Pra sempre
A amiga chega para uma visita no fim da
tarde, já com as anotações.
- Ai menina, eu acho que não tenho
coragem!
- Mas axi, deixa de ser mole, mulher.
Tu não queres manter o teu casamento na santa paz?
- Quero sim, mas...
- Olha mana, nessas horas não tem nem
mais nem menos. Tem é que meter a cara pra segurar o que é da gente. O negócio
é garantido e a mulher que deu a receita é das boas. Não falta gente fuçando
ali pras bandas do Agronômico atrás das garrafadas dela.
- Mas como é que eu vou fazer ele beber isso?
- O que
foi que nós combinamos? Isso é garrafada milagrosa pra’quela queimação que ele
tem no estômago. Diz que é remédio da pastoral que ele toma sem medo. Abre o
teu olho, pequena, que esse teu macho tá te passando pra trás.
- Eraste, isola! Deus me livre e
guarde. Não fala isso não, menina. Não pode ser verdade. Eu só acredito vendo.
Fizeram campana na sexta-feira (dia da
grana). Da esquina, observavam. De repente um carro para e buzina. Era ele. Apressado.
Desce do carro, entra na casa e dali a instantes, sai de braços com uma morena.
- Égua, siri! Não é mesmo o safado – admite,
a mulher, indignada.
- Não amofina. És uma mulher nova,
ainda. Inteligente. Não és de se jogar fora. É bem verdade que a pequena é
jovem e atraente e que isso deve estar mexendo com a cabeça dele, um homem
maduro. Tu sabes como é homem velho, é danado pra inventar moda com menininhas.
Mas vai passar. Ele não vai te deixar na mão. Tu queres que eu te ajude?
-Mas como já?
No dia marcado a amiga traz a lista com os ingredientes para a beberagem
receitada pela mandingueira. Um feixe de esquisitices amassadas, fatiadas,
picadas ou trituradas: alho da casca branca, folha da camapu, castanha de caju
assada, folha de bacaba, chicória, grelo da goiabeira, mel de cana, suco de
buriti, água benta, guaraná em bastão, mertiolate de jucá, e uma gota apurada
da regra do mês. Tudo misturado nas devidas proporções indicadas no prospecto,
batido no liquidificador e coado na peça íntima que ele mais gosta (aquela da
oncinha).
- Olha, tu não vais dar pra trás. Fala
que é garrafada da freira, boa pra azia.
Não sei dizer da morena. Só sei que no
último feriadão, despacharam as crianças para a casa dos avós e ganharam o rumo
de Mosqueiro para “uma Segunda lua de mel”, como fizeram questão de divulgar.
Partiram para bucólica no maior amor e um sorriso de felicidade de quem vai ser
feliz para sempre. Na bagagem, uma caixa de Sonrisal para aquela maldita, e
agora, depois do fracasso da garrafada, incurável, dor no estômago.
Nenhum comentário:
Postar um comentário