sábado, 22 de agosto de 2020

crônica da semana - o frio do meu quintal

 O frio do meu quintal

Se a gente contasse, na cidade, com ônibus equipados com ar condicionado, na certa, eu romperia o isolamento social, e daria, pelo menos, duas voltas completas no Pedreira Lomas só na frescurinha, só na confortabilidade, depois do almoço. Seria uma alternativa ao custo de duas passagens, para vencer esta batalha duríssima que está se tornado o horário ‘de meio-dia pra tarde’, em Belém. Porque ar condicionado em casa, é só pra quem pode, né.

Mas que é necessário, isso é. As tardes estão de esturricar o cocuruto. Por demais quente e seco, o tempo. Sem cabedal pra manter um ar condicionado e sem a opção de um tour no Pedreira-Lomas, o jeito é improvisar no quintal.

A primeira opção que grassou aqui no coletivo, foi uma piscina, plástica, daquelas que fazem a festa da meninada. Estava até encaminhada uma pesquisa e tudo, mas tinha um custo, o tamanho da piscininha, grande para a área reduzida do quintal, mas pequeno, caso todo o coletivo quisesse dar um tibêi ao mesmo tempo.

Aí, dei que tínhamos há tempos, uma mangueira em casa, sem uso. Rapidola, abandonamos a idéia da piscininha. Resgatamos a mangueira dos guardados, montamos os engates, as conexões, as vedações. Achamos até aquele bico controlador de vazão pra adaptar na ponta. Pronto, nossas tardes de calor amainado estavam garantidas. Dá até um friozinho, na hora do banho de mangueira. Duvida?

Aí é que a gente torna para os mistérios do universo. Pleno sol de rachar, temperatura pela hora da morte, mormaço, a gente em tempo de estoporar e um jeitinho aqui, outro ali no jato de água, muda tudo radicalmente.

A fonte desse mistério é exatamente o bico regulador de fluxo que adaptamos na mangueira. Quando alteramos a forma do esguicho, um fenômeno espetacular, que vou me esforçar à cata da explicação, acontece. Com o bico da mangueira totalmente aberto, o fluxo de água é contínuo, compacto e acompanha a temperatura ambiente. Sai uma água quentinha. Por outro lado, quando a gente fecha a saída, no bico, a água vem fracionada, o jato forma aquela cortininha, à guisa de uma chuva em pequenas gotas. Desse jeito a água fica fria que é uma maravilha. Conseguimos refrescar o corpo e resfriar o ambiente, só fazendo chuveirinho.

E tem um detalhe que é um assombro. Há um jeitinho de formar a cortininha, bem em cima da gente, que quando nos oferta o jato neblinado individual, tem a capacidade de reduzir drasticamente a temperatura na área em que atua. Um tempinho de nada embaixo dessa nevinha, e periga até a gente tiritar e bater o queixo.

Nas tentativas de tornar a tarde um tempo possível de sobreviver, sorrir, ter algum ânimo, experimentamos a valer, as várias restrições no bico da mangueira e nos contentamos com a sensível melhora da temperatura e do humor, no quintal.

As tardes da família agora são de resistência ao calor, do jeito possível. Mesmo porque, não pudemos contar com uma ajuda de nossos representantes na Câmara Municipal, que nos permitisse, por lei, dar as voltas pela cidade, beneficiados pelo ar condicionado do Pedreira-Lomas. E também, são tardes de buscas pelas explicações. Reconhecemos, por esses dias abafados, que a satisfação refrescante pode até ser alcançada pelo instinto, mas só a ciência, o apego ao conhecimento, podem explicar o fenômeno que, olha, tem nos aprazido pacas nos últimos dias. Vou já recuperar dos meus guardados, os apontamentos do professor Campbel, lá dos anos 80, na ETFPA. Tenho certeza, esse friozinho, ser arte que a Física explica.

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