sábado, 4 de setembro de 2021

crônica da semana - as nuvens da pedreira

 As nuvens da Pedreira

Não, olha, que mudou, mudou. Antes era tudo certinho. Chovia de dezembro a junho; em julho ainda aconteciam as pancadas esparsas no decorrer do período; agosto e setembro eram de dias tórridos; outubro chegava com a chuvinha da santa; novembro voltava a esturricar o cocuruto e dezembro começava tudo de novo. Hoje ninguém entende mais nada. O tempo tá um destrambelho só.

Semana passada dei um pulo na rua, de tarde, para atender a uma precisão. Meio-dia e pouco e nem estava tanto calor. Comentei com o motorista do aplicativo a presença de nuvens se formando além e aquém e falei da minha animação em voltar caminhando, caso o céu continuasse daquele jeito, nuveado.

É costume antigo bater perna pelos escaninhos da Pedreira e que foi potencializado nessa pandemia. É regra que, se eu puder realizar qualquer caminho andando, e se o estirão não for muito ao largo do condado da Pedreira, o faço. Já ocorreu até d’eu fazer um bate-volta recorde de distância lá na José Malcher, no pé, e ainda chegar em casa com um super bem acolhido saquinho de pão. Tem um valor revigorante, de cuidado e atenção com a saúde, a caminhada. A gente estica o esqueleto, apura o equilíbrio, ativa os sensores, a intuição, respira com mais qualidade.  E ganha um quê de proteção quando evita contatos sociais, hoje minados de desconfiança, por causa da pandemia (e dos melindres ideológicos-políticos agudizados).

Eis que na semana próxima passada voltei andando mesmo. Após fazer a minha missão, analisei a movimentação das nuvens, a textura, a variação nos tons de cinza e considerei que o sol ia esfriar. Tirei em uma hora e uns caroços até em casa. E pensemos cá, em um tempo limite, no trisca. Foi atravessar a porta com o indefectível embrulhinho de pão e o pampeiro arriou. Causou espanto aquela chuvarada no final da tarde. Pleno agosto.

O mês é cantado e decantado como um dos mais quentes do ano. Nessa época é comum a gente ouvir reclamações dos afogueados. É gente com cara de pupunha nos ônibus, outros gravando vídeos fritando ovos no asfalto. Dá-se como natural, então, o susto com o pampeiro. E eu até tentei fazer uma contagem. Se não perdi a medição, foram pelo menos cinco temporais em agosto, e em alguns casos, com termos e jeitos de cair raios e alagar a cidade.

Fiquei curioso com estas reincidências. Aí fui às pesquisas. E é bom, dá um alento a gente perceber a razão de ser da estatística e dos cronistas (este um aqui, no caso).

Consultei uns números. Pus fé no meu taco que aponta para um comportamento diferente do clima, nos últimos tempos em Belém. É um mecanismo que dá sinais das mudanças climáticas globais, e que se refletem aqui no nosso quintal, na varanda, no alpendre, no céu da Pedreira. Não pecamos quando nos quedamos ao estranhamento. Realmente, o mês de agosto já foi bem diferente. Foi mês de fritar ovo no asfalto mesmo. No entanto, na vera, as experiências recentes mostram uma alteração na incidência de chuva.

E a minha crônica do ano passado confirma esta alteração. Não é um fato que se percebe hoje. Um ano atrás eu chamava atenção, inclusive para essas nuvens se movimentando no meio do dia. Céu plúmbeo, algodoado e denso, com se estivéssemos em fevereiro. É o destrambelho. Uma desordem molhada pleno agosto. Diferente, muito diferente de antigamente quando tudo era muito certinho. Chovia de dezembro a junho e se falava pancadas de chuvas esparsas no decorrer do período... E que passava logo. Vai passar. O destrambelho vai passar.

 

 

 

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