sábado, 2 de agosto de 2014

crônica da semana - fôlego

Sem fôlego em Mosqueiro parte II
Eu e meus amigos roqueiros fomos passar uns dias na praia. Eles arrumaram uma barraca e um quintal para nos acomodarmos. Nosso custo ia ser só na parte do de cumê. Eu era MPB e não era assim, assim, de grana, mas dava meus pulos. Trabalhava na feira com a mamãe e como ela via que eu já me ia rapazinho, fazia um esforço e me arrumava um numerário vez sim, vez não, para eu dar minhas voltinhas. Meus amigos do Rock folgavam mais nessa parte do recurso e isso nos adiantava. Quem tinha mais ajudava o outro. Éramos, digamos assim, veranistas comunistas.
Nossa batidinha era tomar um café reforçado no mercado, bem cedo, pegar o bondinho, desembarcar na praia mais distante que ele alcançasse e depois varar em recreio de praia em praia até a vila, sempre na bicora da maré alta.
Numa dessas estiradas, já de tardinha, a freqüência minguando, pouca gente na água, topamos com uma turma de garotas, na conta certa de uma pra cada, brincando de rebate com uma bolona colorida. Ficamos por ali, como quem não quer nada, avaliamos a situação, as possibilidades. Logo percebemos que as meninas foram simpáticas à nossa aproximação. Naquele tempo não se maldava tanto e também, a violência, as más intenções eram ‘menas’. E tirando um pelo outro, éramos apresentados, mas éramos de paz.
Entramos na brincadeira com a água pela cintura e nos entregamos às batidas na bola sem jeito e sem pretensão. Argumentos de aproximação apenas. O sol espalhava seus raios pálidos sobre as águas de Chapéu Virado. Os contatos aos poucos foram acontecendo. Os pares se formando, afastando-se com sutileza e dolo. A bola ficou abandonada ao ir e vir das pequenas ondas.
Outras ondas vibraram dentro de mim, diante daquela garota de uma alegria pródiga, de um sorriso pleno de onde grassavam excitantes insinuações, instintivos sinais, convites corteses. Nos olhávamos guiados pelo desejo juvenil. Havia um orgulho de nossas vergonhas submersas e ativas, urgia a teima sensual, o descompasso febril, a concupiscência perigosa. Parecia um sonho acompanhar o cabelo dela deslizar sobre o Copertone viscoso e desenhar provocantes sinuosidades no relevo de seu colo sedutor. Minhas mãos nervosas tentaram decifrar a mensagem traçada naquela pele macia. Havia boas loucuras em nossas menções. Uma nesga de luz amarelada chegava silente às vagas distantes e denunciava a praia deserta. Não havia medo, vênias, espreitas ou proibições e nos adiantamos no suave declive da praia, até que nossos corpos submergiram em carícias. Voltamos, tomamos ar, volvemos abaixo da lâmina d’água novamente. Nos beijamos. E nessa hora vi universos multicores. Percebi sabores e entorpecimentos. Senti um calafrio correr-me em maravilhas pelos quatro cantos da alma. Afoguei-me em delícias... E também me afoguei de verdade. Naquele rala-e-rola subaquático, quando quis tornar para a superfície dei que a gente tinha deslizado mais além no declive e não dei pé. Me embananei todinho. Não achei a pequena, bati pés, braços, orelhas e o que mais havia de bater e não vi  céu. Perdi o fôlego, bebi água pra caramba, peguei carona numa ondinha e fui parar num montinho de areia grossa, já na beira, tossindo pacas, assoando o nariz, tirando água do ouvido. Acabou a graça por aí.
Já era tarde mesmo, meus amigos roqueiros também já tinham cumprido a desobriga e decidimos seguir viagem. Trocamos juras com as pequenas, marcamos encontro na praça. Na vila, tomei um banho pai d´égua, me entalquei, pinguei umas gotas de Toque de Amor e fiquei horas ao lado do coreto esperando a pequena. Mas quando, já que ela apareceu.


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