.
Reconheço, porém, que assumo descabida presunção e sem querer, estimulo a descrença total na minha prosa, quando relato que ganhei medalha de prata jogando Voleibol, pelo time do meu curso nos disputadíssimos Jogos Internos da Escola Técnica Federal do Pará. Ninguém acredita. Desdenham, fazem gracinha. Caçoam de mim e alguns, sentem-se até ofendidos por uma potencial mentira cabeluda. Mas, ganhei de verdade. E não foi culpa minha.
O esporte fazia parte da nossa grade curricular. Era disciplina que ia do primeiro ao último semestre. Tinha avaliações complexas. Reprovava. No primeiro semestre, a gente escolhia qual esporte praticar. Escolhi vôlei, que fora a linha esticada de um lado a outro e um rebate de bola convulsivo entre as meninas da vila em que eu morava, a mim nada mais significava, naquele início dos anos 80. A disciplina, na Escola, tinha método, tinha fim. Tinha os Sérgios (Serjão e Serginho), professores que colecionavam histórias vitoriosas em competições importantes, e na nobre tarefa de ensinar os segredos do jogo de ‘bola ao ar’.
Daí a minha presunção. Os caras ensinavam mesmo. Começava pela teoria. No primeiro semestre, ninguém via a bola. Era pesquisa. História, fundamentos, regras. A gente escrevia pacas. Eram horas e horas na biblioteca da Escola de educação Física. No geral, aprendi muito. A quadra veio como complemento, os mestres, claro, entendiam as nossas limitações. Eu tinha a coisa do moleque, né. Na hora do jogo, dava sangue. Cortava em parábola, dava saque neném, devolvia de manchete. Não concorria e nem me comparava com os grandes craques da minha turma, Jorge Porpino, Jeovam Barroso, Marco Jurandim. Estes já brilhavam nas seleções da Escola e até do Estado. Eu dava sangue. E nos jogos internos, pra defender o curso de Mineração, juntávamos o talento, o sangue, a força. E foi assim que entrei naquele time vice-campeão.
Não joguei um único jogo, na conquista daquela medalha. Mas estava inscrito. Era da equipe. Era aceito pelos craques. Os professores abonavam minha convocação, o que significava que eu tinha aprendido alguma coisa (horas e horas na biblioteca).
Não é mentira não. Com um metro e cinquenta, além das conquistas diárias me equilibrando nos corredores dos ensandecidos ônibus de Belém, dividi o pódio de prata com gigantes. 



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