sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

crônica da semana - Quarta feira de chuvas


Quarta-feira de chuvas

Hoje, vou arriscar um teretetê sobre o alagamento da cidade, na Quarta-feira de Cinzas, porque, olha, há anos não via o canal da Pirajá pirar e abandonar seu tranquilo leito. Fazia muito tempo que não arregaçava a perna da calça pra varar esta baixa pedreirense, mas quarta-feira, não teve bom não, reinou o bloco da chamichuga na passarela da Aldeia Cabana. 
A aporrinhação do alagado acabou por me restaurar curiosidades antigas. Vivo me batendo com essas peripécias da natureza, aliás, muitos dos meus amigos me inserem numa escala que vai de assim, assim, estranho a completamente tantam; uns e outros me classificam como um neguinho metido a besta por querer saber coisas que não me pertencem e por querer dar causa aos nossos sofrimentos urbanos; e, por fim, outros tantos, me ignoram completamente, quando me vêem fuçando nisto, naquilo ou naquil’outro. É verdade, fico na cuíra mesmo, ainda mais agora, neste período do ano. É tempo de luzinha acesa e atiço esta minha mania de querer entender os entrementes que envolvem sol, lua, chuva, marés, equinócio... Dia desses mesmo publiquei uma crônica explicitando minha preocupação com esta variação (mínima, diga-se) climática que temos aqui na Amazônia. Mas não sou metidão não, nem aluado. Penso que existem formas de interagirmos com a natureza e os dois sairmos ganhando. Para isso, a gente lança mão do que nos é possível, ou vocês acham que na Quarta, eu não fiz todas aquelas mandingas (bonequinhos de papel pregadinhos uns aos outros, um sol desenhado no alpendre, copo com água emborcado sobre pano de prato virgem) aqui em casa para a chuva parar. Fiz a minha reza, também, ora se não fiz. Precisava sair para o mundo, para a lida como todo cidadão. No entanto, além das místicas, urge recorrer às ciências. A Engenharia, a Astronomia, a Meteorologia devem ser consultadas. Perceber como estas artes se relacionam e procurar subsídios nelas para subjugar às origens este mar que se formou nas margens do igarapé do Galo e se elevou até a Praça Eneida de Moraes é uma missão que o povo do meu bairro tem que requerer e perseguir. 
Ano passado mesmo, ensejado na minha insatisfação, escrevi sobre o transbordamento do Galo (que ocorreu na terça de carnaval). E não é preciso nem ter ginásio para ligar uma coisa com a outra, este com o outro ano, para contar com as possibilidades, para fazer um pequeno exercício de recorrência, considerando a interferência das marés de Equinócio, a ocorrência da lua Nova, as deficiências de operação das comportas. Admitindo, até, o calendário cristão que é o que define a data do carnaval. Basta dar um trisca na história meteorológica de Belém, para fazer uma previsão realista de riscos para a cidade. Reconhecendo e conhecendo estas particularidades dos primeiros meses do ano, penso que um planejamento estratégico reduziria e muito os desconfortos pelos quais passamos. Pena que uma prática de prevenção, ainda é uma ferramenta de propaganda. Divulgam o explícito, o óbvio, mas o que realmente ajuda, fica nas gavetas. Na crônica do ano passado, como curioso, alertei que havia muito mato, até árvores grandes no leito do Galo e que isso claramente interferia na vazão do igarapé. E se a gente passar lá hoje, ó, tá do mesmo jeitinho. O Galo encoberto por uma robusta floresta. 
Falo da Pedreira porque é o meu bairro e é uma das mais bem sucedidas experiências nas obras de macro-drenagem. Mas esta Quarta de Cinzas e de chuvas foi de muito aperreio para boa parte de Belém. Tanta curiosidade, tantas ciências, mandingas e rezas, gente habilitada...e tudo dando água. 

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