sábado, 20 de fevereiro de 2016

crônica da semana - segundo tempo argel

Segundo tempo
Se, daqui pra mais tarde, eu responder algum e-mail aos meus leitores, é sinal de que sobrevivi. É que mais com pouco, vou participar de um jogo de futebol comemorativo dos 20 anos do meu menino Argel.
Tenho que cavucar bem cavucadinho na memória a última vez que joguei futebol. As lembranças recentes me levam aos primeiros dias na Vila dos Cabanos. Tínhamos uma turma animada para a bola. Após o curso de formação industrial, já além das onze da noite, ocupávamos o campo Sangue e Areia e nos batíamos até a alta madrugada sob os protestos dos vizinhos e da cachorrada, que à menor chance (como se para isso ensinada fosse), abocanhava e bandava a nossa bola. Dista dessa época a derradeira investida que fiz ao futebol jogado de vera. Embora nem corresse atrás, ficasse de flozô na banheira, e só quisesse bola no pé. Mas se a pelota me achasse, sabe, né, era caixa.
Depois disso, não mais encarei pelejas adultas disputadas. A retirada de parte do menisco, a barriguinha arqueando, e uma busca exasperante por ar a cada passada mais ligeira, são combinações relevantes que contribuíram para que eu me afastasse dos gramados.
Mas a paixão pelo futebol sempre me dominou e compensei minhas vontades fazendo pequenas participações nas brincadeiras de bola do meu filho. No início, ainda bebê, ficava me exibindo pra ele. Mostrando como fazer embaixadinha com os dois pés (50 sem cair), como matar a bola, domínio e direção de chute. Depois, na adolescência era ele que me levava pra completar o time com os meninos do top dele. Eu fazia umas firulas, dava umas carreiras, ganhava um hematoma, ficava na baba e pedia pra sair. Aconteceu uma vez, de uns moleques que passavam pela rua, nos desafiarem. Todos posudos, vindos dos arrabaldes, cheios de macetes. Formamos, eu e minha patotinha. Demos um baile. De quebra, dei lambreta, chapéu em adversário, chutei de trivela. Aguentei (só Deus sabe como) até o final da brincadeira e só vi, no final, os adversários saindo de fininho e resmungando que tinham perdido para um time que tinha um monte de molequinhos e um velho.
Com essa aventura vitoriosa, na memória, Argelzinho tem insistido para me ver em ação de novo. Quando fez quinze anos, articulou um time dos ‘amigos do papai’, mas tudo ficou só na intenção. Por urgências outras, os amigos do papai declinaram.
Agora, ao completar 20 anos, Argel volta à carga. E argumenta, confiante, que olha só, o aniversário cai num sábado. Dá pra todo mundo participar.
Pois é. Não basta ser pai. Pesquisei entre meus contemporâneos, aqueles que estão sem restrição médica, os que estão isentos de marca-passo ou stent e, ainda no último critério, aqueles que ainda correm de chuva. Sobramos eu e meu compadre Edir Gaya. Ele, que não é besta nem nada, vai de goleiro. Eu vou ter que me aviar numas carreiras na linha. Vamos garimpar mais três e formar nosso escrete de exibição. Daqui a pouco entro em quadra, para satisfazer o desejo do meu rapazinho. Concentração total, só esperando o trilar do apito. Se eu fizer contato mais tarde, é sinal que varei.


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