Belém 23 graus
Mas
foi só as primeiras chuvas de dezembro arriarem na cidade, que as mídias se
enxameram de testemunhos dramáticos sobre o frio intenso que invadiu, sem tomar
conhecimento, as mais fininhas das fretas dos mais protegidos puxadinhos de Belém.
Penso
que há uma lógica nisso tudo. Uma brecha sensitiva por onde o frio passa
verossímil que é uma maravilha.
Vamos
e venhamos que saímos de um novembro esturricante, com temperaturas beirando os
33 graus e sensação térmica de sei lá...400 graus, por aí. Então o barato deste
caro destrambelho climático é exatamente a sensação. É aquele um tanto a mais
catalisado pelo nosso caótico desenho urbano. Dependendo do calibre da pessoa,
em novembro, o calor foi de calcinar mesmo, de quebrar a molécula de água da
mais arquitetada combinação química orgânica que a gente possa ter dentro da
gente. Tem gente que desfalece. Delira, baba, dá piripaques e grosopes
assustadores.
Ocorre
que no outro extremo, uma temperatura mínima de 23 graus, esta que nos visita
desde o início de dezembro, é potencializada e ‘sentida’ como se fosse siberianos 22 graus, por exemplo. Dá-se naturalmente um choque térmico
coletivo. Quem está acostumado ao banho de mar sabe o que significa esta
sensação. Está debaixo daquele sol, pegando aquele bronze, fixando aquele
brondor na mecha do cabelo, mas quando cisma de dar um mergulho, aquele
resistente contado do dedo mindinho do pé com a pequena onda que se acaba na
areia, ao corajoso banhista, lhe parece que o mundo o acutila a alma. No primeiro
mergulho, então, é o céu que desaba sobre o empedernido veranista. A água é
fria que dói.
Daí,
da mesma forma que o corpo tem que se acostumar com a frieza da água da praia,
numa tarde de sol de julho; o inverno amazônico reivindica, ao organismo, a
mesma adaptação. As fartas reclamações que assistimos nas mídias, nos fazem crer
que até o corpo tornar para as confortabilidades térmicas, exigidas a partir de
dezembro, vai demorar um pouquinho.
O
que vai nos valer é aproximar a dita sensação térmica, que transforma dóceis 23
graus em terríveis percepções de frio intenso, possíveis de serem medidas
somente na escala Fahreneit; o que vai nos acudir é trazer a sensação para
perto das temperaturas realistas, amigas e eficazes, que não fazem mal a
ninguém.
Temperaturas
inofensivas, realistas, mas que nos permitem sim, usar aquela camisa manga
comprida, conservada à naftalina durante todo o ano, no fundo da gaveta. Nos
abonam no uso daquele moletom com capuz e tudo. E nos permitem usar o
ventilador à noite, apontando para cima, girando sem buscar a gente, na missão
única de espantar os carapanãs.
Temos
que desmistificar o frio total que nos assombra, mas, ao mesmo tempo, é
coerente aceitar que 23 graus, para nós belemenses que vivemos na “cidade
maravilha/purgatório da beleza e do caos” é sim, friozinho muito dos seus
aquele, pai d’eguinha que só ele, gostosinho no prumo, no jeito para pôr uma
meia, esticar o sono, puxar o pano de imaginar, nos cobrir dos pés a cabeça
e...sonhar.
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