Orai e vigiai
A
gente tá assim, orando, vigiando; aqui, ali pensando na morte da bezerra,
contemplando uma arte, maldizendo um mal, patetando ou olhado pro tempo, que
seja, quando, de repente, pá! Cai uma bomba. Acontece. A vida para?
Não.
Cambaleia, tomba, dá de encontro, reanima e torna. Foi o que aconteceu na Feira
do Livro do ano passado.
Dei
uma passada rápida no Hangar, só pra não dizer que não fui. Visitei alguns
estandes, comprei livros, dei um alô pro Juarez da Ifá e pro Francisco do
estante dos Escritores Paraenses e, ó, pra trás. Antes de voltar pra casa,
passei rapidola naquele corredor dos fanzines, quadrinhistas e ilustradores.
Encostei na banca do Maciste Costa, que é um campeão, um magnífico vencedor em
tudo quanto é de desafio, de trabalhos coletivos a peças individuais que
envolvam o trato no traço. É o ilustrador de onze entre dez publicações que se
realizam por aqui. Travamos uma prosa, e entre tantos assuntos pendentes por
causa da pandemia surgiu este do medo que ainda nos assolava e que nos
afastava, inclusive, de atividades mais comuns daquela Feira. Um propósito tiramos,
naquele encontro. Defendia ele, que não podíamos desistir. Não adiantava
amofinar. Vez em vez, os olhos lacrimejavam diante daquelas palavras de
incentivo e eu me envolvia com a idéia de ser possível sim, superar o luto e
voltar a publicar absorvendo a energia e o entusiasmo que um livro sempre nos
inspira.
Antes
de aprumar para a Pedreira dei com o escritor Daniel da Rocha Leite. Assim como
eu, num pé e n’outro pra embicar no rumo de casa. Ainda tomando os cuidados com
os traiçoeiros golpes da pandemia, Daniel havia aceitado algumas participações
e contribuições ao cenário literário da Feira, afinal é nome de responsa,
respeitado, com um acervo espetacular de boas e grandes obras. Escritor
premiado, pesquisador. Atento aos encantos da língua. Eu, por mim, o tenho como
uma expressão ímpar na linguagem poética. Cuido de aqui, acolá, pegar um livro
dele da minha estante e me encantar. Tem o segredo da narrativa poética, que é
como vejo a obra dele. Ainda que em prosa, mesmo que mirando os termos na
sensibilidade infanto-juvenil, há um esvoaçar de sons de delicados lirismos nas
palavras aladas e, por vezes, intencionalmente caladas, que ele cria. Narrativa
submersa quando identifico que é o silêncio que canta, que fala, que se anuncia
na fresta das frases. E que a gente só vê, quando fecha os olhos... Dou o maior
valor.
Ali
no corredor da Feira, e muito apropriadamente, na correria do instante, nos
permitimos um afetuoso abraço. Sinalizei o quanto o admiro pela sua arte e
também pelo apego, pela dedicação aos momentos em que a literatura paraense
precisa de braços. Como na feira do Livro. Ouvi de Daniel, o mesmo que Maciste
havia me revelado lá atrás. Havemos de resistir. Com a emoção saltando de mim,
de novo lacrimejei e senti a vibração positiva daquele encontro. Fiquei com
aquilo. Na caminhada para casa, reconheci que aquela passada rápida pelo
Hangar, me proporcionou um encontro com heróis. Francisco, Juarez, Maciste,
Daniel. Houve ensinamento naqueles encontros e encorajamento.
Desde
lá, decidi que tão logo achasse um tema, recolheria do meu acervo, um tanto de
crônicas que pudessem compor um livro encorpado, e que trouxesse a minha arte
de volta às edições impressas. E eis que me vem, daqui a alguns dias, o
“Igarapé Piscina”, que está na fase de produção e que mais com pouco falarei
dele. Só adianto que, como reverência àqueles encontros, convidei para a capa o
Maciste Costa e para o prefácio, Daniel da Rocha Leite.
E,
pois é, a gente tá assim, orando, vigiando, a bomba cai, a gente tromba, dá de
encontro, se esmigalha, mas depois se junta tudo de novo.
Vai bombar o " igarapé piscina".
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