sábado, 27 de março de 2021

crônica da semana- pequenino

 Pequenino

Minha professora do primário me chamava de Pequenino. Mais além, o canto foi no mesmo tom. Tenho amigos do ginásio, ou segundo grau, o dito ensino médio de agora que, apesar do meu nome estar grafado aqui na coluna, até os dias de hoje, só me conhecem por ‘baixinho’. Imagino naquele tempo do primário, qual o tamanho do embaralho. Se a turma da minha primeira professora era só de crianças, todas pequeninas, eu ganhava destaque como o mais pequeno dos pequenos. No ginásio, então, quando as mudanças se dão mais à conta, avalie só...

É aquela questão de escala. Que é uma medida física. Mas é um pé, também, para compor uma medida social. Minhas interações não raras, me localizam em uma categoria de ser humano menor. E haja peleja pra superar.

Talvez, não sei, não desci a essa reflexão, mas é possível que uma elevação no espírito, aquele crescimento de alma que a gente sente ao dar asas à inspiração expresse alguma resistência. Um revide. Escrevendo me sinto enorme.

Calha então que este pequenino enorme se dá conta que hoje completa 15 anos assinando esta coluna. É março. Tempo que nem maldo, mas é mês de grandes passagens. Está lá atrás, como o mês que assinei pela primeira vez a carteira de trabalho como profissional de Mineração. Conta como a primeira crônica publicada neste espaço, e avisa que, em um dia oportuno, no dia de São José operário, saí de um encalacre feroz e consegui emprego em Macapá. Mês das grandes águas e boas lembranças. Tenho que dar mais valor a ele. Este ano, apesar da calamidade que vivemos, março me trouxe uma vitória extraordinária. Coisa de amainar o sofrimento. Um dia se o tempo abonar, conto o que deveras me apraz, não obstante, a maldade que temos de enfrentar todo dia, vinda do planalto central do Brasil.

Tento crescer, no tamanho certo que caiba no coração das pessoas. Porque entendo que meu fazer literário é arte de contador de casos, relator de algum sentimento, prezador de dizeres do vulgo e, em indesejáveis ocasiões, lamentador.

Tenho medo de escrever crônicas afogadas, espremidas no banzo, na tristeza. Uma lição trago de uma crônica que publiquei tempos atrás, dominada pelo desânimo. Dias depois recebi um email e a pessoa demonstrava sinais de desespero, baixa estima, dizia estar num buraco sem fim e por isso se identificara com o que eu havia escrito. Pronto. Fiquei com uma dor de consciência abrasadora. Uma culpa sem fim. Não sei o destino daquela leitora. Não me voltou mais mensagem. Sucede que tenho me esquivado das razões cruas e nuas do mundo, no que escrevo, depois dessa experiência.

Por isso, tenho salteado a presença aqui na coluna nos últimos sábados. Recorri algumas vezes ao meu filho para compor comigo textos indolores, porque o que sinto agora é a angústia, a melancolia. Se deixar sair o que sufoco dentro de mim, arrisca chegar email de novo.

Em 15 anos aqui na coluna nunca me ocorreu banzo de tal potencial que me tirasse da tarefa de catar milho no teclado do computador. E olha que já passei por altos perrengues. Escrever, dito já foi, me fortalece. Ocorre que, por hoje, não sou mais o mesmo... tenho amofinado. Às vezes acho que vou tremer.

Rogo perdão pelas minhas ausências. Embora ache que seja uma boa solução, a reserva cautelar. Antes o silêncio inerte, que o ruído que revele a morbidez dos tempos.

Tô aqui hoje, nesta data querida de persistência. Um pequenino enorme, na luta pela sobrevivência e pedindo colo... um bolo com refri...

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