sábado, 4 de agosto de 2018

crônica da semana- araucária


Zona Temperada sul
A gente quando volta de férias tem que contar um pouquinho do passeio. Assim é a escrita desde os tempos das redações no grupo escolar.
Talvez tenham, essas redações, sido a antecâmara da minha versão cronista ficcionista. Olha que inventava. Dizia ir para cantos que não ia nunca. Criava aventuras e divertimentos. Forjava bronzeados e amores de trapiche.
Hoje não enfeito o pavão não. Conto o certo e o ocorrido. Este ano, mirei conhecer o frio e abicorar a constelação do Cruzeiro, nas altas latitudes.
Então vamos lá: “minhas férias”.
Cruzei o Brasil e fui dar no Rio Grande do Sul. Ô, coisa pra dar certo. Parece até que foi um passeio planejado no Excel, com formulinhas e tudo. Foram dez dias bem divididinhos. Metade do passeio, céu plúmbeo e frio de lascar o cano; a outra metade, tempo aberto e todas as chances de medir e reverenciar a constelação do Cruzeiro.
Para quem foi descobrir como é, subestimamos o frio. Levamos aquelas blusinhas clássicas de mangas compridas, uns casacos emprestados, luvas de meia. Se a gente mais que depressa não se aviasse nos brechós, e triplicássemos as peças de agasalho, cairíamos tesos e congelados. O troço não é de brincar não. Dois, três graus de temperatura é tempo e cenário que exigem o maior respeito. Nos primeiros dias, a nossa valência foi um cobertor que, muito apropriadamente, apelidamos de montanha. Tinha uns seis metros quadrados e uma espessura taluda assim, ó. Foi o nosso iglu, nos momentos mais difíceis. Roupas eram às camadas. Usar o banheiro, uma operação de guerra. O atenuante é que por lá, tudo é arranjado para enfrentar o frio. Alguns compartimentos das casas têm aquecedores elétricos, lareira, a água das torneiras é quente. Valorizamos cada espaço morninho que conquistávamos. Valeu. Conhecemos o frio e deu pra varar, nessa gelada aventura.
Do meio pro fim, o clima virou. Os dias amanheciam com um céu azul de encandear. Acordávamos com a temperatura beirando os dez graus, o que para nós já era um padrão suportável. Dispensamos o montanha.
Anoitece cedo, esta época do ano, por ali. Então, antes das seis, Vênus já dava o ar da graça, Escorpião se exibia no zênite, e Júpiter puxava o cortejo de pontos cintilantes. Dali, foi um pulo para eu achar o Cruzeiro do Sul. Não digo que foi uma surpresa. Eu esperava confirmar mesmo a impressão. Mas foi algo muito prazeroso (e tanto, que não consigo traduzir nestas linhas, o que senti naquele encontro) quando localizei o Cruzeiro, numa altura no céu bem diferente daquela que costumamos ver por aqui. Em Belém, é até difícil achar o Cruzeiro do Sul, por causa dos prédios e dos elementos urbanos. Aqui próximo ao Equador, ele nasce lá embaixo, bem rente ao horizonte. Por causa da curvatura da Terra, quanto mais a gente anda pro Sul, mais ele ganha altura no céu. Quando vi o Cruzeiro em cima do meu cocuruto, pirei total.
Ah, sim, apreciei ravinas bordadas de pinhos, pinheiros, e espécies afins da Mata de Araucária, um tipo de floresta que só conhecia dos atlas geográficos.
Desde o grupo, a gente tem que contar um pouquinho. Assim tá na escrita.

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