Uma volta de dangue
Domingo...
Tem a ‘noite do fogos’. Tradição antiga que antecede o Recírio, os fogos de
vista. Pelo que me torna e o que me deixa, agora sem os espocados barulhentos.
Por conta dos bons modos, penso ser a pirotecnia limitada ao espetáculo visual.
Sempre muito atraente e fascinante, ressalte-se. O colorido dos fogos de
artifício em tudo me encanta. A arte de dar cor, de selecionar elementos que
emitem luzes diferentes quando aquecidos, é valor incontestável da criação
humana (entendo que devemos nos quedar à surpresa quando a nós, nos é dado
saber que um dos componentes químicos da mistura pode ser um elemento chamando
Estrôncio. Pois sim, heim, seu Estrôncio!). E quando a gente pensa que este tipo
de manipulação dos agentes naturais data de sei lá quando, meu pai! E se
desenvolveu sem as tecnologias refinadas, e até por acasos ou sustos, aí sim é
que a atração é de entontecer. Há registros de os fogos tal como os conhecemos tenham
sido aplicados pela primeira vez há dois mil anos. Já pensou! Eu fico bestinha
da silva com esta rica engenharia humana Antiga, mesmo porque conheço as potencialidades
do fogo, em meio a tanta modernidade, limitadas às bocas do fogão. E olhe lá, isso
se tiver fósforo.
Os
fogos marcam também o final da Quadra Nazarena, que é o momento intenso, aquele
tempo aquecido de intenção, fé, paciência no trânsito e uns trocados para um
passeio no Largo; quando desapregamos de nossa hermética rotina para celebrar
mais um outubro da Virgem.
Eu
por mim, com a bênção da Santinha, cumpri o rito. Dei termo à desobriga nos
limites da minha entrega. E recebi de volta a tradição. Cumpriram-se as
romarias, alinhou-se o sagrado e o profano, os estivadores fizeram a sua
homenagem. Teve a chuva da Santa, a Chiquita agraciou os destaques com o
desejado, porém somente por alguns conquistado, troféu; eu dei aquele rolé pelo arraial e, como reza o costume, com
toda a família.
Não
sei se prestei o reparo suficiente, mas ao largo, por onde andei, não vi nem a
maçã do amor, nem o algodão doce. Elementos que me enlouquecem de memórias
afetivas e me atravessam de fora a fora de desejos. Se havia, passei batido.
Falha técnica imperdoável dar uma volta no Largo e não voltar lambuzado dos
doces do algodão e da maçã. Com o detalhe que, no caso da maçã, uma cerimônia
de partilha genuinamente cristã marcava o momento. Nos anos contados
anteriores, ocorria de ser apenas uma maçã para toda a família e cada um dava
uma prova. Era a celebração do bem comum. A reiteração do compromisso comunitário,
do usufruir coletivo.
É
provável que tenha patetado nas guloseimas porque de uns anos pra cá tenho é me
mundiado com tantos brinquedos novos e radicais espalhados pelo parque. Cada um
mais desafiador, mais fibrilador que o outro. Sentar numa cadeirinha daquelas
mais parece ser enfrentar um treinamento para astronauta sênior do que folgar-se
em pueris rodopios. Nessa mesma e desproporcional conta, destaco a ausência do
inofensivo e inegavelmente histórico carrossel, aquele com o sobe-desce dos
cavalinhos. Não vi por lá. O que causa um vazio no passeio da família já que
representava a oportunidade não só dos pequeninos experimentarem uma voltinha
na velocidade da contemplação, como também dos pais, que logicamente faziam
questão de fazer companhia aos filhos ali do ladinho, posando pras fotos,
subindo e descendo.
Alguns
brinquedos antigos se fazem notar de prima, como a roda gigante. Outros são
apresentados com outros nomes, mas ainda os reconheço como tira-prosa e dangue.
Ao longe, numa espiadela localizei a barraca da pescaria e das argolas. Não me
atraem. Não por nada. É que na vida, não ganhei uma lembrancinha sequer nesses
jogos. Acho até que tenho um trauma, sei lá, uma cisma. Quem sabe par’o ano
tento a sorte.
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