Eclipse à noite também vale
Como
diria aquele erudito, tirando leite das pétreas referências filosóficas forjadas
do discurso principesco de Maquiavel, “o eclipse tinha que acontecer era de
noite”.
E
jura que eliminaria risco de a luz do sol nos magoar as vistas.
Esta
possibilidade é um tanto de absurdo da negação pra gente nem dar trela. Mais
porque o eclipse do Sol é um fenômeno de alta grandeza, um movimento natural
meticulosamente traçado pelo precioso ciclo celeste. E também pela estranheza
composicional do evento, colocando o sol pra trabalhar de noite. Nem se a Terra
fosse plana seria combinação possível. Deixa estar que entendo. É por cauda da
trabalheira que dá para ter êxito na observação diante do brilho forte e
impactante do sol. E por entender, dou aquela assoprada. Existe sim um tipo de
eclipse que acontece de noite. Só que não é do sol. É o eclipse da lua. Que se
não é de igual beleza e valor, é parecido. E vamos nos aviar, que agora em
outubro, antes do fim do mês, tem um.
Voltando
para o dia claro, tivemos um evento raro se realizando no céu do Brasil, sábado
passado. Em alguns pontos do país, mais completo, em outros, menos. Em todos os
casos e modos, fascinante: o eclipse anular do sol.
Anular
porque no momento de maior expressão, a imagem formada na combinação de posição
Terra-Lua-Sol, lembra um anel. E pela emissão de luz, nas bordas, um anel de
fogo. Isso acontece porque o sol não some totalmente atrás da lua. Quando some
inteirinho, o fenômeno recebe o nome de eclipse total.
Eclipse
quer dizer desaparecimento, abandono. É o caso de um objeto ser encoberto por
outro. No caso do evento de sábado, tem-se o Sol ser empatado, ser escondido
pela lua em seu trânsito regular ao redor da Terra. Uma comparação boa, já que
falei de trânsito, é o trânsito de Belém. Principalmente quando a gente tá na
parada de ônibus, esperando aquele que nunca vem e quando vem, um outro corta a
frente dele, o motorista do nosso ônibus não nos vê. Ficamos eclipsados. Às
vezes até nos vê, mas finge ser empatado pelo outro ônibus, desvia, queima a
parada e nos deixa na mão. Este tipo de eclipse que nos deixa no maior abandono
acontece direto aqui em Belém comigo.
Bem
comparado, volto ao eclipse de sábado.
Foi
um espetáculo! Em alguns pontos deu até pra ver as beiradas doiradas do sol
ardendo em plasma. Uma maravilha! Quem teve cuidado, usou equipamento adequado,
valorizou a segurança, teve a oportunidade de presenciar um fato raro que vai
demorar pacas pra acontecer de novo. Da mesma forma, rara foi a preparação. A
maioria não se deu conta, comeu mosca e na hora agá, sequer a plaquinha de
soldador indicada, tinha em casa para fazer a observação. Foi o meu caso. E
olha que sou ligado nas paradas astronômicas. Na batida da campa, recorri aos
meus ralos conhecimentos de Física e montei uma caixa escura. Com a projeção da
imagem que consegui, me dei foi por satisfeito.
Entretanto,
sei de reações enérgicas de descontentamento, frustração. E até atos
desesperados de rebeldia como olhar diretamente para o clarão do sol ou mirar de
palmo em cima, superfícies reflexivas. Atitudes reiteradas vezes reprovadas por
especialistas. Tudo com a intenção de captar o melhor momento do eclipse.
Não
pode esmorecer, nem se afobar do jeito de ficar com problemas de vista depois.
O eclipse solar é belíssimo, já ensejou medos e mistérios, foi decifrado pela
ciência e não é coisa de se passar batido. Só que para ficarmos de confronte ao
anel de fogo, todo o acervo de equipamentos e suportes de segurança ainda é
pouco. Se não tiver o aparato, paciência. Fica para a próxima. Ou nos demos por
satisfeitos com o eclipse da Lua que é de noite e se aproxima. Não precisa de
nada, a não ser a atenção do olhar e, se não é igual em beleza ao eclipse do
Sol, é parecido.
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