A sesta e o sexto sentido
Depois,
depois... Não tenho culpa se os fatos acontecem comigo desse jeitinho, se
bandeando para o lado dos impressionantes mistérios. Mas parece uma coisa.
Dita, escrita e subscrita pelo destino.
Aconteceu
há alguns anos, muitos até, d’eu sonhar com o encarreirado de números certinho
no tanto de quebrar a banca do bicheiro. Contei este causo aqui, certa vez. O
relevante da história é que foi um sonho que me ocorreu naquele sono da
tardinha, aquele depois do almoço, que a gente não dá nada por ele. E também,
foi num contexto de precisão. Pra eu estar dormindo a sesta, em casa, era caso
de ócio forçado. Barra pesada e imprensada do desemprego. Estava, como se diz
no trecho, urrando. Na pira-paz de grana, chorando um olho e remelando outro
por um anúncio nas páginas de jornal ou uma indicação da parceirada das lidas,
para uma oportunidade de trampo. Não domino a arte do jogo, mas passei os
números na ordem que apareceram no sonho, pra mamãe. Ela fez as contas, somou,
dividiu, tirou a prova dos nove, a prova real, vai um aqui, empresta outro ali,
fecha o parêntese, passa a régua e ela preencheu a pule na extração do corujão.
Éraste! Cravou na cabeça. Rolou uma grana firme, que se não fosse a reaplicação
no jogo, nos garantiria vida boa, sem travanca, só na manha, por uns três
meses, tirando até onda, fazendo extravagâncias, escolhendo a pá só com o osso
da peça, no talho do Manduca. Mas tirando um pelo outro, o ter e o haver, foi
um tutu rechonchudo que nos valeu que só.
De
tal sorte que se maldo para os desdobros, era de colocar uma plaquinha na porta
de casa para me ocupar as tardes, antevendo números pra galera. Resisti, mais
porque não mais sonhei com piriricas de nada, que por algum pudor guardado no
coração (confiava, porém, que pelo sagrado ou pelo profano, numa hora ou outra
a premonição me visitaria de novo).
Eu
fiquei impressionado com essa história dos números. Deu de desconfiar mesmo que
me avio com uns fenômenos aí extra-sensoriais, fora, além dos nossos comuns
pendores. Porque não foi só daquela vez que me vi envolvido nessas paradas.
Outras, com sonho, sem sonho, às vezes com uns arrepios ou esquentamento de
orelhas, sinais silenciosos, sentimentos estranhos; outras vezes, desta ou
daquela forma, me ocorreram.
Ou
mesmo atuando nas beiradas das coincidências. Como agora, este ano, quando os
extremos me acompanham.
Pelo
que torna e pelo que deixa, nos tempos atuais tenho me dedicado a periódicas
jornadas de vovô em terras cariocas. Na minha missão de início do ano, experimentei
um calor espetacular por aqui. Uma aventura de contornos térmicos dramáticos.
Temperaturas acima da média. Em alguns pontos da cidade a coluna de mercúrio
subiu além dos 47 graus. Agora mire e veja, se não é um chama sobrenatural para
os sobressaltos. Desde o início do mês de agosto, cumprindo outra fase de
vovozinho, estou vivendo exatamente o contrário. O mês todo é de frio bem doído
para os padrões cariocas e uma sequência inteiriçada de dias gelados que não se
registrava há pelo menos 20 anos. Diante das vivências extremas, posso
considerar que se alguém está querendo uma reviravolta climática, é só me
chamar que o tempo desanda. Tenho a liga, o chama. Ensejo as consequências mais
atarantadas do aquecimento global. Não que eu queira.
Posso
colocar na conta de um sexto sentido, um fluido ativo outro e oportuno, que se
manifesta ao acaso e faz acontecer. Me vejo na pretensão de ser um arremedo dos
mutantes, aqueles dos filmes com seus poderes sem controle. E nem sei avaliar a
minha qualidade de mutante. Se da turma dos bonzinhos ou dos mauzinhos. Por
agora, percebo que para forjar as tendências do frio-quente, nem é necessário o
expediente da sesta, da premonição, do esquentamento de orelha, dessas
esquisitices. Os absurdos mundanos fazem por mim. Nem sonhar sonho mais.
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