sábado, 12 de setembro de 2020

crônica da semana - Aurora

 Aurora

Vou dar a letra no justo e certo: no início desta pandemia, entreguei os pontos, me encolhi no canto, ‘aconsoado’, e julguei ser aquele início, o meu fim.

Passados seis meses, sustos, lágrimas muitas, medos, pirações, esperanças sufocadas, decepções com a humanidade e incertezas de montão, cá estou, como diria minha mãe, suspirando. No ritmo indicado à manutenção da vida, com a saturação de oxigênio, ó, lá em cima.

Esse sentimento de expiração inevitável teve suas justificativas, afinal, no pico da pandemia no Brasil, quando me vi diante da ameaça de um vírus letal grassando e se valendo de nossas obsequiosas licenças; no momento em que me peguei abismado com a imagem de um presidente usando máscara na orelha como se estimulando a população a praticar o auto-extermínio; na hora que me bati nas nuances do home office e fui contemplado compulsoriamente com as gasguitagens  do Arrocha e abençoado pelos louvores gritados a plenos pulmões; quando quedado e humilhado pelo vírus, pela falta de governo e pela poluição sonora, pensei cá comigo: não tem escapatória. O fim é chegado. Dei adeus a este mundo cruel. Emagreci. Perdi a barriga de jogador de porrinha e dormi um sono resignado. Foi aí que sonhei com a Aurora.

Nada é muito certo nesse mundo. Mas taí, se eu varar, se alcançar a vacina, a meta a ser buscada é conhecer, ver de palmo em cima, a Aurora Polar.

(E atenção, tudo o que for dito a partir daqui, só terá serventia para quem acredita na lição de Geografia lá da quinta séria, que dizia a Terra, ser redonda e achatada nos pólos. Se não considera essa afirmação, pode desembarcar e mergulhar nas sombras do fim do mundo que distam um nadinha assim dos abismos pavoroso da terra plana).

Aurora, sabemos, é nome próprio, de irmãzinhas que chegam e nos alegram. Está presente em marchinha de carnaval, em samba de breque, e na mitologia romana. É um evento temporal, também. Em nossos dias comuns, tem o sentido do amanhecer, do nascer do sol ou o início da lida.

Das polares, a mais conhecida é a Aurora Boreal. Aí já vem com sobrenome. Boreal é uma alusão ao Titã Bóreas, citado na mitologia grega e que comandava os ventos do norte. Mas a Aurora também ocorre no sul do planeta e por essas bandas é conhecida como Aurora Austral. O adjetivo austral já não tem entidade grega ou romana que o inspire, mas lembra da mesma forma, vento. O vento do sul.

A mais famosa das Auroras polares é a boreal. Por um motivo simples. Pode ser vista em regiões, mesmo que acanhadamente, habitadas. Ocorre nas altas latitudes, nos longes e frios. Ambientes onde não são comuns, as aglomerações urbanas. Do outro lado, no sul do planeta, a Antártida é pouco simpática às gentes e coisas.

Os lugares de melhor visibilidade são aqueles localizados na região do (Terra redonda e achatada nos pólos, heim, gente!) Círculo Polar. É um fenômeno que produz no céu, luzes verdes, vermelhas, azuis e em ondulações, como se fosse uma dança leve e suave de tonalidades. Tem origem na interação do vento solar com as linhas de força do campo magnético da Terra.

Eu, vendo as imagens, os registros dos viajantes que se lançam àqueles longes, fico fascinado. É arte da natureza que merece todos os esforços para ser contemplada (vencer o vírus conta).

A Aurora Boreal acende em mim a esperança, credencia a possibilidade de, ainda em meio à pandemia e às incertezas, nutrir um objetivo futuro. Pensar metas, ter expectativas.

Enquanto suspiro, esperança há.

 

 

3 comentários:

  1. Em cada crônica uma lição de vida e acadêmica.
    Gostei da menção à "Orora" do Ivan...jijiji

    ResponderExcluir
  2. Nossa fascinante obrigada Sodré e que logo logo você veja a Aurora de pertinho

    ResponderExcluir
  3. Nossa fascinante obrigada Sodré e que logo logo você veja a Aurora de pertinho

    ResponderExcluir