Eclipse
oculto (e põe oculto nisso)
Em
1991 aconteceu um eclipse aqui na região Norte, que mobilizou uma pá de gente.
Para mim, ele foi um eclipse tão oculto, mas tão oculto que não vi um tico
assim. E olha que fiz por onde.
Na
época não tinha essa informação vasta pela internet, mas como sou metido nessas
paradas astronômicas, fiquei sabendo com bastante antecedência do dia, mês,
ano, horários e regiões em que o eclipse poderia ser visto nas melhores formas
e jeitos. Em Belém, o sol teria uma ocultação parcial, que nem essa do último
ocorrido. Ficaria em torno de 40%. Mas pra mim, já valia.
Trabalhava
em uma mina no Amazonas, por esses dias. Articulei com os colegas, fiz as
contas dos dias, bem certinho, programei minhas férias. Ficou tudo no jeito. Se
a memória não me trai, foi em Julho. O fenômeno iniciou, como este que passou,
ao cair da tarde, e como este que passou, apesar de um mês de sol pródigo, que
é julho, exato neste dia, a tarde nublou. Égua da pissica da velha chica! Parece
uma coisa. O pobre do belemense não tem uma forra nem pra ver o eclipse, vôte!
Animadíssimo
estava, desde o início da tarde. Tive a aquilatada companhia do meu compadre
naqueles momentos de espera. Marcamos encontro, almoçamos em algum lugar ali pelo
centro e até a biqueira do eclipse, administramos a ansiedade tomando uma
gelada no Bar do Parque, sob as benções de um geral que alvoroçava as
mangueiras da Presidente Vargas. Estava preparadíssimo. Sabia que a exposição
exigiria cuidados (com 40% de ocultação, seria quase que um sol normal
brilhando intenso e emitindo ultravioletas perigosíssimos para os olhos).
Montei várias partes de placas de radiografia desde aquelas antigas do meu
menisco bichado até a mais recente radiografia do pré-molar (hoje sei que esta
forma também não é segura. A peça admitida para observar eclipse é o filtro de
soldador, aquele de mais alto grau, mas mesmo assim, para uma observação de
poucos segundos. Mas o mais seguro mesmo é fazer a projeção em superfície
branca, como já nos advertia Kepler lá em miliquinhentos e uns caroços).
Quando
deu a hora, descemos para a escadinha. O vento geral tava que tava e isso aumentava
a excitação daquela ruma de gente descendo para a baía. E era um quiquiqui, um
alarido, uma animação. Mesmo quem não se conhecia, puxava conversa, procurava
ver a qualidade das radiografias dos pré-molares... Houve de certo, uma
interação, meio aquilo de povo unido. Na alegria e na tristeza. Por fim, necas
de pitibiriba. O sol não apareceu. As nuvens não abriram uma brecha e pra
completar, caiu uma chuvinha.
Frustrados,
eu e meu compadre desviamos para um bar que tinha bem na beira do Ver-o-Peso.
Tomamos todas. Edmar, do Mosaico de Ravena, estava tocando lá. Pedi uma canja e
submeti aquela plateia a um grande sofrimento. Fui convidado a devolver o
violão em meio a uma chuvarada de papel, cubinhos de queijo, pelinhas de
tomate, petiscos diversos, apupos e palavras pouco elogiosas.
O
pior né nada: lá no Amazonas, de onde eu tinha vindo de férias, o dia escureceu
plena três da tarde e os passarinhos endoidaram.
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