sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

crônica da semana - pedreira jazz

Pedreira Jazz Pedra Noventa
Na quarta-feira passada, ouvimos pela primeira vez a nossa música no rádio. Foi no programa A Feira do Som, do Edgar Augusto. Depois daquele dia, a música entrou na programação da rádio Cultura, tem tocado bastante e o pessoal tem é gostado.
Pedreira Jazz Pedra Noventa é uma parceria minha com meu compadre Edir Gaya. Foi apresentada pelo Edgar com muito respeito, citando os autores, os músicos, o arranjador, o objetivo da canção. Em outras palavras, Edgar cortou e arou. Deu aquela força. Dar um empurrãozinho, divulgar, contribuir com a prata da casa é, ressalte-se com toda a justiça, o eixo condutor do programa A Feira do Som, nos anos contados tantos que ele tem no ar.
Ficamos meio ansiosos para o lançamento, eu e meu compadre. Assim, meio parecido meninos bestas. Não diria que foi um sonho realizado. Ter uma música gravada não é novidade para nós (temos pelo menos mais duas). Mas essa foi especial. Investimos mais que das outras vezes nela. Chamamos a genialidade de Renato Torres para vestir de cores nosso som. A cada dia que a gente ouvia um avanço no arranjo, a animação crescia. Sabíamos exatamente o que queríamos. Queríamos uma música para tocar no rádio. E para isso, fomos rigorosos na nossa construção. Nos aviamos nos detalhes.
Tudo pronto para o lançamento, ao grande gênio, a honra de interpretá-la. Meu compadre, já falei isso por aqui, é um Midas. Tudo que ele toca vira ouro. O poder que ele tem de criar belas melodias é inesgotável. Um modelador de tons e ritmos, notável. Mas nunca tinha se aventurado a cantar. Essa talvez fosse a nossa inquietação inconfessa. Embora para mim, que sou leigo na parada, nas primeiras audições, estivesse tudo bem, meu compadre foi radical na auto-crítica. Gravou outra vez, Renato apelou para uns ajustes tecnológicos e aí sim, o vozeirão do homi ficou no jeito.
Dá-se então que a música, da forma que ela está, com os elogios que ela vem recebendo, que eu interpreto como um confortante e circunstante sucesso, a tenho como um presente. Um regalo merecido ao meu melhor amigo, ao meu amigo desde que eu tinha 16 anos, ao meu grande ídolo Edir Gaya. É tudo dele e pra ele. Inclusive a responsabilidade de responder pela nossa canção.
E por causa disso, dessa responsa, a gente já arrebentando nas paradas de sucesso, meu compadre me liga altas horas da noite preocupado porque tinha que dominar o enredo da canção, “onde era mesmo o Pedra Noventa?”. Embora a gente tenha conversado sobre a letra, o traçado sentimental do texto é meu, né. Vamos lá então, conhecer um pouquinho do igarapé do Zé, do Jazz e do pedra Noventa.
O poema e o Jazz
No início dos anos setenta, o bar Pedra Noventa (que tinha esse nome por causa da última pedra do bingo, a maior) era ponto de encontro de várias tribos. Era um bar deslocado do eixo movimentado da Pedro Miranda, mas tinha seu charme, sua clientela cativa. Era também, um dos poucos lugares na Pedreira que tinha um telefone público. No meu imaginário, o bar era vanguardista, moderno. As coisas aconteciam por lá. Não sei bem por que penso assim, mas tenho pistas. Meu tio fazia parte de umas das tribos do bar. Morávamos na Marquês, e parte dos jovens da rua se reunia por lá. Depois dos encontros, ouvia meu tio falar de músicas internacionais diferentes, comentava as artes de um tal de Santana, elogiava grupos como Creedence, Lafayete... Essa era a conversa que eu ouvia. Então para mim, no Pedra Noventa, ouviam-se sons diferentes. Daí, desses sons distintos, para o Jazz, foi um pulo. No meu poema, o balcão Pedra Noventa canaliza os improvisos, a alegria e a sofisticação do Jazz retratado em cada ritmo novo, ousado que tocava ali.
O igarapé do Zé
O vento que traz o Jazz já é uma inclinação minha para o bucolismo que naquela época ainda vingava ali por aquela esquina. Até hoje, este ventinho de fim de tarde ainda é sentido em toda essa região da baixa da Pedreira. Na falta de uma explicação lógica, atribuí a formação deste arzinho da tarde, à densidade das matas da aeronáutica, que margeiam a Dr. Freitas e delimitam a cidade na primeira légua. Ali  nasce o igarapé do Zé.
O igarapé do Zé é uma licença poética. Um devaneio, um desejo contido. Mamãe jamais deixou que eu fosse pra lá. Mas a molecada ia. Às vezes chegava bem perto, sentia a mudança de temperatura ali à margem da Dr. Freitas. Mas não entrava na mata não. Era menino obediente. Sabia que pra’li, havia um mundo encantado donde a Matinta reinava. E que lá coisas maravilhosas se realizavam. Mas não podia ir lá. Mamãe ralhava. O igarapé do Zé é uma vontade minha não concretizada. Uma aventura que vive só no meu cocuruto. E a maravilha que se impõe de lá aos quatro cantos, reinterpreto hoje como sendo este vento gracioso que nos afaga todas as tardes.
Então é isso. Se um dia a gente ganhar o Grammy com esta música, já está tudo na ponta da língua.
Ah, e tem a música de meu compadre (Edir Gaya é meu compadre. Sou padrinho do filho dele, Gabriel. Fiz curso e tudo, com a pastora Marga Rothe; e ele é padrinho de minha filha Amaranta, ou seja, estamos emaranhados nas teias do compadrio). A música é deslumbrante. Certa vez, estava ouvindo a música, fiquei tão encucado com aqueles andamentos pra lá de assimétricos que enviei para um amigo meu entendido de tudo, para que me explicasse aquela singularidade, aquela estilística melódica. Né querer falar. É uma melodia jazzística da gema, coisa do Mississipi.

Nossa música tá rolando. É single do disco que meu compadre quer lançar. E vai trilhando caminhos para o Grammy. Tem um quê que atrai a gente. Não sei definir o que ela é. Para mim é um Jazz, mas minha amiga Mylena Santana, que bate um pandeiro bem que só, ouviu e definiu da forma que mais aprecio. Diz Mylena que é uma letra de carimbó encaixada numa mini-sinfonia. Concordo.

3 comentários:

  1. CAMARADA, PASSEI HOJE O DIA TODO OUVINDO SUAS MÚSÍCAS NO VINIL. "TE PARAFRASEANDO", VC É LITERALMENTE DE UMA REALISMO FANTÁSTICO!!!!

    Robério Araúlo - subvercine@yahoo.com.br face https://www.facebook.com/profile.php?id=100005350896650

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  2. CAMARADA, PASSEI HOJE O DIA TODO OUVINDO SUAS MÚSÍCAS NO VINIL. "TE PARAFRASEANDO", VC É LITERALMENTE DE UMA REALISMO FANTÁSTICO!!!!

    Robério Araúlo - subvercine@yahoo.com.br face https://www.facebook.com/profile.php?id=100005350896650

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  3. Mano Sodré,
    Já tinha lido à época, mas calhei de reler essa tua crônica reveladora, afetiva, sincera, mnemônica, passados cabalísticos sete anos de quando lançamos o single de “Pedreira Jazz Pedra 90” - também o tempo em que (per)dura esse meu projeto musical e passional, o Guamundo Home Studio. Pois é: o Edir é padrinho do estúdio onde gravamos seu incrível álbum “Liamba, Jazz e Samba”, que já conheces bem, e do qual todos nós aguardamos o lançamento... será agora? Espero que sim! Mas enquanto isso não acontece, é um prazer revisitar tuas linhas e tuas memórias. É uma honra pra mim que o grande Gaya tenha confiado a mim suas maravilhosas e irrepetíveis canções! Abraços, mano! E bora fazer uma parceria qualquer hora dessas!

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