sexta-feira, 17 de julho de 2015

crônica da semana - Rio

A minha alma canta
Há alguns anos, estive na biqueira de visitar o Rio. Não visitei. Fiz uma conexão no Galeão, iria ficar um tempão esperando pra embarcar, aí, quis dar uma volta pela Cidade Maravilhosa. Guardei a bagagem, me aprontei todo. Quando saí do aeroporto muitas opções apareceram para o passeio. Até demais, chega me deu um sufocamento de tanta gente ofertando o serviço. E, bestão que sou, recuei. Fiquei com medo. Do engarrafamento, do mito Rio. Fiz uma conta, calculei horários, temi não voltar a tempo para meu novo embarque. Dei pra trás e fiquei só na vontade.
Este ano, bateu a coragem. Desde dezembro que programo. Catei informações sobre preços de passagem mais em conta, hospedagem; pesquisei lugar que se come barato. Marquei minhas férias junto com a dos filhos. Controlei as finanças com disciplina espartana (nos primeiros dias de férias em Belém, não pus os pés na rua, no firme propósito de economizar o máximo. Quase que proíbo os meninos de respirar, só para garantir um fôlego a mais para a viagem. Toda a família numa temporada no Rio exige uma austeridade monástica, porque sabemos que estando tudo pela hora da morte, o custo desse passeio sai bem salgadinho). Decisão, um planejamento chato, mas realista, uma força descomunal para vencer a poderosa gravidade de Belém e cá estou eu pra lá e pra cá, balançando numa rede, na varandinha do Alma de Santa Guest House, um simpático hostel localizado no machadiano bairro de Santa Teresa, ouvindo minha alma cantar e, humildemente, versionar Tom. “Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Essa crônica é só porque, Rio, eu gosto de você.”
É, verdadeiramente, uma cidade maravilhosa. Pra qualquer lugar que a gente mire, mostra-se bela e sedutora. O Rio encerra em si a multi interpretação tropicalista e revela o bonito no feio. Transubstancia o lirismo em recortes, em margens e morros. Há poesia até na impetuosidade tectônica que domina a paisagem e na casaria perigosamente suspensa. A plástica da cidade é coisa que entontece.
Além do desenho zelosamente criado por Deus, a geografia da lírica carioca tem muito mais a exibir. E vou logo avisando, que ao contrário das águas frias da baía de Guanabara, outras artes formam a minha praia porque, sabe-se, esta pessoa que vos escreve, ‘não vai à praia. Esta pessoa bebe’. Então...
Nos primeiros instantes na Guanabara, orientei minha bússola pela fragrância ritmada dos tons e semitons de Ipanema, onde partilhei cada cantinho como se houvesse ali, ainda o gingado da garota ou o copo sempre bem suprido de Vinícius, ou ainda o teclado inquieto da máquina de datilografia de Carlinhos Oliveira. Reconhecer o habitat de Rubem Braga, Tom Jobim, Laura Alvim, Millôr Fernandes, entre tantos expoentes da cultura nacional, já inebriaria minhas férias, não houvesse horas depois, conhecido a Lapa.
A Lapa me deixou aluado, (literalmente) sem equilíbrio ante um mundo convulsivo. A Lapa é uma Babel paradoxalmente harmonizada, um borbulhado de estilos e invenções de vida. Mais fervorosamente convicta, na Lapa, a minha alma boêmia canta (e confesso que por causa do dito inebriamento, tropeçando aqui e ali nas palavras, mas canta).   



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