sábado, 1 de julho de 2017

crônica da semana- biotônico

Biotônico Fontoura
Peguei todo mundo na mentira. Nem era par ser este Bê-á-bá...Bê-é-bé...Bê-í-bi...o-tônico Fontura o título desta crônica. O certo mesmo era esta historinha ter por título o outro suplemento famoso da minha época de moleque parrudo, o óleo de fígado de bacalhau. Mas é um nome grande, com sobrenome e subtítulo em versão erudita “Emulsão Scott” e em dito popular “Emulsão de Escote”, que era como eu conhecia. Por aí a gente tira, só no título eu consumiria boa parte dos caracteres que me são disponíveis nesta prosa.
Mas não vamos nos bater. Não há motivo pra gente ficar de ponta. Minha mentira é doce. Não é de fazer mal. Apela para uma imagem, para um gosto antigo e revigorante, abre o apetite, tira a palidez e, olha, é mentirinha cheia de afinidades, afinal, naqueles tempos, a Emulsão de Escote e o Biotônico Fontoura eram fortificantes que a gente tomava uma colherada dum; passava um pedacinho, e uma colherada doutro.
A dupla, me parece, ainda existe nas farmácias. Não tenho certeza. Perdi contato. Acho que por isso ando numa panemice, num desânimo só.
O que torna é que há um motivo pra este tema de hoje. E não tem lá a ver com a sustância e a boa disposição prometidas pelos elixires. Disse que era uma crônica surgida de uma imagem, num foi? E é. De um rótulo.
No vidro de óleo de fígado de bacalhau, o rótulo é ilustrado com a imagem de um pescador trazendo às costas, um peixe enorme. O bacalhau é fisgado e alçado de forma que, pendurado, dá na altura do homem.
Em mim, é marcante esta figura. Forte a idéia de um peixão fisgado. Elevado. Dominado. Uma cena anticonflito. Anti “O Velho e o mar”. Não sugere esforços exagerados do homem para pegar o peixe. E até me parece contradizer os benefícios da bebida, porque o homem representado não exibe aquele ar saudável, conquistador, vencedor. Na foto, tá mais pra Jeca Tatu que para Hemingway.

E foi no Veropa, que tal? Tava eu espairecendo da semana, tomando uma gelada, ao pôr do sol, bem de boa, só curtindo o ventinho terral, quando alguém, com um semblante entre o horror e a incredulidade, me levou a olhar além dos ombros. Atrás de mim, uma cena desconcertante para uns princípios conservadores que ainda cultivo. Uma moça estava sendo, literalmente fisgada. O arranjo consistia em mostruário de pano preto apinhado de brincos e piercings de tudo quanto é cor, tipo e qualidade, uma bolsa aberta, largada sobre um banco, uma moça dividindo uma cerveja com um parceiro e um rapaz (tatuador?) fincando um gancho deste tamanho um isso assim acima dos lábios dela. Esta sim, uma cena com o fulgor, com a energia e a força de um Hemingway. Na investida decisiva, acompanhei a zagaia varar a pele da menina. A bichinha chega ergueu-se da mesa (O rótulo da Emulsão de Escote se reproduzindo ali, de palmo em cima). Depois de perfurado o buço, a limpeza do pouco sangue derramado foi feita. Com o beiço meio inchado a moça olhou-se no espelho e aprovou o trabalho do tatuador (instalador de piercing?). Ali, em pleno Ver-o-Peso, a moça continuou com a cervejinha, e a prosa com o acompanhante. Fisgada e Feliz.

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