sábado, 2 de junho de 2018

crônica da semana - TCC


TCC em Beja
Estava decidido. A praia de Beja, em Abaetetuba, seria o cenário de meus estudos. O objetivo era reproduzir, ou pelo menos, induzir as pessoas a imaginar fenômenos grandiosos se realizando ali na nossa frente, possíveis aos nossos sentidos. Meu TCC teria um caráter educativo, com viés lúdico, permeado de ciências que estimulassem a criatividade, a abstração, o entendimento e a intimidade com os casos geológicos mais radicais. Seria como se os acontecimentos naturais que ocorrem em escala planetária, se mostrassem todos, na integridade dos seus detalhes mais sublimes, ali, na praia de Beja.
Faz tempo que não vou lá, mas, tirando os vagos da lembrança, podemos tomar a igreja como referência. Saindo dela, um caminho ia dar na praia. O meu trabalho se desenvolveria neste trecho. À época, era marcado por um barranco capeado de pedras vermelhas e duras, no topo. Depois o caminho se harmonizava em baixa inclinação, e ao final, antes de chegar na praia, se ramificava em desvios sulcados, discretas rachaduras entrelaçadas. Este desenho, em pequena escala, imitava certinho o percurso que o rio Amazonas faz desde a nascente até a foz. Lá em cima, perto da igreja, seria a cordilheira dos Andes, de onde o Amazonas despenca com muita energia, escavando as rochas em vales encaixados e profundos. Em Beja, a coleta de água do grande telhado da igreja, fluindo das biqueiras, adicionada a outras contribuições das casas próximas, formava um grande rego que ia cortando a laterita, barranco abaixo. Escritinho o Amazonas lá pras bandas das montanhas. Água de tanto bater, vai furando as rochas e o Amazonas quando se deita sobre a floresta já traz uma imensidão de detritos, areias, argilas, cascalhos retirados do maciço andino e chega ao Brasil embarreado e batizado de Solimões. Essa transformação a gente vê também, no aplainado ao pé do barranco, em Beja. Forma-se nessa área uma região de pouca queda e a gente percebe, além do fluxo constante, mas de pouca velocidade, a formação de pequenas poças toldadas, margens com acumulações de areia; em outros cantos, concentração de pedras maiores, sem muita força para seguir viagem. Aí a gente fecha os olhos e se convence de um grande ‘pra dizer’. Pra dizer que ali é a nossa encantadora planície!
O fim de todo o rio é o mar. E este é mais um ambiente que meu trabalho procuraria traduzir. Ao final da nossa liliputiana planície, surgiria a praia. Um grande final para um enredo líquido. A água da biqueira da igreja, após alguns minutos de viagem chegaria à baía do Capim e entregaria envaidecida a ela, nossa breve história da Terra. Assim como o Amazonas, soberano, entrega ao mar, partículas sólidas de nossas vidas ribeirinhas.
Quando abandonei o curso de Geologia, há dez anos, estava cursando uma disciplina que fala sobre essa dinâmica de rios e corações. Durante as aulas, decidi sobre o meu TCC. Tinha a intenção de trazer o fascínio da Geologia para mais perto das gentes. Se meu TCC tivesse vingado, por certo, nesta semana em que se comemora o dia do Geólogo, eu me sentiria um cara realizado pacas e tomaria todas.



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