Pitico e os ipês da Marquês
Não
sei se patetei, passei batido, caminhei pra’aquelas bandas depois do caso
passado, imaginei, romantizei demais. Só sei que não vi florada que me chamasse
a atenção dos ipês da Marquês, este ano. Na linguagem comum das beiradas,
dir-se-ia que dessa vez só encontrei ipês pecos. Árvores amofinadas, de viço
pouco. Bem diferente de encontros anteriores, quando brilhavam ao longe,
sobressaíam-se rosa tendo o interflúvio do Galo e do canal da Três de maio ao
fundo.
Pra
não dizer que teimei no vago e no seco, fucei lá no meu blog, crônicas passadas
em que enchi a bola daquele enfileirado de ipês que se estende pelo final da
Marquês de Herval. E dei com os relatos, as evidências do tempo. Afinal é pra
isso que a crônica vinga. Para ser o sinal do caso este ou aquele que se
realizou em determinado tempo. E que se eterniza em narrativas irrigadas pelo
coração. E meu coração bate no ritmo aquele que encontrei na crônica. E lá está
o deslumbramento, o encanto que senti em 2021 logo que tomei coragem pra
enfrentar as ruas, em meio a tantos sustos vindos da Covid. Exercitava o corpo
há tempos recolhido em casa. Meu caminho era o estirão da Marquês. Na mesma
batidinha, de máscara e obstinado na prática reparadora da aeróbica, encontrava
sempre o professor Paulo Nunes. Aos poucos fomos nos recomendando ali pelos
encontros no caminho. “Hoje os ipês estão maravilhosos”. Entre julho e final de
agosto contei umas quantas floradas. Ocorria pico do colorido rosado, a copa ficava
densa daqueles ‘coninhos’ graciosos. Passavam uns dias e as flores caíam. Mais
com pouco voltavam, com a mesma energia, com o mesmo garbo e com a mesma
alegria.
Este
ano não vi isso. Não percebi reincidência na florada e nem a pujança do
colorido. Somente a timidez dos ipês da Marquês, notei.
Pode
ser, né, pode ser que tenha ocorrido. Passei uns dias fora, de férias. Se rolou
mesmo, o esplendor, perdi. E tá perdido. Só par’uano agora.
Além
do atrativo dos ipês, a Marquês entra na pauta das minhas caminhadas por causa,
ora, de boas lembranças da minha doce meninice.
A
rua se destaca por ser bem larga. Hoje tem os canteiros e tal, mas antes era de
grande envergadura. Minhas recordações tendem a seccionar a Marquês em breves
trechos, cada qual com o seu cada qual, a sua particularidade. Por ora, me
apraz contar sobre o pedacinho entre a Mauriti e a Estrela. Ali foi o palco de
grandes embates no futebol de rua. Nem preciso dizer que as estrelas do
insuperável, inquebrantável, inarredável, imbatível Internacional da Mauriti
cortavam e aravam com o melhor futebol por lá.
As
disputas eram duríssimas, ferozes. À época a rua não era pavimentada. Era
coberta com uma piçarra vermelha e ladeada de valas largas tomadas de capim em
alguns pontos e povoadas de girinos. De vez em quando um atleta era jogado pra
dentro da vala. Por isso que nessas partidas, eu preferia atuar na zaga. Embora
pequenino, era raçudo. Mandei muito atacante abusado ter com os girinos.
Visitei muitos também. Era a intensidade da disputa. Não permitia vacilo. A
regra era 10 minutos ou um gol. Uns três times na grade. Ninguém queria sair e
ficar de fora, mofando.
Eram
jogos também considerados. Alguns craques da ocasião faziam questão de
participar das nossas tardes. Ricardo, que era astro do Peladão; Marinaldo que
já despontava na lateral do Paysandu e Pitico, que não era profissional ou
boleiro rotulado, mas tinha uma categoria, exibia estilo, controle de espaço,
tempo, e uma calma. Quando ele jogava parece que a bola agradecia o tratamento
e aceitava o destino da forma mais plástica, mais ornamental. Pitico elevava a
qualidade do futebol da Marquês com aquela arte primorosa de tratar a pelota.
Quando estava na peleja, embora perdesse, nunca ia pra grade.
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