sábado, 28 de outubro de 2023

crônica da semana - volta de dangue

 Uma volta de dangue

Domingo... Tem a ‘noite do fogos’. Tradição antiga que antecede o Recírio, os fogos de vista. Pelo que me torna e o que me deixa, agora sem os espocados barulhentos. Por conta dos bons modos, penso ser a pirotecnia limitada ao espetáculo visual. Sempre muito atraente e fascinante, ressalte-se. O colorido dos fogos de artifício em tudo me encanta. A arte de dar cor, de selecionar elementos que emitem luzes diferentes quando aquecidos, é valor incontestável da criação humana (entendo que devemos nos quedar à surpresa quando a nós, nos é dado saber que um dos componentes químicos da mistura pode ser um elemento chamando Estrôncio. Pois sim, heim, seu Estrôncio!). E quando a gente pensa que este tipo de manipulação dos agentes naturais data de sei lá quando, meu pai! E se desenvolveu sem as tecnologias refinadas, e até por acasos ou sustos, aí sim é que a atração é de entontecer. Há registros de os fogos tal como os conhecemos tenham sido aplicados pela primeira vez há dois mil anos. Já pensou! Eu fico bestinha da silva com esta rica engenharia humana Antiga, mesmo porque conheço as potencialidades do fogo, em meio a tanta modernidade, limitadas às bocas do fogão. E olhe lá, isso se tiver fósforo.

Os fogos marcam também o final da Quadra Nazarena, que é o momento intenso, aquele tempo aquecido de intenção, fé, paciência no trânsito e uns trocados para um passeio no Largo; quando desapregamos de nossa hermética rotina para celebrar mais um outubro da Virgem.

Eu por mim, com a bênção da Santinha, cumpri o rito. Dei termo à desobriga nos limites da minha entrega. E recebi de volta a tradição. Cumpriram-se as romarias, alinhou-se o sagrado e o profano, os estivadores fizeram a sua homenagem. Teve a chuva da Santa, a Chiquita agraciou os destaques com o desejado, porém somente por alguns conquistado, troféu; eu dei aquele  rolé pelo arraial e, como reza o costume, com toda a família.

Não sei se prestei o reparo suficiente, mas ao largo, por onde andei, não vi nem a maçã do amor, nem o algodão doce. Elementos que me enlouquecem de memórias afetivas e me atravessam de fora a fora de desejos. Se havia, passei batido. Falha técnica imperdoável dar uma volta no Largo e não voltar lambuzado dos doces do algodão e da maçã. Com o detalhe que, no caso da maçã, uma cerimônia de partilha genuinamente cristã marcava o momento. Nos anos contados anteriores, ocorria de ser apenas uma maçã para toda a família e cada um dava uma prova. Era a celebração do bem comum. A reiteração do compromisso comunitário, do usufruir coletivo.

É provável que tenha patetado nas guloseimas porque de uns anos pra cá tenho é me mundiado com tantos brinquedos novos e radicais espalhados pelo parque. Cada um mais desafiador, mais fibrilador que o outro. Sentar numa cadeirinha daquelas mais parece ser enfrentar um treinamento para astronauta sênior do que folgar-se em pueris rodopios. Nessa mesma e desproporcional conta, destaco a ausência do inofensivo e inegavelmente histórico carrossel, aquele com o sobe-desce dos cavalinhos. Não vi por lá. O que causa um vazio no passeio da família já que representava a oportunidade não só dos pequeninos experimentarem uma voltinha na velocidade da contemplação, como também dos pais, que logicamente faziam questão de fazer companhia aos filhos ali do ladinho, posando pras fotos, subindo e descendo.

Alguns brinquedos antigos se fazem notar de prima, como a roda gigante. Outros são apresentados com outros nomes, mas ainda os reconheço como tira-prosa e dangue. Ao longe, numa espiadela localizei a barraca da pescaria e das argolas. Não me atraem. Não por nada. É que na vida, não ganhei uma lembrancinha sequer nesses jogos. Acho até que tenho um trauma, sei lá, uma cisma. Quem sabe par’o ano tento a sorte.

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