Intercâmbio
O
nome Zanata estava em duas passagens na minha história de boleiro e de amante
do futebol. Em uma delas, embora compondo um cenário do contra, eu como amante
do futebol jamais reduziria de tamanho e beleza. Foi num cruzamento do jogador
por nome Zanata que o Roberto Dinamite escreveu uma das mais brilhantes páginas
do desporto brasileiro. Um golaço contra o meu Botafogo, e roteiro que contou
com um chapéu no zagueiro Osmar e um voleio potente e certeiro, sem a bola cair
no chão. Jogada de plástica irretocável. Teve outra passagem que também, este
nome gerou um desconforto, mais logo falo dela.
O
que torna é que o destrambelho da vida atual me trouxe a deputada Zanata, por
esses dias, ostentando uma arma, um mandato e um discurso sem utilidade para a
sociedade brasileira. Única coisa que prestou na cena protagonizada pela parlamentar
foi a lembrança dos campinhos e dos times de rua, de Belém. E aí vem a outra
passagem.
E
foi ali pras bandas da passagem Santos Dumont, no final da Senador Lemos. Era
por lá que, naqueles anos em que os campinhos grassavam pelos subúrbios, ficava
o complexo da Mangueirinha, espaço de lazer formado pelo campo principal do
Aliança e a área livre nas adjacências, que quando a molecada era tanta, podia
resultar em mina de campos de travinha, e se a quantidade fosse mais modesta as
dimensões do lugar permitiam campos mais aqueles de grandes, para embates com
goleiro e time somando entre sete e nove jogadores. Pelo que me parece, ainda
há traços reliquiares da imensidão que era aquilo, como as mangueiras à margem
da Santos Dumont, que fazem o limite entre as ocupações atuais; e a praça
Dorothy Stang nos seus estendidos, infelizmente, da mesma forma ociosos, ainda
por agora. O complexo Mangueirinha era a versão Sacramenta para o nosso
espetacular Areal, da Pedreira que ficava nos domínios dos campos do Asas, do
Trabalhista e, de ganho, nos impunha a tentação de um mergulho no Igarapé do
Zé, logo adiante, no final da Marquês. Tinha a demanda da garotada de lá, mas
às vezes a gente ousava se abalar da Pedreira e encarava uma disputa na casa
deles.
Meu
compadre, o professor, poeta e instrumentista elétrico/eletrônico dos bons José
Miguel Alves era o articulador. Marcava data, selecionava o campinho, cuidava
do horário. O time dele era o Vasquinho. O nosso, o glorioso Iternacional da
Mauriti, à época das pelejas pela Sacramenta, já com o patrocínio do Ismael da
padaria. Todo luxento com seu jogo de camisa de escudo bordado, shorts brancos,
pão com manteiga e caldo de cana depois dos jogos. O time do Miguel era na base
da coleta. Escudo costurado, a faixa pintada com Acrilex e algumas do lado
contrário. Tinha no elenco um menino afogoiozado por nome Zanata, em homenagem
àquele do Vasco que era aloirado.
Na,
compreensível, última partida que jogamos no complexo Mangueirinha, não apareceu
juiz. Fizemos uma busca, o mais indicado era o Zanata que tinha pegado uma furada
de prego e não sentava o calcanhar no chão. Vá lá que seja, o loirinho, mesmo
cachingando, aceitou a missão.
A
partida estava tensa. Provocações de parte a parte. A torcida nervosa. Numa
disputa por alto, a bola saiu pra lateral. Dúvidas. Os dois times reclamaram a
posse. Perguntamos pro Zanata de quem era a bola. ‘Nossa’, ele respondeu. Pra quê!
Quem estava chupando manga no nosso banco sapecou umas duas no cocuruto do
Zanata e o tempo fechou. O time dele, a torcida e todo o bairro da Sacramenta
se doeu e veio pra cima da gente tomar satisfação. Zanata era muito querido.
Daí,
foi perna pra que te quero com mais de mil pelo estirão da Dr. Freitas. Nunca a
Pedreira foi tão perto. E ainda demos um mergulho no Igarapé do Zé, pra
desassombrar.
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