sábado, 25 de agosto de 2018

crônica da semana - teima


Teima
O Luís Fernando Veríssimo é um cronista aquilatado. Tem um texto valioso. Leio Veríssimo desde que era bebê, em Rondônia. Desde a explosão que foi “O Analista de Bagé” ou o vendaval que se tornou a publicação de “Ed Morte”. Sou fã do cara desde aqueles tempos em que a gente conseguia as publicações dele somente pelo Círculo do Livro. Edições capa dura, bem produzidas e que demoravam quase dois meses pra chegar, via correio. Por essas e por outras acho que temos certas intimidades. Certas empatias. Disse isso pra ele, em uma das edições da Feira do Livro, ainda no Centur.
O que se torna e o que se deixa é que acabei de ler mais uma coletânea do Veríssimo e me vi de novo, alinhado com os mesmos sentimentos, as mesmas manias e as mesmas teimas em uma crônica em que o criador da “velhinha de Taubaté” impinima com a passagem do milênio. Teimo do mesmo jeito.
Em 1999, me emboletava em ferozes e intermináveis discussões sobre a virada do milênio. Lembrando: Houve uma manipulação que nos enfiou goela abaixo que o século 21 começaria no dia primeiro de janeiro de 2000. A minha tese e a do meu cronista preferido considera que o terceiro milênio começou de vera, no dia primeiro de janeiro de 2001. E haja teima. A grande mídia, a Onu, a astrologia e até o mundo binário da computação embarcaram na onda. Inventaram o tal do “bug do milênio” que viria ser a besta apocalíptica da troca de algarismos na virada do século. Não sei o argumento do Veríssimo para validar a tese, mas a minha vem lá da quinta série. Minha professora de História, no primeiro ano do ginásio, demarcou a contagem do tempo considerando o ano 1 da era cristã. Então o primeiro milênio foi do ano 1 ao ano 1000, aqueles anos marcados pelas trevas medievais. O segundo milênio, obviamente percorreria do ano 1001 ao ano 2000, ora bolas. Em 2001, sim, é que começaria o terceiro milênio. Estava lá no meu livro TDH (Trabalho Dirigido de História, que a gente recebia do governo). Sei que tantas foram as lambanças e as firulas que mesmo o mundo virtual provou ser sem sentido os medos. Nenhum computador pirou. Uns ajustes na data e hora no canto da tela do computador, dessas que faço todo dia porque meu PC tá meio cansado, redimiu toda a humanidade das fakes apreensões.
Outra teima que me faz encrencar com o cristão que for é aquela do “que dia é hoje?”. Alguém sempre vem todo metidão dizendo que “hoje são 25 de agosto”. Para mim, esta resposta é um atentado sonoro. Um acinte ruidoso. Uma descompressão fonética violentíssima, capaz de fazer saltar do coco da gente os tímpanos e a paciência. Dizem os entendidos que esta forma é certa. Morro sob tortura afirmando que o verbo é no singular: “hoje é 25 de agosto”. Ávido, recorro aos compêndios gramaticais ortodoxos. Oportunamente, me agarro à elipse, figura de linguagem que me socorre.
Nos encontramos nas teimas eu e Veríssimo. Às vezes, preciosismos literários. Na vida real, as questões são mais substanciosas. Idéias e ações podem apagar o mundo. O risco de nos quedarmos à escuridão nos inspira à teima renhida. Sem medo de ser feliz.

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