sábado, 19 de setembro de 2020

crônica da semana - meu erro

 Meu erro

As crianças eram implacáveis. Não me permitiam um isso de sucesso com minhas mágicas. A cada tentativa, uma queda. Era desmascarado, pego na mentira. Um, logo dizia ‘tá ali, tá ali a banda do ovinho’. Noutra encenação, Argelzinho que não tinha dó nem piedade em impor-me a desmoralização, denunciava: ‘a carta tem dois lados, frente e costa’. Puxava o baralho da minha mão, todo ele, incrivelmente viciado e exibia as cartas para a platéia exaltada.

Namorava aquele joguinho de mágica que vendia na Lobrás, desde que tempo. Depois de muitos casos passados, a petizada já graúda, consegui comprar a caixa completa. Diversas peças para uma apresentação amadora. Tinha o baralho, o ovinho, o lenço, as moedas, o funil, a garrafinha de água, a cartola e até a varinha tinha. Cheguei em casa todo faceiro pronto para dar o espetáculo. Articulei com a família, queria audiência.

Dei um tibêi no fracasso. Não que fosse um jogo ineficaz. Tinha manual, dicas, procedimentos. Faltava-me a destreza. Errava em movimentos simples. Em detalhes de ligeireza e atenção. Denunciei-me. Logo na primeira sessão, entreguei os segredos.

Aí, a garotada caiu de pau. A molecada da vizinhança toda veio para minha apresentação de mágica, só para me anarquizar. Para ajudar na chuva de vaia. Não amofinei. Aceitei o revés. Não levava jeito mesmo, nas sutilezas. nem nas ilusões.

Não me deixei, porém degradar-me em desinteresses pelos truques.

Uma ou outra arteirice com o ímã é arte que continua até hoje me mundiando.

O ímã é um tipo de matéria especial. Tem sempre um lado que atrai e outro que repele. O espetacular nisso é que, se a gente tem um ímã de dois centímetros de comprimento e parte a peça ao meio, não vamos ficar com uma parte que só atrai e outra que só repele. Os pólos se repetem nas duas partes. E assim por diante. Se dividirmos de novo, vai acontecer o mesmo. Se partirmos infinitamente, se esmigalharmos o ímã em partes pequeníssimas, ainda assim ele vai ficar atraindo numa ponta e repelindo noutra. Devo dizer que este comportamento magnético do ímã é sentido por materiais que têm propriedades afins com ele. Superfícies metálicas, pelo comum, das quais, a porta da geladeira me vem como um exemplo que a nós, nos é mais íntimo e nítido.

Falo agora sobre, porque depois daquele malogrado intento com o jogo de mágica, me abalei de novo aos truques recentemente, agora, manipulando as esferas de neodímio.

As esferas são sólidos que não têm lado. Não há em cima, embaixo, do lado, nas esferas. A impressão é que a esfera tem sempre o mesmo jeito e modo não importa a direção que nos estimule o sentido. Aí é que reside o truque da esfera de neodímio. É um ímã que a gente pensa que só tem um pólo. Mas não. Tem os dois. E dá pra gente fazer cada arrumação, cada ilusão e presepada usando a forma e o magnetismo em favor de nossa mágica doméstica. Lavei a alma! Sucesso total, minhas apresentações com as esferas.

Essas histórias de intentos insolventes tiveram como consolo os felizes resultados com os ímãs de neodímio. E é essa oportunidade, almejada, requerida, conquistada, magnetizada para que eu possa corrigir meu erro.

Tive que doirar o grão de arroz até agora, para reparar a informação que dei na semana passada aqui. A Aurora Boreal é resultado da interação do vento solar com o campo magnético da Terra e não com o campo gravitacional, com afirmei equivocadamente. Por este erro, humildemente, peço vênia.

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