sábado, 12 de outubro de 2013

crônica da semana - cinema

A Sétima Arte

Eu nuca fui a um cinema de shopping. Sou avesso. Piração minha, coisa do meu eu arredio. Talvez um descontentamento. 
O certo é que me afino mesmo é com os cinemas de rua. Sou do tempo do glamour do Olympia, da realeza do Palácio, da cumplicidade quase gêmea do Nazaré e do Iracema, da camuflagem nada camuflada do Ópera, do imbricamento harmônico dos cinemas 1, 2 ,3  e do bucolismo pedreirense do Paraíso. 
(Cheguei até a varrer o Cine Paraíso que tinha um salãozão que se media aos decâmetros só pra poder entrar de graça nas sessões. Eu bufava varrendo, mas à noite, ah, à noite, ficava ali de palmo em cima com a Ursula Andress). 
Houve um tempo em que os grandes cinemas de Belém fizeram uma promoção pai d’égua. Quem chegasse antes das três da tarde, pagava só a metade do valor do ingresso. Firme, aquela prenda. Nós estudantes, pagávamos a metade da meia. Eu era figurinha batida. Ia pra aula, quando dava duas e pouquinha, escolhia no jornal um filme bom e me mandava. Chegava no meio da sessão, acostumava a vista, arrumava um lugar, pegava o fio da meada da história e me ajeitava na poltrona. Quando acabava, esperava a outra sessão começar, assistia ao pedacinho que havia perdido e voltava pra Escola com mais de mil para assistir à última aula. 
À época, aprendi a admirar os detalhes da Sétima Arte. Convivi com especialistas, conhecedores e fui tomando gosto. Percebi que havia uma tribo integrada, íntima dos atores, dos diretores. Sabia o nome deles, a filmografia...Certa vez no escurinho de Superman alguém atrás de mim fez um comentário sobre a atuação do Gene Hackman. Era a minha colega da Escola Técnica Dedé já exercitando o talento que lhe denotaria anos mais tarde como jornalista. Prestei reparo nos discernimentos da, hoje, crítica de cinema Dedé Mesquita e, aqui acolá me arvoro também, a expressar o meu apego aos meandros das produções enfatizando conhecimento ou paixão. Quando soube, por exemplo, deste filme que o Wagner Moura fez em Hollywood desfiei o meu aprendizado: ah, é aquele filme com o Matt Damon, o menino maluquinho de “O Gênio Indomável”... A paixão, por sua vez, me trai quando percebo que filmes como Blade Runner, até hoje me entontecem. Minha mulher Edna se passa pra estas minhas presepadas, embora me segrede achar que isso são surtos de presunção do meu eu metidão. É verdade, dessegredo eu. 
Com essas penetrações profundas, no bom sentido, também me aproximei dos clássicos apimentados. Eu e minha turma da Escola Técnica fomos em peso, a uma sessão vespertina no Nazaré assistir ao primeiro filme de Saliência exibido em tela grande, no Brasil. “Coisas Eróticas” destrambelhou meus conceitos, desarranjou meus apontamentos estéticos. Me impôs calafrios indisfarçáveis naquela tarde. E a molecada, metade homem, metade mulher (as mulheres da minha turma eram muitas), na maior avacalhação.  Ainda mais diante daquele final perturbador (quem lembra?) que colocava as certezas machistas à prova. O filme é hoje cult e, pensando bem, um tanto inocentezinho ante a Cicciolinas italianas e brasileirinhas Cadillacs que se seguiram sussurrantes (yes, yes...) aquecendo o mercado cinematográfico do gênero. 
Quando estive em Madri, que é uma cidade européia moderna, no ano passado, constatei, no centro da cidade, a existência de pelo menos, três grandes cinemas de rua. Todos em fervorosas atividades. No dia que passei por lá, acontecia o lançamento de um filme com pompas e circunstâncias, inclusive com a presença de estrelas como o Mel Gibson. 
Por aqui, nossos cinemas saíram das ruas. Uma pena. Vou demorar a tornar desta dor. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário