Culpa do Juraci
Mas, ô coisa pra dar certo!
Depois de uma semana e pouco com uma virose que me
pegou pelo gasgo, cortou e arou o meu ânimo, e me pôs às quedas, me vem o
alívio. Tava mofino, mesmo. Pródigo em chiliquitos enfadonhos, hios e chios insolentes,
devastadoras angústias, espirros e constipações.
Era só a noite chegar que um gogo violento me atacava,
uma tosse irritante me vencia. Era um tuco-tuco de estremecer as paredes. Uma
desinquietação, uma desesperança. E haja exercício fonoaudiológico: nunca na
história deste país, a palavra otorrinolaringologia foi pronunciada, por mim,
com tanta desenvoltura, quanto nesses dias passados, de tanto que a garganta
ardia.
Ainda bem que passou. Umas furadas na poupança e umas
‘piulas’ deste tamanho me ergueram. Ah, e ainda uma trova que recebi do meu
amigo poeta Antônio Juraci Siqueira. E que diz assim: “Se a mão de Deus te
conduz/pouco importa aonde te leva/quem anda junto da luz/não há de temer a
treva”.
É por isso que eu digo: ô, coisa pra dar certo.
Palavras amigas que chegam, assim, como coincidência, feito previdência, no
instantinho certo que a gente tá precisando. Uma trova que fala de luz, de
certezas e confiança na estrada da vida. Não foi intencional (Juraci nem sabia
que eu tava dodói). Por isso tem um valor maior. Expressa uma emanação de
energia positiva facultada, um bem arbitrário. Elevou-me a moral, o poema. Foi,
sem errada, um caribé de versos bem chegados que me deram sustância e me
abriram a janela (e os brônquios) para o dia.
Tô na convalescença. Ainda me recuperando com cuidado
e zelo. Fugindo de qualquer respingo, da mais branda friagem, mas agora com o aditivo
das palavras a me estimular. Vou tornar à luz. Culpa de fármacos caríssimos e do
Juraci (que me veio sem ônus).
Aí, volto com o Juraci no tempo e o encontro nos
varais de poesia, no Centur; nos corredores da pensão da Cotinha; nos circuitos
de fotografia, na praça Ferro de Engomar e na minha silenciosa tietagem. Era fã
do cara. Acompanhava as andanças dele, mas ficava sempre de longe. Naqueles
tempos, já o considerava um mito, de parelha em mistérios e encantos, com o
boto.
Mas daí, houve a Feira do Livro de 1999. Foi o ano do
lançamento do meu primeiro livro “O Operário em Verso e Prosa”, em parceria com
o poeta José Miguel Alves. Éramos calouros na função. Acanhados. No estande dos
escritores paraenses, as estrelas mais reluzentes da nossa literatura. Dentre
elas, o Juraci. Nessa ocasião, descobrimos (eu e o Miguel), a face mais
detalhadamente humana do boto. A acolhida que Juraci nos deu, àquele meio ilustrado,
foi de todas as maneiras, generosa. Nos tratou como gente grande. Nos
intervalos das programações, sempre se achegava, batia uma bolinha com a gente.
Não dava tempo para nos sentirmos deslocados, eclipsados por tantos brilhos que
dali irradiavam. Ele já era o Juraci, uma das pedras angulares da Malta de
Poetas folhas e Ervas, e nós não éramos ninguém. Para ele, porém, éramos
colegas de ofício. Fomos abonados e ganhamos um naipe literário na Feira daquele
ano. Culpa do Juraci.
Tempos depois, aproveitei um Arrastão do Pavulagem,
catei o Jura da multidão e entreguei a ele uma pacotão datilografado com os
originais do meu segundo livro “O Dia Mais feliz...”. O poeta fez a
apresentação do livro em um texto grandioso, de uma nobreza, de uma
elegância... Enriqueceu o meu livro, falou coisas tão legais que eu fiquei até
meio metidão, enquanto durou a edição.
Agora, no início da semana, ele me trouxe a luz. Tô na
convalescença ainda, mas com a ajuda de tão cintilantes versos, com certeza
varo. Culpa do Juraci.
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