Caixinha de surpresa
Estava
eu bem fuçando meus teretetês literários semanais, no firme propósito de
coletar um feixe de crônicas para o próximo livro, quando dei com uma candidatíssima
a entrar no bolo da nova edição. O ícone do word anunciava um texto abonado pela simpatia do título: “caixinha de
surpresa”. Dei um rolé pelos outros ícones, certifiquei prosas conhecidas,
igualmente selecionáveis, volvi à ‘caixinha’. Surpresa monstra foi a minha
quando dei que só existia o título. Nada mais escrito havia na vastidão do
word. A mais pura página em branco me recebia.
Fururuquei
o cocuruto catando o dia em que ensaiei, fiz menção, dei título e não
desenrolei a parada da caixinha de surpresa. Onde é que eu estava com a cabeça,
meu pai, que não atravessei aquele Rubicão? Que apagão me deu, que não escrevi
nadica de nada?
Mas
umbora elucubrar. Hummm! O que poderia inspirar uma crônica com tão sugestivo
texto. A vida, é uma caixinha de surpresa, diria o narrador da dramática
história de Joseph Climber.
Por
mim, pelo que me torna e pelo que me deixa, não carrego na bagagem fato ou passagem
que eu possa definir como produto inusitado de uma caixinha. Do passado não vem
uma lembrancinha sequer. Ah, vem sim...
Quando
estava terminando a Escola Técnica, bem no finzinho do semestre e do curso,
inesperadamente, para uma época em que as interações entre empresa e escola não
eram tão fartas, fui selecionado para uma visita de cinco dias à Mineração Rio
do Norte, no trombetas, (surpresa monstra e absoluta, porque, olha, não era top
10 da turma não). Bacana. Primeira viagem de avião. Pela TABA. Com direito a
suco de maracujá com aquele cuizinho preto residindo no fundo do copo; e podia
tomar quanto quisesse, bastava levantar-se e chegar à garrafa térmica localizada
no final do corredor da aeronave.
A
visita foi um sucesso. Conhecemos técnicas e processo. Também, claro, exercitamos
nossa índole de estudante varando a última noite num bar chamado ‘Bauxitão’,
abarcando baldes e baldes de gelada.
Mas
a vida, a vida é uma caixinha de surpresa. Sexta-feira, na hora de voltarmos
para Belém, a bronca. Não tinha avião. A TABA, inacreditavelmente, falhou no
atendimento. No dia seguinte, sábado, seria a nossa cerimônia de formatura (18
de dezembro de 1982). Aí foi um fuzuê. Choramos, tiramos a calça e pisamos em
cima, fizemos beicinhos e pirraças. Fretaram um avião, mas só para o dia
seguinte. Pra encurtar a história, chegamos em Belém às duas da tarde e a
colação começaria às seis. Correria com roupa, convites, formalidades, alguém
para dar o nó na gravata, o padrinho...
Meu
tio nos deu apoio com o fusquinha da família. Ocorre que, na mesma pisada que
apanhou um panelão de maniçoba destinado à nossa comemoração doméstica, emendou
e nos apanhou eu, mamãe e meu padrinho para a cerimônia. Não percebemos que a
maniçoba tinha entornado um tanto, na beirada do banco traseiro. Mamãe toda
arrumada, no seu longo acetinado, sentou em cima.
A
vida é uma caixinha.... Ao desembarcar no ginásio, descobri naquele dia, para
que serve o lenço que vem na lapela do paletó.
Muito bom!
ResponderExcluirA caixinha vazia (em branco) se tornou uma bela surpresa aos leitores.